ANOTAÇÕES DE

OS CREDORES DO MUNDO

Os Banqueiros Internacionais que Financeiam a Dívida Externa

 

TÍTULO DO ORIGINAL: THE MONEY LENDERS

AUTOR: ANTHONY SAMPSON

EDITORA: RECORD – 1981

 

 

CAPÍTULO 1 - MIDAS E O ASNO

"Vocês vêem coisas e dizem: por quê? Eu, porém, sonho com coisas que jamais existiram e digo: por que não?" (Geroge Bernard Shaw)

(....) a história dos bancos continua a ser a  história de pessoas isoladas, cada uma delas fazendo seus próprios julgamentos ¾ vulneráveis a esperanças e receios, lisonha e persuasão, estados de espiríto de otimismo e pessimismo ¾ e este livro se propõe a acompanhar os efeitos de algumas de suas decisões, à medida que eals dão a volta ao mundo.

O que é que vai acontecer com o Brasil? É o maior tomador em toda a história bancária. Deve nada menos que 60 bilhões de dólares, a maior parte  a bancos americanos. Tomou tanto dinheiro que adquiriu um "Poder de Devedor" próprio. Ou, como diz o ditado: "Se deve ao banco bastante dinheiro, você o possui.:  À conferência de Washington compareceram 129 delegados brasileiros, contra 75 americanos. Ainda assim, a despeito dos perigos excepcionais que representa, o Brasil é parte de uma história que continua a desenrolar-se. ou, como diz um sócio do Barings: "O país nos parece como a América nos parecia há cem anos. Pode desmoronar, mas pode também tornar-se uma das maiores potências do mundo". (....) Prefeririam os sauditas, que possuíam o tipo de capital de que o mundo tão desesperadamente necessitava, investir seus bilhões à sua própria maneira islâmica, estabelecendo uma liderança em um quarto do mundo em desenvolvimento? (....) alguns deles dão crédito às velhas idéias de Malthus, de que o crescimento demográfico gera drásticas medidas corretivas da natureza. "Sou obrigado a dizer que, quando leio a respeito de guerras e fome na África", opina um banqueiro, "começo a pensar que isso é uma espécie de ajustamento inevitável."

 

CAPÍTULO 2 - QUEM CUIDA DO MUNDO?

"Queremospaz a qualquer preço", disse Anthony de Rothcchild em 1866. "O que nos importa a Alemanha, ou a Áustria, ou a Béllgica? Esse tipo de coisa está ultrapassado."

 

CAPÍTULO 3 - A DESGRAÇA DOS BANQUEIROS

(....) os 3 maiores bancos americanos nesses fins do século XX ¾ o Bank of America, o Citibank e o Chase Manhattan ¾ já existiam sob alguma forma antes de 1825.

"A aversão do Oeste ao banco federal", nas palavras de Hammond, "assemelhava-se ao ressentimento nacionalista em um pa's subdesenvolvido no século XX, que quer e necessita de capital importado, mas rosna contra o imperialismo do país que espera que o forneça."

"Ele era acusado de não olhar para o objeto, mas para os olhos do homem que tentava vendê-lo."

Amadeo Giannini fundou um pequeno banco chamado "Bank of  Italy", em São Francisco. (....) Dois anos depois da fundação, o um terremoto destruiu grande parte da cidade. Segundo a lenda, Giannini chegou ao banco justamente a tempo de levar de lá, em carroças, o outro depositado. Nove dias depois do terremoto, com o instinto de um diretor de teatro, armou uma tenda no cais. Enquanto os outros bancos continuavam fechados, ele, com uma tabuleta e uma sacola de dinheiro, proclamava que brevemente São Francisco seria reconstruída e que seria maior do que nunca, com a ajuda de seus empréstimos. Ocorria aí um retorno dramático a origens medievais (quando a palavra "banco" indicava o banco onde se sentava o agiota) e a confiança de Giannini produziu belíssimos resultados na recosntrução subseqüente.

"Nenhum homem possui realmente uma fortuna. Ela é que o possui." (Amadeo Giannini, banqueiro americano)

 

CAPÍTULO 4 - A IRMANDADE DO HOMEM

O presidente do gigantesco Deutsche Bank, Hermann Abs, que se tornara diretor do estabelecimento no auge do poder de Hitler, em 1937, foi preso e permanceceu detido durante 3 meses pelos americanos. Os britânicos, porém, logo acharam que ele era indispensável, nomeando-o seu consultor financeiro.

 

CAPÍTULO 5 - OS SUPERBANQUEIROS

 "Se a gente puder dizer 'lembro-me de que lhe fui apresentado em tal ou qual lugar', as pessoas ficam satisfeitas." (David Rockefeller)

"Se você não está queimando de entusiasmo, será quimado com entusiasmo." (Vince Lombardi, treinador de futebol americano)

 

CAPÍTULO 6 - O OUTRO MUNDO

"Quem pode hoje perguntar onde, dentro de algumas décadas, estará um país, sem perguntar onde estará o mundo? " (Relatório Pearson, 1969)

(....) ajuda [no conceito dos interesses financeiros internacionais] abrangia um imenso número de atividades e motivos diferenes ¾ uma mistura de interesse próprio nacional, ambiçoes comerciais e preocupação com a pobreza e a fome. (....) Em todos os países doadores, porém, travava-se um debate interminável sobre até que ponto a ajuda devia ser desinteressada e em que medida se deviam esperar vantagens comerciais. (....) 20 nações latino-americanas, porém, assinaram a Carta da Aliança para o Progresso. Prometia ela estimular a iniciativa privada e acelerar o desenvolvimento econômico, mas também fortalecer as instituições democráticas, redistribuir a terra e construir moradias decentes. Os Estados Unidos comprometeram-se a fornecer, no prazo de 10 anos, a maioria dos 20 bilhões de dólares do programa. (....) A Aliança conseguiu que fossem implementadas algumas reformas fiscais, fosse adotado um planejamento mais eficiente e procedida de alguma integração econômica, mas jamais alcançou seus alvos de reforma agrária, educação, alfabetização ou a esperada taxa anual de crrescimento de 2,5%.

"A tragédia real da Índia", diz Friedman, ";e que continua a ser um subcontinente borbulhante de gente desesperadamente pobre quando poderia, acreditamos, ser uma sociedade florescente, cada vez mais próspera e livre." Mas poderiam todas as complexidades da Índia, com todas suas antigas religiões, tradições e profunda meditação, se reduzirem à simples questão de escolha entre políticas econômicas? (....) E seria possível a um país democrático impor as necessárias disciplinas? Ou, como me disse a Sra. Gandhi: "Correu tudo bem com o Japão, com um grande volume de dinheiro, ajuda americana e uma população que é basicamente muito disciplinada. Nós, porém, começamos com uma revolução política, que deu ao povo um vocado de consciência política sobre direitos, e coissa alguma sovre disciplina, responsabilidade ou obrigações. No Ocidente, vocês tiveram sua revolução industrial em primeiro lugar; naquela ocasião, não havia questão de direitos dos trabalhadores, que eram inteiramente explorados. Mas nós começamos numa época em que esse era o principal aspecto: pode-se ignorá-lo um pouco, mas não muito. Esse o motivo por que parte tão grande de nosso setor público tem que gastar tanto com moradias e outras instalações". (....)

Os povos dos países mediterrâneos da África e Ásia, sobrevivendo nos mais inclementes dos climas ou em desertos, com o mínimo de colheitas, não estão em condições de se beneficiarem com a expansão do comércio mundial, da demanda de minerais ou de empréstimos comerciais. Na opinião dos banqueiros internacionais, são os equivalentes globais dos guetos das cidades americanas, que os banqueiros locais puseram "no vermelho" como sérios riscos de crédito. Não há alternativa a algum tipo de ajuda se queremos que, no fim, consigam viver independentemente. (....) "Como um ladrão nas trevas da noite", disse Asoka Mehta, da Comissão de Planejamento Indiano, "o crescimento demográfico rouba-nos tudo que conseguimos, dia após dia, em crescimento econômico."

O Fundo emprestava apenas sob a condição de que o governo do país que pedia o empréstimo cortasse as despesas públicas e impusesse uma drástica deflação, o que reduzia forçosamente os salários e aumentava o desemprego. Esta severidade, e a ênfase nos investimentos privados, constituíam um irônico contraste com a própria experiência americana no século XIX, de investimentos públcos e inprevidência financeira. A esse respeito, observou Arthur Sclesinger, um historiador que se tornou Assistente Especial do Presidente Kennedy: "Quanto à insistência de Washington em pureza fiscal, isto era talvez um pouco estranho de parte de uma nação que financiara parte tão grande de seu desenvolvimento com inflação, papel-moeda sem lastro e títulos vendidos a investidores estrangeiros e posteriormente repudiados. Se os critérios do Fundo Monetário Internacional houvessem gorvernado os Estados Unidos no século XIX, nosso próprio desenvolvimentpo econômico teria demorado muito mais tempo. Ao pregar a ortodoxia fiscal às nações em desenvolvimento, ficmos mais ou menos na situação da prostituta que, tendo-se aposentado com o dinheiro que ganhou, acha que a virtude pública exige o fechamento da zona".  (....) O Fundo, porém, continuo a exigir rigorosa disciplina de todos os países em dificuldades, sem pensar muito nas conseqüêncis políticas; e o tratamento de choque que preconizava, com toda probabilidade, ameaçaria a estabilidade de qualquer governo democrático que o aceitasse. (....) Quanto mais os banqueiros se preocupavam com a possibilidade de países irem à falência, mais falavam eles sobre renegociação, reescalonamento, reestruturação, ou mesmo, se necessário, em moratória, mas jamais na palavra terrível ¾ inadimplência.

 

CAPÍTULO 7 - LONDRES E OS EURODÓLARES

Companhias e bancos freqüentemente preferiam manter seus fundos sob a forma de eurodólares ¾ que eram simplesmente dólares mantidos fora dos Estados Unidos ¾, que podiam render juros mais altos numa época em que as taxas de juros nos EUA estavam sendo rigorossamente controladas.

Os bancos, no princípio, emprestavam quase exclusivemente nos países industrializados, mas, em fins da década de 60, começaram a interessar-se mais por uns poucos países em desenvolvimento, dinâmicos, que buscavam empréstimos para financiar suas economias em rápida expansão.

 

CAPÍTULO 8 - O TESOURO SECRETO

Quando pela primeira vez, o preço do petróleo duplicou, em outrubo de 1973 e, dois meses depois, dobrou mais uma vez, a mudança ocorreu de modo tão súbito que só depois de algum tempo pode ser compreendida. Os países da OPEP ganhariam mais uns 80 bilhões de ddólares extras com suas exportações do mundo ¾ e só poderiam gastar uns poucos bilhões dessa soma im importações. Os dois produtores mais ricos, a Arábia Saudita e o Kuwait, receberiam 37 bilhões a mais por ano. A esta taxa (calculou The Economist), poderiam comprar todas as grandes companhias listadas nas bolsas de valores do mundo em 25 anos; a IBM em 7 meses; a Exxon em 4 meses; e o Bank of America em 16 dias.

"O balanço do Citibank prmanece o mesmo. E se eles dizem que não gostam dos bancos americanos e colocam seu dinheiro no Crédit Suisse, tudo o que fazemos é debitar da Arábia Saudita e creditar ao Crédit Suisse: nosso balanço continua o mesmo. Assim, enquanto pessoas correm de um lado para o outro, esperando que o céu desabe, não há de fato maneira alguma de o dinheiro deixar o sistema. Trata-se de um circuito fechado." (Wriston) (....)

"Esses países [membros da OPEP] não têm absolutamente poder algum sobre nós, porque o dinheiro não tem outro lugar para onde ir. Este é um mercado interbancos. E eu diria que, se houver influência, será no sentido oposto. Quero dizer, os que teriam que se preocupar seriam os países árabes, pois sabem que tudo o que possuem é um reconhecimento de débito numa conta bancária, que pode ser congelada a qualquer tempo no EUA, na Alemanhha ou em qualquer outro país. Assim, se há alguma pressão nesse particular, é no sentido oposto. É o depositante que tem muito com o que se preocupar, e não os bancos americanos." (Al Costanzo, do Citibank)

 

CAPÍTULO 10 - AS FRONTEIRAS DO CAOS

Quanto mais altos os superávits da OPEP, maiores os déficits não só dos países ocidentais, mas dos "países em desenvolvimento não-produtores de petróleo" (como eram nexxe instante vagamente chamados), que constituíam mais da metade da população mundial. (....) Os bancos podiam obter lucros, mais altos porque, como regra geral, quanto mais pobre o país, mais altos os juros e as comissões. Em 4 anos, entre 72 e 76, todos os grandes bancos aumentaram rapidmente a proporção de lucros auferidos no exterior. Ou como disse um relatório do Senado: "Embora a elevação do preço do petróleo tenha sido quase um desastre para a econimia mundial, criou uma operação altamente lucrativa para os bancos." Um especialista londrino em assuntos bancários observou: "Era a maneira mais fácil de ganhar dinheiro: simplesmente cobrava-se um por cento pela assinatura de um cheque de alguns milhões de dólares."

(....) Uma nação não pode ir à falência como uma empresa típica: o conceito de falência não tem significado real para uma nação, pois nem mesmo nos dias das canhoneiras imperiais os credores puderam confiscar os ativos de um país. (....) O governo é também capaz, pelo menos em teoria, de saldar suas dívidas tributando mais pesadamenmte o povo, ao passo que uma empresa não podia simplesmente produzir mais carros ou vaviões para evitar o desastre.  (....) Algumas pessoas chegaram mesmo a sugerir que "os grandes bancos estão tão enredados em todo o processo de financiamento de déficits que não podem se dar ao luxo de dizer não. (....) muitos países devedores, como o Canadá, haviam, com a maior calma, adiado o pagamaento de suas dívidas por décadas sem fim. (....) em 1976, o Citibank estava auferindo 13% de sua receita mundial de um único país em desenvolvimento, o Brasil, enquanto 8% vinham dos EUA.

(....) "Era sempre tentador assinar um empréstimo com um longo período de carência antes do início das amortizações", recordava um especialista em empréstimos. "Quando começavam os problemas, a gente já tinha passado para outro lugar ou o presidente do Conselho de Administração do banco havia se aposentado.".  (....) "Lembro-me de como os banqueiros tentaram me encurralar em conferências, oferecendo-me empréstimos", recorda-se um latino-americano que, nessa ocasião, era ministro das finanças de seu país.

(....) Nos países mais pobres, os retornos podiam ser mais altos. Em 1974, o Citibank estava obtendo 40% de seus lucros nos países em desenvolvimento, com emprego de apenas 7% de seu ativo. Esses lucros imensos eram resultado não tanto do empréstimo de eurodólares, mas de operação hábil em cada país, beneficiando-se das altas taxas de juros locais que, não  raro, eram controladas por um semicartel nacional. Assim, enquanto as margens de lucros etavam sendo obrigadas, pela feroz concorrência, a descer nos EUA, mantinham-se altas na Ásia ou na América Latina. Quanto mais pobre o país, mais altos os lucros e Wriston não ocultava a vitória que era tirar tanto dinheiro das nações mais pobres: "Aqui, quem paga a conta é Jacarta." (....) Sustentava Wriston que o "mercado de euromoedas provou conclusivamente que, embora o mundo possa continuar ainda politicamente dividido, é um só econômica e financeiramente."

(....) Era insaciável a cobiça de Mobutu e sua família [Zaire]: em setembro, o tio do presidente, Cotoyen Lito, comprou um gigantesco avião Hercules à Lockheed, pagando por ele 13 milhões de dólares de preciosas divisas, para emprego em suas próprias e extensas operações comerciais.

(....) De um estudo do Senado, de 1977: "A viabilidade de todo o sistema internacional baseia-se na suposição de que todos os participantes prosseguirão no jogo: que os bancos continuarão a emprestar e os tomadores a amortizar os juros, de modo que, embora o principal possa ser refinanciado ou "reescalonado" no casdo de tomadores individuais, o dinheiro continua a circular. A maior ameaça ao sistema reside na possibilidade de que um dos passageiros desse carrossel resolva saltar ¾ que um dos grandes devedores decida repudiar sua dívida ou um dos prestamistas diga "não dou mais", e apresente a conta.