TÍTULO DO ORIGINAL: The blank slate: The modern denial of human nature
AUTOR: Steven Pinker
EDITORA: Companhia das Letras – 2002
Parte I
A Tabula rasa, o bom selvagem e o fantasma na máquina
Todo mundo tem uma teoria da natureza humana. Todo mundo precisa prever o comportamento dos outros... Ela nos aconselha sobre o modo de manter nosso casamento, criar nossos filhos e controlar nosso comportamento.
A concepção judaico-cristã ainda é a mais popular teoria da natureza humana nos Estados Unidos. Segundo levantamentos recentes, 76% dos americanos acreditam no relato bíblico da criação, 79% acreditam que os milagres descritos na bíblia realmente aconteceram, 76% acreditam em anjos, no diabo e em outras almas imateriais, 67% acreditam que existirão sob alguma forma depois de morrer e apenas 15% acreditam que a teoria da evolução de Darwin é a melhor explicação para a origem da vida humana na Terra. (...) Mas as ciências modernas da cosmologia, geologia, biologia e arqueologia tornaram impossível que uma pessoa com conhecimentos científicos elementares acredite que a historia bíblica da criação aconteceu de fato.
Bertran Russel: Todo homem, aonde quer que vá, está envolto por uma nuvem de convicções confortadoras, que se deslocam com ele como moscas em um dia de verão.
I. A teoria oficial
Uma máquina tem algum propósito prosaico, como moer grãos ou apontar lápis; um ser humano tem propósitos mais elevados, como amor, devoção, boas obras e criação de conhecimento e beleza.
Os jornalistas às vezes especulam sobre “transplantes de cérebro”, quando na realidade deveriam dizer “transplantes de corpo”, pois, como observou o filosofo Dan Dennett, essa é a única operação de transplante que é melhor para o doador do que para o receptor.
Russeau não acreditava exatamente numa tabula rasa, mas acreditava que o comportamento ruim era produto do aprendizado e socialização. “Os homens são maus; uma triste e constante experiência dispensa provas”, ele escreveu. Mas essa maldade provem da sociedade: “Não existe perversidade original no coração humano. Não se encontra nele um único vicio que não seja possível identificar como e quando entrou”.
Hoje em dia não se tem respeito pela filosofia. Muitos cientistas usam o termo como sinônimo de especulação estéril.
2. Silly Putty
Para o behaviorismo, os talentos e capacidades de um bebê não importavam, pois talento e capacidade eram coisas que não existiam. Watson os havia banido da psicologia, junto com outros conteúdos da mente, como idéias, crenças, desejos e sentimentos.
Pra Franz Boas, (...) as pessoas diferem porque suas culturas diferem. De fato, é assim que deveríamos nos referir a elas: a cultura esquimó ou a cultura judaica, e não a raça esquimó ou a raça judaica. A idéia de que as mentes são moldadas pela cultura servia de baluarte contra o racismo e era a teoria que se deveria preferir por rações morais.
3. A última muralha a cair
Em 1628 William Harvey mostrou que o corpo humano é uma máquina que funciona segundo a hidráulica e outros princípios mecânicos. Em 1828 Friedrich Wöhler mostrou que o material da vida não é uma geléia mágica e pulsátil, e sim compostos comuns que seguem as leis da química. Charles Darwin mostrou que a espantosa diversidade da vida e seus onipresentes sinais de ter sido projetada podiam emergir do processo físico da seleção natural entre replicadores. Grregor Mendel, depois James Watson e Francis Crick, mostraram como a própria replicação podia ser compreendida em bases físicas.
Sistemas de inteligência artificial recentes escreveram contos passáveis, compuseram convincentes sinfonias no estilo de Mozart, desenharam belas imagens de pessoas e paisagens e conceberam idéias espertas para anúncios publicitários.
Podemos todos ser equipados com um programa que reage a uma afronta (...) Mas o que é considerado afronta, (...) depende de nossa cultura. Os estímulos e respostas podem diferir, mas os estados mentais são os mesmos, sejam ou não perfeitamente rotulados por palavras em nossa língua.
Os psicólogos que estudam as emoções em diferentes culturas fizeram outra descoberta importante. As expressões faciais sinceras parecem ser as mesmas por toda parte, mas em algumas culturas as pessoas aprendem a manter o rosto impassível quando estão em companhia que requer boas maneiras. Uma explicação simples é que os programas de afeto desencadeiam expressões faciais do mesmo modo em todas as pessoas, mas quando elas podem ser mostradas é governado por um sistema distinto de “regras de exibição”.
O comportamento não é apenas emitido ou evocado, e também não provem diretamente da cultura ou da sociedade. Ele emerge de uma luta interna entre módulos mentais com diferentes destinações e objetivos.
Os humanos (...) têm as mentes dotadas de software combinatório capaz de gerar um conjunto ilimitado de pensamentos e comportamentos. O comportamento pode variar entre as culturas, mas a estrutura dos programas mentais que geram o comportamento não precisa variar.
Toda emoção e todo pensamento emitem sinais físicos, e as novas tecnologias para detectá-los são tão precisas que podem praticamente ser a mente de uma pessoa e dizer a um cientista cognitivo se a pessoa está imaginando um rosto ou um lugar.
Sigmund Freud imodestamente escreveu que “a humanidade ao longo do tempo teve de sofrer nas mãos da ciência três grandes ultrajes a seu ingênuo amor-próprio”:
A menos que se acredite em um fantasma na maquina, tudo o que uma pessoa aprende tem de afetar alguma parte do cérebro; mais precisamente: aprendizado é uma mudança em alguma parte do cérebro.
Gêmeos idênticos pensam e sentem de modos tão semelhantes que às vezes desconfiam estar ligados por telepatia. (...) Testes confirmam que os gêmeos idênticos, separados ou não ao nascer, são fantasticamente parecidos (embora longe de idênticos) em praticamente qualquer característica que se possa medir. São semelhantes em inteligência verbal, matemática e geral, no grau de satisfação com a vida e em características de personalidade como ser introvertido, aquiescente, neurótico, consciencioso e receptivo à experiência. Têm atitudes semelhantes diante de questões polemicas como pena de morte, religião e musica moderna. São parecidos não só em testes de papel e lápis, mas no comportamento consequencial como jogar, divorciar-se, cometer crimes, envolver-se em acidentes de ver televisão. E exibem dezenas de idiossincrasias como rir sem parar, dar resposta intermináveis a perguntas simples, molhar o pão com manteiga no café e – no caso de Abigail van Buren e Ann Landers – escrever textos indistinguíveis nas colunas de conselhos sentimentais.
Psicólogos descobriram que nossas personalidades diferem de 5 principais modos:
A maioria dos psicopatas apresentava sinais de perversidade desde criança. Maltratavam crianças menores, torturavam animais, mentiam habitualmente e eram incapazes de sentir empatia ou remorso, muitas vezes apesar de viver em um ambiente familiar normal e de árduos esforços por parte de seus consternados pais.
As crianças adquirem a linguagem falada instintivamente, mas a linguagem escrita, só com esforço, pois a linguagem falada tem sido uma característica da vida humana por dezenas ou centenas de milênios enquanto a linguagem escrita é uma invenção recente e de difusão lenta.
A distinção entre causação próxima e ultima é indispensável para a compreensão de nos mesmos, pois ela determina a resposta a toda pergunta na forma “Por que essa pessoa agiu assim?”. Para dar um exemplo simples, em ultima analise as pessoas anseiam por sexo para reproduzir-se (pois a causa ultima do sexo é a reprodução), mas, analisando de uma perspectiva mais imediata, elas talvez façam todo o possível para não se reproduzir (porque a causa próxima do sexo é o prazer).
Qualquer coisa inteiramente nobre é um produto improvável da seleção natural, já que na competição entre os genes pela representação na próxima geração quem é nobre tende a chegar por ultimo. Conflitos de interesse são ubiquos entre os seres vivos, pois 2 animais não podem comer o mesmo peixe ou monopolizar o mesmo parceiro sexual.
4. Abutres da cultura
O autismo é um distúrbio neurológico com fortes raízes genéticas. Junto com os robôs e os chimpanzés, os autistas nos lembram eu o aprendizado cultural só é possível porque pessoas neurologicamente normais possuem um equipamento inato para realizá-lo.
Experimentos mostram que bebês de um ano e meio não são associacionistas que ligam indiscriminadamente eventos coincidentes. São psicólogos intuitivos que analisam as intenções de outras pessoas antes de copiar o que elas fazem.
Em algumas sociedades, os homens vivem com sua família paterna e sustentam esposas e filhos; em outras, vivem com a família materna e sustentam irmãs, sobrinhas e sobrinhos.
[sobre rótulos]
Não existe uma boa razão para que as pessoas dirijam do lado direito da rua em vez do esquerdo, ou vice-versa, mas existe uma razão fortíssima para que as pessoas dirijam todas do mesmo lado. Assim, uma escolha arbitrária quanto ao lado para dirigir e uma ampla conformidade com essa escolha têm perfeito sentido.
Ritos de passagem e seus equivalentes modernos, pedaços de papel como a carteira de identidade e o registro de casamento, permitem a terceiros decidir como tratar casos ambíguos – como criança ou como adulto, como comprometido ou disponível – sem intermináveis discussões sobre diferenças de opinião.
Filósofo John Searle: certos fatos são objetivamente verdadeiros só porque as pessoas agem como se eles fossem verdadeiros.
Mao dizia que “o poder político nasce do cano de uma arma”. Como nenhum regime pode manter uma arma apontada para cada cidadão, o poder político nasce da capacidade de um regime para inspirar medo a um número suficiente de pessoas ao mesmo tempo.
A cultura, portanto, é um fundo comum de inovações tecnológicas e sociais que as pessoas acumulam para ajudá-las na vida, e não uma coleção de papéis e símbolos arbitrários que por acaso surgem para elas. (...) Mesmo quando dois grupos se mantêm à distância de um grito, se o relacionamento entre eles for muito hostil, eles podem adotar comportamentos indicadores de identidade que anunciem o lado a que pertencem, magnificando ainda mais as diferenças existentes.
As raízes psicológicas da cultura também ajudam a explicar por que alguns aspectos da cultura mudam e outros se mantêm. Algumas práticas coletivas têm uma inércia enorme porque impõem um custo elevadíssimo ao primeiro individuo que tentar mudá-las. Uma mudança de mão de direção do lado esquerdo para o direito não poderia começar com algum ousado dissidente ou com um movimento de origem popular (...).
As pessoas têm desejos e necessidades e, quando culturas entram em contato, fatalmente as pessoas pertencentes a uma não deixarão de notar quando seus vizinhos estão satisfazendo suas necessidades melhor do que elas próprias.
Muitas práticas “tradicionais” são surpreendentemente recentes. Os índios das Grandes Planícies americanas não andavam a cavalo antes da chegada dos europeus. Também as culinárias nacionais têm raízes pouco profundas. Batatas na Irlanda, páprica na Hungria, tomates na Itália, pimenta vermelha na ìndia e na China e mandioca na África provieram de plantas do Novo Mundo e foram levadas para seus “lares” tradicionais nos séculos seguintes à chegada de Colombo às Américas.
Sowell e Diamond argumentaram conclusivamente que os destinos das sociedades humanas não nascem do acaso nem da raça, mas do impulso humano para adotar as inovações de outros em combinação com as vicissitudes da geografia e da ecologia.
As plantas cultivadas e os animais que s domesticados em uma região podem facilmente disseminar-se para outras nas mesmas latitudes, que também possuem climas semelhantes. Mas não se disseminam com tanta facilidade por longitudes diferentes, onde algumas centenas de quilômetros podem evidenciar a diferença entre os climas temperado e tropical.
Assim a Eurásia conquistou o mundo não porque os eurasianos fossem mais inteligentes, mas porque puderam aproveitar melhor o principio de que muitas cabeças pensam melhor do que uma.
O reducionismo existe na forma boa e na ruim. O reducionismo voraz ou destrutivo (ruim) consiste em tentar explicar um fenômeno com base em seus elementos constituintes menores ou mais simples. Cientistas desta corrente, acreditam que faremos descobertas na educação, resolução de conflitos e outros temas sociais estudando a biofísica das membranas neurais ou a estrutura molecular da sinapse. Mas isto não explica como um pino quadrado não se encaixa em buraco redondo.
O reducionismo hierárquico (bom) consiste não em substituir um campo de conhecimento por outro, mas em conectá-los ou unificá-los. As unidades constitutivas usadas por um campo são postas ao microscópio por outro campo. As caixas-pretas são abertas; as notas promissórias são sacadas. Um geógrafo pode explicar por que a linha da costa africana se encaixa na das Américas dizendo que as massas de terra foram adjacentes no passado mas se situavam em placas diferentes, que se separaram pela deriva continental. A questão do motivo de as placas se moverem é passada para os geólogos, que mencionam uma efusão de magma que as empurrou as distanciou. E para explicar por que o magma esquentou tanto assim, chamam os físicos, que esclarecem as reações no núcleo e no manto terrestre.
A língua inglesa foi moldada por eventos históricos abrangentes que não ocorreram no interior de uma única cabeça. Entre eles incluem-se as invasões escandinava e normanda na época medieval, que contaminaram a língua com palavras anglo-saxãs, a grande mudança nas vogais no século XV, que embaralhou a pronuncia das vogais longas, tornando confuso e irregular seu sistema de soletração, a expansão do Império Britânico, que fez o inglês desdobrar-se em mais variações (o americano, o australiano, o cingapuriano), e o desenvolvimento da mídia eletrônica global, que pode homogeneizar novamente as línguas à medida que formos lendo as mesmas páginas da web e assistindo aos mesmos programas na televisão. (...) A língua é recriada a cada geração conforme passa pelas mentes dos humanos que a falam.
Do mesmo modo, nossa compreensão de nós mesmos e de nossas culturas só pode ser enriquecida pela descoberta de que nossa mente se compõe de intricados circuitos neurais para pensar, sentir e aprender, em vez de tabulas rasas, massas informes ou fantasmas inescrutáveis.
5. A última trincheira da tabula rasa
(...) todo o propósito de possuir um cérebro consiste em realizar certos objetivos, e o ambiente não tem idéia de que objetivos são esses.
Tudo isso por causa do numero 34 mil! O que suscita a questão: que numero de genes teria provado, ou que somos menos livres do que pensávamos, ou que a direita política está certa e a esquerda está errada? 50 mil? 150 mil? Inversamente, se houvesse sido descoberto que tínhamos só 20 mil genes, isso nos teria feito ainda mais livres, ou tornado o ambiente mais importante, ou deixado a esquerda da política ainda mais apoiada? O fato é que ninguém sabe o que esses números significam. Ninguém tem a menor idéia de quantos genes seria preciso para construir um sistema de módulos instalados, ou um programa de aprendizado multiuso, ou qualquer coisa intermediária – sem falar no pecado original ou na superioridade das classes dirigentes. Em nosso presente estado de ignorância quanto ao modo como os genes constroem um cérebro, o numero de genes no genoma humano é apenas um numero.
Hoje há rumores sobre estimativas alternativas de 57 mil, 75 mil e até 120 mil genes humanos. Ainda assim, mesmo se os humanos possuíssem seis vezes mais genes do que um verme em vez de apenas duas vezes mais, o enigma permaneceria.
Há mais duas razões para a complexidade do genoma não se refletir no núnero de genes que ele contém. Uma é que um dado gene pode produzir não só uma única proteína, mas várias. Um gene é tipicamente segmentado em trechos de DNA que codificam fragmentos de proteínas (éxons), separados por trechos de DNA não codificadores (introns), mais ou menos como um artigo de revista interrompido por anúncios. Os segmentos de um gene podem então ser emendados de numerosos modos. Um gene composto de éxons A, B, C e D poderia originar proteínas correspondentes a ABC, ABD, ACD et. – até dez proteínas diferentes por gene. Isso acontece em maior escala nos organismos complexos do que nos simples.
Segundo, os 34 mil genes compõem apenas cerca de 3% do genoma humano. O restante consiste em DNA que não codifica proteína e que antes era menosprezado como “junk” [lixo, refugo]. Mas, como afirmou recentemente um biólogo, “o termo junk DNA é um reflexo de nossa ignorância”. O tamanho, a colocação e o conteúdo do DNA não codificador têm efeitos monumentais sobre o modo como os genes próximos são ativados para produzir proteínas. As informações contidas nos bilhões de bases nas regiões não codificadoras do genoma são parte da especificação de um ser humano, em grau muito maior do que as informações existentes nos 34 mil genes.
Se pensamento e ação são produto da atividade física do cérebro, e se pensamento e ação podem ser afetados pela experiência, então a experiência tem de deixar um vestígio na estrutura física do cérebro. (...) A única questão é como o aprendizado afeta o cérebro. As memórias são armazenadas em seqüências de proteínas, em novos neurônios ou sinapses ou em mudanças na forca das sinapses existentes? Quando alguém aprende uma nova habilidade, ela é armazenada apenas em órgãos dedicados ao aprendizado de habilidades (como o cerebelo e os gânglios basais), ou também se ajusta ao córtex? Um aumento na destreza depende de usar mais centímetros quadrados do córtex, ou de usar maior concentração de sinapses no mesmo numero de centímetros quadrados?
Os mecanismos não são projetados para permitir que ambientes variáveis moldem órgãos variáveis. Fazem o oposto: asseguram que apesar dos ambientes variáveis desenvolva-se um órgão constante, que seja capaz de fazer seu trabalho.
O sistema visual desenvolve-se no útero totalmente escuro, antes de os olhos do animal se abrirem e antes que cones e bastonetes estejam sequer ligados e funcionando.
Mesmo hoje alguns grupos religiosos pressionam seus membros homossexuais a “escolher” a heterossexualidade. Muitas técnicas foram impingidas a eles: psicanálise, fazê-los sentir-se culpados, técnicas de condicionamento que usam a impecável lógica do “disparam juntos, conectam-se” (por exemplo, obrigá-los a olhar para garotas de capa da Playboy quando sexualmente excitados). Todas essas técnicas são inúteis. Com poucas exceções questionáveis (que provavelmente são casos de autocontrole consciente, e não uma mudança do desejo), a orientação sexual da maioria dos homens homossexuais não pode ser revertida pela experiência. Algumas partes da mente simplesmente não são plásticas, e nenhuma descoberta sobre como se dão as conexões no córtex sensitivo mudará esse fato.
Quem assiste ao Discovery Channel já viu filmes de crias de gnus ou zebras saindo do canal do parto, cambaleando nas pernas trêmulas, por um ou dois minutos, e então saltitando em volta da mãe com os sentidos, impulsos e controle motor em pleno funcionamento. Isso acontece rápido demais para que uma experiência padronizada tenha se organizado em seu cérebro, portanto têm de existir mecanismos genéticos capazes de moldar o cérebro antes do nascimento.
Uma menina resolvia problemas de aritmética contando nos dedos fantasmas! O psicólogo Ronald Melzack, que documentou muitos desses casos, aventou que o cérebro contém uma “neuromatriz” inata, distribuída por várias regiões corticais e subcorticais, dedicada á representação do corpo.
Quando adultos sobrem lesão no córtex visual e na base dos lobos temporais em ambos os lados do cérebro, perdem a capacidade de reconhecer rostos e também têm dificuldade de reconhecer animais, embora com freqüência consigam reconhecer palavras, utensílios, móveis e outras formas. Embora um rapaz crescesse com inteligência verbal normal, era totalmente incapaz de reconhecer rostos. Não consegui sequer reconhecer fotos do elenco de seu programa de televisão favorito, Baywatch, a que vinha assentindo durante uma hora por dia havia um ano e meio.
Se o cérebro realmente fosse homogêneo e plástico, as partes sadias deveriam ter sido moldadas pelo ambiente social normal e assumido as funções das partes lesadas. Mas não foi o que aconteceu com nenhuma dessas crianças. Uma delas, uma menina que fora atropelada por um carro aos quinze meses de vida, tornou-se uma criança intratável que não fazia caso de punições e mentia compulsivamente. Na adolescência, praticava furto em lojas, roubava dos pais, não conseguia fazer amigos, não demonstrava empatia nem remorso e perigosamente não se interessava por seu próprio bebê.
O estudo de seres humanos da perspectiva evolucionista mostrou que muitas faculdades psicológicas )como nossa avidez por comidas gordurosas, status social e relacionamentos sexuais de risco) são mais bem adaptadas às demandas evolutivas de nosso ambiente ancestral do que às demandas reais do ambiente atual.
O temperamento e a personalidade de uma pessoa emergem cedo na vida e permanecem razoavelmente constantes enquanto ela viver. E tanto a personalidade como a inteligência mostram pouco ou nenhum efeito dos ambientes específicos das crianças no âmbito de sua cultura: crianças criadas na mesma família são semelhantes principalmente em razão de seus genes em comum
Finalmente, a neurociência está mostrando que a arquitetura básica do cérebro desenvolve-se sob controle genético. Independentemente da importância do aprendizado e da plasticidade, os sistemas cerebrais têm indícios de especialização inata e não podem arbitrariamente ser substituídos uns pelos outros.
PARTE II
Medo e aversão
6. Cientistas Políticos
É um sinal da tenacidade da tábula rasa que uma probabilidade maior do que zero é igualada a uma probabilidade de 100%. Zero para o inato é a única crença aceitável, e todos os afastamentos disso são tratados como equivalentes.
Algum comportamento tem de ser afetado por alguns genes, ou nunca poderíamos explicar por que os leões agem de modo diferente das ovelhas, por que as galinhas chocam seus ovos em vez de comê-los, por que os cervos dão marradas e os gerbos não etc. (...) Ora, determinado gene pode não produzir o mesmo efeito em todos os ambientes, nem o mesmo efeito em todos os genomas, mas ele tem de ter um efeito médio. É essa média que a seleção natural seleciona (sendo tudo o mais igual), e é isso que significa o “para” em “um gene para X”.
7. A santíssima trindade
A idéia de “determinismo biológico” – de que os genes causam o comportamento com 100% de certeza – e a idéia de que toda característica comportamental tem seu próprio gene são obviamente tolas.
A questão não é se nossa espécie é “perversa e destrutiva”, mas se abrigamos motivos perversos e destrutivos juntamente com os benévolos e construtivos.
Qualquer um que não acredite na evolução decerto não acredita na evolução da mente, e qualquer um que acredite em uma alma imaterial decerto não acredita que pensamento e sentimento consistem em processamento de informações nos tecidos do cérebro.
A oposição religiosa à evolução é impulsionada por vários medos morais. O mais óbvio é o fato de que a evolução contesta a verdade literal da historia da criação encontrada na bíblia e, portanto, a autoridade que dela extrai a religião. (...) “Se a bíblia erra quanto à biologia, por que deveríamos confiar na bíblia quando ela fala sobre moralidade e salvação?”.
Os fiéis modernos podem não acreditar na verdade literal de cada milagre narrado na bíblia, mas acreditam que o homem foi criado à imagem de Deus e posto na Terra para um propósito maior – viver uma vida moral obedecendo aos mandamentos de Deus.
“No estudo do comportamento animal, ninguém sequer fala mais em sociobiologia ou genes egoístas, pois essas idéias são parte integrante da ciência.
Os oponentes das ciências da natureza humana, de esquerda e de direita, têm razão em uma coisa: essas são questões vitais. Então há mais motivo ainda para que sejam confrontadas não com medo e aversão, mas com a razão.
PARTE III
Natureza humana com rosto humano.
A preocupação em torno da natureza humana pode ser reduzida a 4 temores:
8. O medo da desigualdade
Samuel Johnson escreveu: “Somos todos movidos pelos mesmos motivos, todos enganados pelas mesmas falácias, todos animados pela esperança, tolhidos pelo perigo, enredados pelo desejo e seduzidos pelo prazer”.
(...) Portanto, em se tratando de uma explicação para o que nos faz funcionar, somos todos farinha do mesmo saco.
As pessoas são qualitativamente iguais, mas podem diferir quantitativamente. As diferenças quantitativas são pequenas em termos biológicos, e são encontradas em um grau muito maior entre membros individuais de um grupo étnico ou raça do que entre grupos étnicos ou raças. (...) Qualquer ideologia racista que afirme que os membros de um grupo étnico são todos iguais, ou que um grupo étnico difere fundamentalmente de outro, baseia-se em falsas suposições sobre nossa biologia.
Independente do QI, da força física ou de qualquer outra característica que possa variar, podemos supor que todos os humanos possuem certas características em comum:
§ ninguém gosta de ser escravizado
§ ninguém gosta de ser humilhado
§ ninguém gosta de ser tratado injustamente, ou seja, com base em característica que a pessoa não pode controlar.
[Ele fala em “uma sociedade não racista”, isto para mim não existe.]
Depois dos ataques terroristas de 11/set, cerca de metade dos americanos entrevistados afirmou não se opor à desconfiança étnica – revistar passageiros de avião porque são árabes.
As análises de custo-benefício são usadas para (...) A possibilidade de que homens e mulheres não sejam os mesmos em todos os aspectos também apresenta escolhas aos formuladores de políticas. Seria repreensível um banco contratar um homem em detrimento de uma mulher como gerente pelo motivo de que ele tem menos probabilidade do que ela de pedir demissão depois de ter um filho. Seria também repreensível um casal contratar uma mulher em vez de um homem como babá para sua filha porque ela tem menor probabilidade de abusar sexualmente da menina? A maioria das pessoas acredita que a punição para determinado crime deveria ser a mesma independentemente de quem o comete. Mas conhecendo as emoções sexuais típicas de ambos os sexos, deveríamos aplicar a mesma punição a um homem que seduz uma garota de dezesseis anos e a uma mulher que seduz um garoto de dezesseis anos?
Existem hoje numeroso indícios de que a inteligência é uma propriedade estável do individuo, que ela pode ser associada a característica do cérebro, que é parcialmente hereditária entre indivíduos e que prediz algumas das variações nos sucessos da vida, como a renda e o status social.
A direita darwinista social não dá valor à igualdade; a esquerda totalitarista não dá valor à liberdade. A esquerda rawlsiana sacrifica alguma liberdade em favor da igualdade; a direita libertária sacrifica alguma igualdade em favor da liberdade. Embora pessoas sensatas possam discordar quanto ao melhor trade-off, não é sensato fingir que não existe um trade-off.
A reprodução seletiva é direta para genes com efeitos aditivos – isto é, genes que têm o mesmo impacto independentemente dos outros genes do genoma. Mas algumas características, como a genialidade científica, o virtuosismo atlético e o talento musical, são o que os geneticistas comportamentais denominam emergênicas: materializam-se apenas com certas combinações de genes e, portanto, “não se reproduzem sem variação”. Resposta do bioquímico George Wald ao pedido de seu sêmem para um banco de esperma: “Se vocês querem sêmem que produza ganhadores de prêmios Nobel, deveriam entrar em contato com pessoas como meu pai, um alfaiate imigrante pobre. O que meu sêmem deu ao mundo? Dois guitarristas!”.
O nazismo e o marxismo compartilharam o desejo de remodelar a humanidade. “A alteração dos homens em grande escala é necessária”, escreveu Marx; “a vontade de recriar a humanidade” é o cerne do nacional-socialismo, escreveu Hitler.
Para os nazistas, os grupos eram as raças; para os marxistas, eram as classes. Para os nazistas, o conflito era o darwinismo social; para os marxistas, a luta de classes. Para os nazistas, os vitoriosos predestinados eram os arianos; para os marxistas, o proletariado. As ideologias, quando implementadas, conduziram a atrocidades em poucos passos: a luta (com freqüência um eufemismo para violência) é inevitável e benéfica; certos grupos de pessoas (as raças não arianas ou a burguesia) são moralmente inferiores; melhoras no bem-estar humano dependem de esses grupos serem subjugados ou eliminados.
9. O medo da imperfectibilidade
(...) uma natureza humana imutável parece subverter toda esperança de reforma. (...) O filosofo John Pasmore mostrou que o anseio por um mundo melhor por meio de uma na natureza humana nova e melhorada é um motivo recorrente no pensamento ocidental, e sintetiza isso em um comentário de D. H. Lawrence: “A perfectibilidade do homem! Ah, céus, que tema desolador!”
(...) a crença romântica de que o que é natural é bom. Segundo essa preocupação, se os cientistas disserem que é “natural” – que é arte da natureza humana – ser adultero, violento, etnocêntrico e egoísta, estarão insinuando que essas características são boas, e não apenas inevitáveis.
A guerra era considerada revigorante, enobrecedora, a aspiração natural dos homens e das nações. Essa crença levou lideres mundiais a entrar como sonâmbulos na Primeira Guerra Mundial e milhões de homens a alistar-se sofregamente, sem pensar na carnificina que os esperava.
[O contra-ponto do egoísmo é a necessidade de aprovação para do grupo.]
Uma popular apresentadora de televisão declarou: “Estou levando pessoas a parar de fazer o que é errado e a começar a fazer o que é certo”. [O deputado estadual Edino Fonseca, do Rio, quer aprovar uma lei prevendo auxilio psicológico pago pelo Estado a homossexuais que optarem por se tornar heterossexuais.]
O filósofo Pter Singer mostrou que o progresso moral contínuo pode emergir de um senso moral fixo. Suponhamos que somos dotados de uma consciência que trata outras pessoas como alvos de solidariedade e nos inibe de explorá-las. Suponhamos, também, que temos um mecanismo para avaliar se um ser vivo se classifica como pessoa. (Afinal de contas, não queremos classificar vegetais como pessoas e preferir morrer de fome a comê-los.) Singer explica o progresso moral no título de seu livro: The expanding circle (sem tradução em português). As pessoas expandiram constantemente a linha pontilhada mental que abrange as entidades consideradas dignas de consideração moral. O círculo foi sendo ampliado, da família e da aldeia para o clã, a tribo, o país, a raça e, mais recentemente (como na Declaração Universal dos Direitos Humanos), para toda a humanidade. Foi se afrouxando, da realeza, aristocracia e senhores de terra até abranger todos os homens. Cresceu, passando da inclusão apenas de homens à inclusão de mulheres, crianças, e recém-nascidos. Avançou lentamente até abranger criminosos, prisioneiros de guerra, civis inimigos, os moribundos e os mentalmente deficientes.
A expansão do círculo moral não tem de ser movida por algum impulso mistérios de bondade. Pode provir da interação entre o processo egoísta da evolução e uma lei de sistemas complexos.(...) os replicadores freqüentemente se vêem em jogos de soma não-zero, nos quais estratégias específicas adotadas por dois jogadores podem beneficiar os dois (ao contrário de um jogo de soma zero, no qual o ganho de um jogador implica perda para o outro). (...) um cego carrega um coxo nos ombros, permitindo a ambos locomover-se. Durante a evolução da vida essa dinâmica levou moléculas replicadoras a agrupar-se em cromossomos, organelas a agrupar-se em células, células aglomerar-se em organismos complexos e organismos a juntar-se em sociedades.
Se defrontamos um inimigo comum, como disse Benjamin Franklin, “Temos de nos juntar, pois separados seremos trucidados”.
À medida que a tecnologia se acumula e as pessoas em mais partes do planeta se tornam interdependentes, o ódio entre elas tende a diminuir, pela simples razão de que não se pode matar alguém e fazer transações com ele ao mesmo tempo.
Atitudes egoístas, sexistas, racistas e xenófobas são logicamente incoerentes com a demanda de que todos respeitem um único código de comportamento.
Assim, a coexistência pacifica não tem de surgir porque os desejos egoístas das pessoas são arrancados delas. Pode surgir quando alguns desejos – o desejo de segurança, dos benefícios da cooperação, da capacidade de formular e reconhecer códigos universais de comportamento – são contrapostos ao desejo de ganho imediato.
O que barra o caminho da maioria das utopias não é a peste nem a seca, mas o comportamento humano. Por isso, os utopistas têm de imaginar modos de controlar o comportamento, e quando a propaganda não funciona, eles partem para técnicas mais enfáticas. (...) Filósofos e historiadores recentes, mencionaram os sonhos utópicos como causa fundamental dos pesadelos do século XX.
O marxismo do século XX foi parte de uma corrente intelectual mais ampla,m designada por alto modernismo autoritário: a presunção de que os planejadores podiam reestruturar a sociedade de cima para baixo usando princípios “científicos”.
Não ocorreu a Le Corbusier que reuniões intimas com a família e os amigos podiam ser uma necessidade humana, por isso ele propôs que grandes salões de refeições comunitários substituíssem as cozinhas.
Em um dialogo de 1975, Simone de Beauvoir afirmou: “Nenhuma mulher deveria ser autorizada a ficar em casa para cuidar dos filhos. A sociedade deveria ser totalmente diferente. As mulheres não deveriam ter essa escolha, precisamente porque se existir essa escolha um número excessivo de mulheres a fará”.
Em muitos lugares pratica-se o aborto seletivo de fetos femininos, recém-nascidas são mortas, filhas são malnutridas e impedidas de freqüentar a escola, meninas adolescentes têm os genitais cortados, mulheres jovens são cobertas por um manto dos pés à cabeça, adúlteras são apedrejadas até a morte, e as viúvas têm o dever de jogar-se sobre a pira funerária do marido. O clima relativista em muitos círculos acadêmicos não permite que tais horrores sejam criticados porque são práticas de outras culturas, e culturas são superorganismos que, como as pessoas, têm direitos inalienáveis. [De outro lado, europeus são acusados de arrogantes por quererem instruir os povos pobres do mundo sobre o que é que eles precisam.]
10. O medo do determinismo
Na concepção tradicional de um fantasma na maquina, nosso corpo é habitado por um self ou uma alma que escolhe o comportamento a ser executado pelo corpo.
[O grande temor das pessoas é que] Afinal, se não existe fantasma na máquina, alguma coisa no hardware do criminoso tem de torná-lo diferente da maioria das pessoas, as que não feririam ou matariam nas mesmas circunstâncias. Essa alguma coisa há de ser descoberta logo, e, teme-se, os assassinos estarão isentos de punição pelos crimes exatamente como hoje isentamos os loucos e as crianças.
Se as pessoas não têm alma, por que não e igualmente tolo punir as pessoas?
Quando uma equipe de geneticistas encontrou um gene raro que predispunha os homens de certa família a acessos de violência, o advogado de um réu acusado de assassinato, sem parentesco nenhum com aquela família, argumentou que seu cliente talvez tivesse o mesmo gene. Neste caso, afirmou o advogado, “suas ações podem não ter sido um produto de total livre-arbítrio”.
Se o comportamento fosse escolhido por uma vontade totalmente livre, então realmente não poderíamos considerar as pessoas responsáveis por suas ações. Essa ameaça não se deteria ante a ameaça de punição (...). Moralidade e lei não teriam utilidade. Poderíamos punir um transgressor, mas seria por pura vingança, pois a punição não teria nenhum efeito previsível sobre o comportamento futuro do transgressor ou de outras pessoas cientes da punição. [O que, na minha opinião, é o que realmente acontece. Ou seja, eu vou mais longe do que o autor.]
Cientistas defensivos às vezes tentam desviar a acusação de determinismo salientando que o comportamento nunca é perfeitamente previsível, mas sempre probabilístico, mesmo nos sonhos dos mais ferrenhos materialistas.
A previsibilidade menos que perfeita do comportamento certamente desmascara o clichê de que as ciências da natureza humana são “deterministas” no sentido matemático. Mas não é capaz de dissipar o medo de que a ciência esteja minando o conceito de livre-arbítrio e responsabilidade. Não é nenhum consolo ficar sabendo que os genes de um homem deram-lhe 99% de probabilidade de matar sua senhoria em vez de 100%. Está certo, o comportamento não foi rigorosamente preordenado, mas por que a probabilidade de 1% de ele ter agido de outro modo subitamente tornou-o “responsável”. De fato, não existe um valor de probabilidade que, em si, traga a responsabilidade de volta. Sempre se pode pensar que existe uma probabilidade de 50% de que algumas moléculas no cérebro de Raskolnikov façam assim, compelindo-o a cometer o assassinato, e uma probabilidade de 50% de que façam assado, compelindo-os a não cometer o crime. Ainda não temos nada parecido com o livre-arbítrio, e nenhum conceito de reponsabilidade que prometa reduzir atos danosos. Os filósofos chamam isso de “bifurcação de Hume”: “ou nossas ações são determinadas, e nesse caso não somos responsáveis por elas, ou são resultado de eventos aleatórios, e nesse caso [também] não somos responsáveis por elas”.
A lógica da condenação parece ser: se alguém tenta explicar um ato como efeito de alguma causa, está dizendo que o ato não foi escolhido livremente, e que o agente não pode ser responsabilizado.
“É verdade, meu marido me espancava por causa de sua infância; mas eu o matei por causa da minha”.
A maioria dos filósofos acredita que, a menos que uma pessoa seja realmente coagida, devemos considerar suas ações livremente escolhidas, mesmo se forem causadas por eventos no interior de seu crânio. [Foi deixada uma questão crucial de lado, qual seja a de todos nós o tempo todo controlamos (ou não) nossos instintos inatos em questões, digamos, menores. Uma agressão verbal à esposa ou a um filho não leva ninguém para a cadeia pelo simples motivo que o fato não foi arrolado como crime no código penal. A diferença, portanto, está em uma ação ser ou não classificada como crime e não se os genes são determinísticos do comportamento.]
Quando responsabilizamos, esperamos dissuadir outros de cometer perversidades comparáveis no futuro. (...) “Mas a lei tem de cumprir suas promessas”. [Isto significa garantir que os transgressores não terão vantagem com suas violações. Como eu já cunhei: a única recompensa esperada pelos homens honestos é a punição dos desonestos.]
[As punições (responsabilização) são necessárias apenas porque somos incapazes de evitar a causa das ações.]
A razão de algumas práticas nos parecerem bárbaras é infligirem mais danos do que o necessário para prevenir o mal no futuro. Como afirmou o escritor político Harold Laski: “Civilização significa, acima de tudo, relutância em infligir dor desnecessária”.
A menos que se acredite que atos comuns são escolhidos por um fantasma na máquina, todos os atos são produtos de sistemas cognitivos e emocionais no cérebro. Atos criminosos são relativamente raros, portanto atos hediondos com freqüência serão produto de um sistema cerebral que é de algum modo diferente do usual, e o comportamento pode ser interpretado como “um produto de doença mental ou falha mental”.
Por que as intuições das pessoas seguem direções opostas :
§ ou “se ele tem dificuldade para controlar-se, deveria ser punido mais brandamente”,
§ ou “se ele tem dificuldade para controlar-se, deveria ser punido mais severamente”?
[Menos chibatadas para não correr o risco de infringir uma punição demasiada mas se arriscar a que não sejam bastante, ou mais chibatadas para garantir a eficiência mas correr o riso de serem demasiadas?]
O medo do niilismo
O medo final das explicações biológicas da mente é que elas possam privar nossa vida de significado e propósito. Se somos apenas maquinas para permitir que nossos genes produzam cópias de si mesmos, se nossas alegrias e satisfações não passam de eventos bioquímicos que algum dia cessarão para sempre, se a vida não foi criada para um propósito superior e dirigida para um objetivo nobre, então por que continuar vivendo?
O papa reconheceu que a teoria da evolução de Darwin é “mais do que apenas uma hipótese” porque descobertas convergentes em muitos campos independentes, “não buscadas nem forjadas”, testemunham em seu favor. Mas erigiu uma barreira diante da “alma espiritual”, uma transição na evolução dos humanos equivalente a um “salto ontológico” inobservável pela ciência. O espírito não poderia ter emergido “das forças da matéria viva”, pois isso não pode “fundamentar a dignidade da pessoa”:
O homem é a única criatura na Terra que Deus quis a bem de si mesma. [...] Em outras palavras, o indivíduo humano não pode ser subordinado como um puro meio ou um puro instrumento, seja da espécie, seja da sociedade; ele tem valor por si mesmo. Ele é uma pessoa. Com seu intelecto e sua vontade, ele é capaz de formar uma relação de comunhão, solidariedade e altruísmo com seus semelhantes [...]. O homem é chamado a entrar em uma relação de conhecimento e amor com o próprio Deus, uma relação que verá sua completa consumação além do tempo, na eternidade. [...]
Em outras palavras [na interpretação do papa sobre a concepção darwinista] (...) Nada nos livraria de uma vida de desumana exploração e cínico egocentrismo.
Nem é preciso dizer que debater com o papa é o supremo exercício de inocuidade. (...) alguns biólogos afirmam que um deismo refinado, para o qual muitas religiões estão evoluindo, pode ser compatibilizado com uma compreensão evolucionista da mente e da natureza humana.
O cérebro pode ser um sistema físico feito de matéria comum, mas essa matéria é organizada de modo a originar um organismo sensível com capacidade para o prazer e a dor. E isso, por sua vez, prepara o cenário para o surgimento da moralidade.
[O altruísmo só é possível graças ao egoísmo. O altruísmo nada mais é do que uma ação que tem o objetivo de obter a angariar a aprovação do outro sobre si. Não há altruísmo se não há esta possibilidade de aprovação.]
A alternativa à teoria religiosa da fonte de valores é que a evolução nos dotou de um senso moral, cuja esfera de aplicação nós expandimos no decorrer da história por meio da razão (entendendo a permutabilidade lógica entre nossos interesses e os das outras pessoas), do conhecimento (aprendendo as vantagens da cooperação no longo prazo) e da compreensão (passando por experiências que nos permitem sentir a dor de outras pessoas).
Até Hitler pensava estar executando a vontade de Deus. (...) Uma autoridade onipotente que ninguém pode ver é um esteio útil para lideres mal-intencionados ansiosos por recrutar combatentes devotos.
A doutrina de uma alma que vive depois de morto o corpo não tem nada de justa, pois necessariamente desvaloriza nossa vida na Terra. Quando Susan Smith afogou seus dois filhos pequenos no lago, apaziguou sua consciência racionalizando que “meus filhos merecem o melhor, e agora o terão”. (...) É por isso que devemos rejeitar o argumento de que se as pessoas pararem de acreditar na retribuição divina farão o mal com impunidade. [Os não-crentes não se sentem tentados a massacrar milhares de pessoas pela promessa de passar a eternidade no paraíso.]
[Todos nós sabemos que] as pessoas podem ser publicamente generosas mas gananciosas na vida privada, publicamente piedosas mas cínicas na vida privada, publicamente platônicas mas lúbricas na vida privada.
Nosso senso moral pode ter evoluído para engrenar-se com uma lógica intrínseca da ética em vez de criá-la do nada em nossa cabeça.
PARTE IV
Conhece a ti mesmo
12. Em contato com a realidade
O cérebro pe uma rede inimaginavelmente intricada: 100 bilhões de neurônios ligados por 100 trilhões de conexões, tecidos em uma arquitetura tridimensional convoluta (como em uma bananeira!!!).
Psicólogos mostraram listas de grupos étnicos e listas de características a um grupo de pessoas e então pediram-lhes que fizessem a correspondência entre grupos e características. Não deu outra: ligaram judeus a “astutos” e “mercenários; alemães a “eficientes” e “nacionalistas”, negros a “supersticiosos” e “despreocupados” e assim por diante. (...) hoje em dia as pessoas educadas e as principais figuras públicas empenham-se em evitá-las. [!!!!!!] [rótulos]
A inteligência depende do agrupamento de coisas que possuem propriedades em comum, para que não fiquemos pasmos a cada nova coisa que encontrarmos.
Percebemos algumas características de um novo objeto, situamo-lo em uma categoria mental e inferimos que é provável que ele tenha as outras características típicas dessa categoria, aquelas que não conseguimos perceber. Se anda como um pato e grasna como um pato, provavelmente é um pato. Se é um pato e grasna como um pato, provavelmente é um pato.
Se a categorização é tão excelente quando falamos em patos e cadeiras, por que é tão terrível quando pensamos em gênero e grupo étnicos?
A idéia de que os estereótipos são inerentemente irracionais deve-se mais a um sentimento de superioridade em relação às pessoas comuns do que a pesquisas psicológicas apropriadas. [Eu vejo de uma maneira mais prática. Os estereótipos são necessários para me agrupar ou me desagrupar, para incorporar o outro ou excluí-lo. Eu preciso saber quem você é sem precisar ter com você uma conversa de horas ou dias até que consiga descobrir se seus valores fundamentais são idênticos aos meus, se eu posso confiar a você minhas opiniões ou não.]
Mesmo quando as pessoas acreditam que grupos étnicos têm características típicas, não quer dizer que estereotipam todo mundo insensatamente, acreditando que cada membro de um grupo possui exatamente aquelas características.
Durante a Segunda Guerra Mundial, quando os russos eram aliados dos Estados Unidos e os alemães eram os inimigos, os americanos achavam que os russos tinham mais características positivas que os alemães. Pouco depois, quando as alianças se inverteram, os americanos passaram a achar que eram os alemães que tinham mais características positivas que os russos.
A boa notícia, portanto, é quando os fatos mudam, os estereótipos das pessoas podem mudar também.
[generalização e particularização]
(...) muitas palavras são definidas, em parte, por sua relação com outras palavras. Por exemplo, ele é definido pelo contraste com eu, você, eles e ela, e grande só é compreensível como oposto de pequeno.
Quando nos frustramos com uma disparidade entre nossa língua e nossos pensamentos, não desistimos, derrotados e calados, mas mudamos a língua. Inventamos neologismos (quark, meme, clone, estrutura profunda), criamos gírias (spam, detonar, desmunhecar, surfar na web, enrolar), emprestamos palavras úteis de outras línguas (joie de vivre, schlemiel, angst, trade-off), ou cunhamos novas metáforas (desperdiçar tempo, lavagem de dinheiro, forçar a barra). É por isso que toda língua, longe de ser uma penitenciária imutável, está em constante renovação. Apesar das lamentações dos amantes da língua e da coerção dos patrulheiros do idioma, as línguas mudam incessantemente, conforme as pessoas precisam falar sobre coisas novas ou transmitir novas atitudes.
(...) conceitos, e não palavras, estão primordialmente na mente das pessoas.
As pessoas não são programadas com imagens sem poder se defender; são capazes de avaliar e interpretar o que vêem, usando tudo o mais que conhecem, como a credibilidade e os motivos da fonte.
Se as imagens são a doença, argumenta-se, então a arte é a cura. Os artistas podem neutralizar o poder das imagens da mídia distorcendo-as ou reproduzindo-as em contextos estrambóticos (como as charges e caricaturas).
13. Não está em nós
[Lista de faculdades cognitivas proposta pelo autor:]
§ uma física intuitiva
§ uma versão intuitiva da biologia
§ uma engenharia intuitiva
§ uma psicologia intuitiva
§ um senso espacial
§ um senso numérico
§ um senso de probabilidade
§ uma economia intuitiva
§ uma lógica e um banco de dados mentais
§ a linguagem
As crianças não precisa ir à escola para aprender a andar, falar, reconhecer objetos ou lembrar as personalidades de seus amigos, muito embora essas tarefas sejam bem mais difíceis do que ler, somar ou lembrar datas históricas. Ela têm de ir à escola para aprender a linguagem escrita, a aritmética e a ciência, pois esses conjuntos de conhecimentos e habilidades foram inventados tão recentemente que não foi possível evoluir nenhuma aptidão para eles generalizada em nossa espécie.
Mesmo quando um único espermatozóide penetra, seus genes permanecem separados dos que existem no óvulo por um dia ou mais, e é preciso maus um dia aproximadamente para que o genoma recém-fundido controle a célula. Portanto, o “momento” da concepção é, de fato, um intervalo de 24 a 48 horas.
Senador Orrin Hatch: “Não consigo de jeito nenhum equiparar uma criança viva no útero, movendo os dedos e com o coração batendo, a um embrião num congelador.
A crença de que os corpos são dotados de alma não é apenas um produto de doutrina religiosa; ela está imersa na psicologia das pessoas, e tende a emergir toda vez que elas não digerem as descobertas da biologia. [isto porque sempre precisa haver uma explicação pois nada pode ficar sem explicação]
Se não há problema em abortar um feto de 24 semanas, então por que não um feto de 24 semanas e um dia, que dificilmente se pode distinguir daquele?
Os ativistas que concedem o direito à vida a qualquer ser dotado de sensibilidade têm de concluir que um comedor de hambúrguer é cúmplice de assassinato e que um exterminador de roedores é um perpetrador de assassinato em massa. Têm de tornar ilegais as pesquisas médicas que sacrificam alguns camundongos mas salvam 1 milhão de crianças de uma morte dolorosa.
[Por outro lado] Os macacos antropóides também apresentam, como nós, os prazeres superiores da curiosidade e do amor pelos familiares e nossas dores mais profundas de tédio, solidão e luto. Por que esses interesses deveriam ser respeitados para nossa espécie mas não para outras?
Como vimos, muitos conceitos comuns têm fronteiras vagas, e a mente distingue entre uma fronteira vaga e nenhuma fronteira. “Adulto” e “criança” são categorias vagas, sendo esse o motivo por que podemos elevar para 21 anos a idade para ingerir bebidas alcoólicas ou diminuir para dezoito a idade para votar.
Um relatório da União Européia em 2001 analisou 81 projetos de pesquisa conduzidos ao longo de quinze anos e não encontrou nenhum novo risco para a saúde humana ou para o meio ambiente representados por culturas geneticamente modificadas. (...) A ancestral silvestre da cenoura era uma cenoura branca, fina e amarga; o ancestral do milho era um sabugo de menos de 3 centímetros de comprimento facilmente debulhável com grãozinhos minúsculos e duros como pedra. As plantas são criaturas darwinianas que não têm nenhum desejo de ser comidas, e por isso não se esforçam para ser saborosas, saudáveis ou fáceis de cultivar e colher. Ao contrario: elas se esforçam para nos impedir de comê-las, desenvolvendo, pela evolução, substâncias irritantes, toxinas e compostos de gosto amargo. Portanto, não há nada de especialmente seguro nos alimentos naturais. O método “natural” de reprodução seletiva para resistência a pragas simplesmente aumenta a concentração dos venenos das próprias plantas; uma variedade de batata natural teve de ser retirada do mercado porque se revelou tóxica para as pessoas. (...) Quando o aroma “natural” de amêndoa, o benzaldeido, é derivado de caroços de pêssego, vem acompanhado de vestígios de cianureto; quando é sintetizado como “aromatizante artificial”, isso não acontece.
Povos tradicionais (...) julgam que objetos de aparência semelhante têm poderes semelhantes, e assim um chifre de rinoceronte moído é a acura para a disfunção erétil. (...) e comer ou usar uma parte de um animal feroz tornará a pessoa feroz. [E comer frutas ou verduras vermelhas acaba com a anemia; e....]
A mente está mais à vontade quando calcula probabilidades com base na freqüência relativa de eventos lembrados ou imaginados. Isso pode fazer com que eventos recentes e memoráveis – um acidente aéreo, um ataque de tubarão, uma infecção por antraz – ganhem muito mais vulto em nossa lista de preocupações do que eventos mais freqüentes e maçantes, como os acidentes de automóvel e as quedas de escadas que são noticiados ao pé da página B14 do jornal.
O antropólogo Alan Fiske analisou a literatura etnográfica e constatou que praticamente todas as transações humanas enquadram-se em quatro padrões, cada qual com uma psicologia distinta:
Quando as pessoas têm idéias diferentes sobre qual desses 4 modos de interagir se aplica a um relacionamento em curso, o resultado pode variar de total incompreensão a grande contrariedade ou até hostilidade declarada.
14. As muitas raízes do nosso sofrimento
As demandas do altruísmo recíproco podem explicar por que evoluíram as emoções sociais e moralistas. Solidariedade e confiança impelem as pessoas a oferecer o primeiro favor. Gratidão e lealdade impelem-nas a retribuir favores. Culpa e vergonha impedem-nas de prejudicar outras ou deixar de retribuir. Raiva e desprezo impelem-nas a evitar ou punir trapaceiros. (...) Parcerias, amizades, alianças e comunidades podem emergir, consolidadas por essas emoções e preocupações.
As pessoas não se importam com seus genes; importam-se com felicidade, amor, poder, respeito e outras paixões. Os cálculos de custo-beneficio são um modo metafórico de descrever a seleção de genes alternativos ao longo de milênios, e não uma descrição exata do que se passa em um cérebro humano em tempo real.
Vários experimentos mostraram que as pessoas são mais convencidas por um discurso político se o orador apelar para seus corações e mentes com metáforas de família.
Os sistemas polígonos (entre homens e mulheres) até recentemente caracterizaram a maioria das sociedades.
As pessoas podem fazer sexo na privacidade pela mesma razão pela qual em períodos de fome coletiva comem na privacidade: para evitar causar uma inveja perigosa.
A idéia fugaz de que a burqa até que não é uma idéia assim tão má já passou pela cabeça de muito pai de garota adolescente.
Trivers chegou à conclusão de que o altruísmo puro, orientado para o publico – um desejo de beneficiar o grupo ou a espécie às custas de si mesmo -, não tende a evoluir entre não-parentes, pois é vulnerável a invasões de trapaceiros que prosperam desfrutando as boas ações de outros sem dar sua própria contribuição. [Ai está a base para a roubalheira sempre presente em programas públicos que doam/dão alguma coisa.]
Fábula de Esopo: Quem porá o sino no gato?
Jornalista Matt Ridley: “A reciprocidade pende, como uma espada de Dâmocles, sobre a cabeça de cada ser humano. Ele só está me convidando para sua festa para que eu escreva uma resenha favorável sobre seu livro. Depois de tudo o que fiz por ele, como ele pôde fazer isso comigo? Obrigação, dívida, favor, barganha, contrato, troca, acordo. Nossa língua e nossa vida são permeadas por idéias de reciprocidade.
No século XIX e nas primeiras décadas do século XX, comunas auto-suficientes baseadas em uma filosofia de partilha comunitária pipocaram pelos Estados Unidos. Todas soçobraram devido a tensões internas; as baseadas em ideologia socialista depois de dois anos em média; as orientadas por ideologia religiosa depois de vinte anos em média. A idéias dos kibutzim israelenses, foi solapada pelo desejo dos participantes de viver com suas famílias, possuir suas próprias roupas e manter pequenos luxos ou quantias em dinheiro adquiridos fora do kibutz. E os kibutzim foram tolhidos pela ineficácia devido ao problema dos caronas – eram, nas palavras de um participante, “um paraíso para os parasitas”.
Sebastian Junger escreve em “A Tormenta”: Os capitães de barcos de pesca do peixe-espada ajudam uns aos outros em alto-mar sempre que podem; [...] Cada capitão sabe que ele pode ser o próximo com o injetor congelado ou vazamento na bomba.
(...) a menos que um grupo seja geneticamente fixo e hermeticamente selado, mutantes ou imigrantes infiltram-se nele constantemente.
[Aqui minha discordância] As pessoas freqüentemente têm atos de generosidade sem a menor esperança de retribuição, desde deixar uma gorjeta em um restaurante onde nunca mais irão, a atirar-se sobre uma granada para salvar seus irmãos de armas.
Os psicopatas não possuem nenhum vestígio de consciências [mas] a maioria das pessoas encontra-se em uma faixa intermediaria, apresentando misturas de reciprocidade, generosidade pura e ganância.
Talvez [NÃOOOOO, COM CERTEZA!!!!] todos nós sejamos capazes de ser santos ou pecadores, dependendo das tentações e ameaças à mão.
Seleção dependente de freqüência – na minha opinião, toda a evolução depende da freqüência.
Sem a possibilidade do sofrimento, o que teríamos não seria uma bem-aventurada harmonia, e sim nenhuma consciência.
15. O animal santarrão
Bertrand Russel, escreveu: “Infligir crueldade com a consciência em paz é um deleite para os moralistas – foi por isso que eles inventaram o inferno”.
Ponderemos sobre a seguinte história apresentada a muitas pessoas pelo psicólogo Jonathan Haidt e seus colegas:
Julia e Marcos são irmãos. Estão viajando juntos pela França durante as férias de verão na universidade. Certa noite, a sós em uma barraca perto da praia, decidem que seria interessante e divertido se tentassem fazer amor. No mínimo, seria uma nova experiência para cada um deles. Julia já estava tomando pílula anticoncepcional, mas Marcos ainda assim usa preservativo, só para garantir. Os dois sentem prazer naquele ato, mas decidem não repeti-lo. Mantêm aquela noite como um segredo especial, o que os faz sentir-se ainda mais próximos um do outro. Qual a sua opinião: foi correto eles fazerem amor?
Apesar de não haver vitima ou danos, a maioria declara prontamente que é errado e depois fica procurando, sem encontrar, uma razão para justificar o por quê. Haidt designa essa situação como “perplexidade moral”, e a evoca juntamente com outros cenários desagradáveis mas sem vitimas:
§ uma mulher está limpando o armário e encontra sua velha bandeira americana. Ela não quer mais aquela bandeira, por isso a rasga em pedaços e usa os retalhos para limpar o banheiro.
§ O cachorro de uma família é morto por um carro na frente da casa. A família ouviu dizer que carne de cachorro é deliciosa, por isso cortam o corpo do cão em pedaços e o comem cozido no jantar.
[em termos filosóficos] atos privados entre adultos ce comum acordo e que não prejudiquem outros seres sensíveis não são imorais.
Se uma única pessoa no mundo segurasse uma menina aterrorizada, esperneando e gritando, cortasse-lhe os genitais com uma lamina séptica e costurasse o corte deixando apenas um minúsculo orifício para a passagem de urina e fluxo menstrual, a única questão seria com que severidade essa pessoa teria de ser punida e se a pena de morte seria uma sanção suficientemente severa. Mas quando milhões de pessoas fazem isso, em vez de a atrocidade ser ampliada milhões de vezes ela subitamente se torna “cultura”, e assim, por mágica, torna-se menos horrível, ao invés de mais, e chega até mesmo a ser defendida por alguns “pensadores morais” ocidentais, incluindo feministas.
Quando alguém destitui uma pessoa de sua dignidade ridicularizando seu sofrimento, dando-lhe uma aparência humilhante ou forçando-a a viver na imundície, a compaixão das pessoas comuns pode evaporar, e facilmente elas a tratam como um animal ou um objeto.
[A televisão fez e faz mais pela humanidade do que qualquer religião . Enquanto a religião ensina a exclusão dos diferentes, a televisão faz com que cada um de nós aumente o próprio círculo mental incluindo gente de todo o planeta que, de outra maneira, continuariam a ser vistos como estranhos, animais, objetos.]
Leon Kass:Frívolas são as almas que esqueceram como é estremecer.
Quando se forncecem descrições de pessoas a estudantes universitários e se pede que avaliem seu caráter, eles julgam que uma pessoa que come cheeseburgers e toma milk-shakes é menos gentil e atenciosa do que alguém que come frango e salada!
Ian Buruma, historiador: “Os verdadeiros crentes podem ser mais perigosos do que os operadores cínicos. Estes podem fazer um acordo; aqueles têm de ir até o fim – e arrastar o mundo junto com eles”.
PARTE V
Vespeiros
Discutimos por respeito à convenção social de que sempre devemos expor as razões de nossas opiniões, mas, quando um argumento é refutado, não mudamos de idéia, e nos empenhamos ainda mais para encontrar um argumento substituto. Debates morais, longe de resolver hostilidades, podem agravá-las, pois quando as pessoas do outro lado não capitulam imediatamente, isso só prova que são inacessíveis à razão.
16. Política
Sociedade é um arranjo negociado por indivíduos racionais movidos pelo auto-interesse. A sociedade emerge quando as pessoas concordam em sacrificar parte de sua autonomia em troca de proteção contra espoliações de outros exercendo sua própria autonomia.
E, segundo a biologia evolucionista, todas as sociedades – animais e humanas – fervilham com conflitos de interesse, e o que as mantém coesas são misturas mutáveis de dominância e cooperação.
Os conservadores pensam que se você não for liberal antes dos vinte anos não tem coração, mas se for liberal depois dessa idade não tem cérebro.
O egoísmo não é a crueldade ou a agressão do psicopata, e sim uma preocupação com nosso bem-estar que está de tal modo entranhada em nossa constituição que raramente refletimos sobre ela, e seria uma perda de tempo lamentá-la ou tentar extingui-la.
Os 2 tipos de visionário (utópicos e trágicos) alinham-se em lados opostos de muitas questões que parecem ter pouco em comum. A visão utópica procura articular objetivos sociais e elaborar políticas que lidem diretamente com eles: a desigualdade econômica é combatida com uma guerra contra a pobreza, a poluição com leis ambientais, desequilíbrios raciais com tratamentos preferenciais, carcinógenos com proibições de aditivos alimentares. A visão trágica salienta os motivos auto-interessados das pessoas que implementariam tais políticas – ou seja, a expansão de seus feudos burocráticos – e sua incapacidade de antever as inúmeras conseqüências, especialmente quando os objetivos sociais são confrontados com milhões de pessoas que perseguem seus próprios interesses. Assim, dizem os visionários trágicos, os utópicos não prevêem que a política de bem-estar pode encorajar a dependência, ou que uma restrição sobre um poluente pode forçar as pessoas a usar outro.
Os de visão utópica vêem o crime como inerentemente irracional e procuram impedi-lo identificando as causas fundamentais. Os de visão trágica vêem o crime como inerentemente racional e acreditam que a causa fundamental é mais do que óbvia: pessoas roubam bancos porque é ali que está o dinheiro.
A ambição de refazer a natureza humana transformou lideres marxistas em déspotas totalitários e assassinos de massas.
O veredicto de Wilson sobre o marxismo: “Teoria maravilhosa. Espécie errada”.
Fatos biológicos estão começando a encurralar filosofias políticas plausíveis.
Conforme Chomsky, os humanos são inatamente dotados de um desejo de comunidade e de um impulso de livre expressão criativa, sendo a linguagem o exemplo paradigmático.
Se a justiça social consiste em providenciar o bem-estar dos menos aquinhoados, reconhecer diferenças genéticas requer uma ativa redistribuição da riqueza.
Um imposto sobre o consumo enfraqueceria a fútil corrida por carros, casas e relógios cada vez mais luxuosos e compensaria as pessoas com recursos que comprovadamente aumentar a felicidade, como tempo de lazer, ruas mais seguras e condições de transporte e trabalho mais agradável. [Julgamento totalmente subjetivo!!!!]
Um sistema de bem-estar social que não tentasse reformular a consciência publica e que distinguisse entre pobres e merecedores e não merecedores, argumentar, seria perfeitamente condizente com a natureza humana.
17. Violência
Pensava-se outrora que os povos caçadores-coletores modernos, que nos permitem vislumbrar a vida em sociedades pré-históricas, somente participavam de batalhas cerimoniais que cessavam assim que caia o primeiro homem. Hoje sabemos que matam uns aos outros em proporções que superam de longe as baixas em nossas guerras mundiais. O registro arqueológico não é menos sombrio. Enterradas no solo e ocultas em cavernas jazem testemunhas silenciosas de uma pré-história sangrenta que remonta a centenas de milhares de anos. Incluem esqueletos com marcas de escalpo, afundamentos em forma de machado e pontas de flecha incrustadas, armas como machadinhas e clavas, que são inúteis para caçar mas especiais para o homicídio, defesas fortificadas como paliçadas de varas afiadas, e pinturas, em vários continentes, mostrando homens atirando flechas, lanças ou bumerangues uns nos outros e sendo vitimados por essas armas.
Os Estados Unidos perderam 1 milhão de pessoas vitimadas por homicídio no século XX (...)
No caso da violência, a resposta correta é que ela não tem nenhuma relação com a natureza humana, sendo uma patologia infligida por elementos malignos externos a nós. A violência é um comportamento ensinado pela cultura, ou uma doença infecciosa endêmica em certos ambientes. [Discordo. Como explicar a violência nas crianças de 1 e 2 anos? Os instintos de defesa e agressão são produto da seleção natural, desenvolvidos para permitir a sobrevivência num ambiente de hostilidade como o próprio capitulo do livro ressalta.]
“Todos nós sabemos que as condições que geram violência são ignorância, discriminação, pobreza e doença”. [Estas condições são motoras porque a violência está lá, dentro do homem, caso contrário estas “condições” provocariam outra coisa.]
“Temos o vicio cultural da competição neste país. Apreendemos nas salas de aula e nos campos esportivos que as outras pessoas são obstáculos ao nosso sucesso”. (Alfie Kohn, jornalista). [Isto não é uma prerrogativa dos americanos e, novamente, só se manifesta por está dentro de nós.]
O triste fato é que, apesar das repetidas garantias de que “conhecemos as condições que geram a violência”, praticamente não temos nenhuma pista. Enormes oscilações em índices de criminalidade continuam a desafiar qualquer explicação simples.
Pais agressivos com freqüência têm filhos agressivos, mas quem conclui que a agressão é aprendida dos pais em um “ciclo de violência” nunca leva em conta a possibilidade de que as tendências violentas poderiam ser herdadas alem de aprendidas. [E é exatamente o que acontece. A hereditariedade faz com que uma pessoa seja mais ou menos resistente às motivações do meio. Um exemplo no Brasil é a família Grace, do judô.]
As crianças americanas são expostas a modelos violentos, obviamente, mas também são expostas a palhaços, pregadores, cantores de musica folk e drag queens; a questão é por que as crianças acham algumas pessoas mais dignas de imitação do que outras. [Exatamente por causa de sua matriz genética que valoriza mais a competição ou que valoriza mais a harmonia.]
As pessoas eram mais violentas nos séculos anteriores à invenção do cinema e da televisão. Os canadenses assistem aos mesmos programas de televisão eu os americanos mas têm um quarto da taxa de homicídios dos Estados Unidos. Os jogos de computador violentos ganharam popularidade nos anos 90, época em que os índices de criminalidade despencaram.
Israelenses e suíços andam armados até os dentes mas têm baixas taxas de crime pessoal violento, e, entre os estados americanos, Maine e Dakota do Norte têm os mais baixos índices de homicídio, apesar de quase toda casa possuir uma arma de fogo. A idéia de que as armas de fogo aumentam o crime letal tem sido tão difícil de ser comprovada que em 1998 o especialista em direito John Lott publicou um livro de analises estatísticas com um titulo que alardeia a conclusão oposta: More guns, less crime (Mais armas, menos crimes). Mesmo que ele esteja errado – desconfio que ele está - , não é tão fácil mostrar que mais armas significam mais crimes.
“Como seria tão bom que a idéia [qualquer idéia] fosse verdadeira, todos devemos acreditar que ela é verdadeira.” [Religião, governo e papai e mamãe aplicam esta técnica o tempo todo.]
Conflitos de interesse são inerentes à condição humana, e “Matar o adversário é a técnica suprema de resolução de conflito”.
Os dóceis escandinavos de hoje descendem dos sanguinários vikings, e a África, destroçada pela guerra depois da queda do colonialismo, lembra muito a Europa depois da queda do Império Romano. Qualquer grupo étnico que tenha sobrevivido até o presente provavelmente teve ancestrais briguentos no passado não muito distante.
Entre nossos primos chimpanzés há os que matam deliberadamente ouros chimpanzés, sugerindo a possibilidade de que as forças da evolução, e não apenas idiossincrasias de uma cultura humana especifica, prepararam-nos para a violência. E a ubiqüidade da violência em sociedades humanas ao longo de toda a historia e pré-história é um indicio ainda mais eloqüente desse preparo.
A idade mais violenta não é a da adolescência, mas a das crianças que acabaram de aprender a andar: em um extenso estudo recente, quase metade dos meninos com pouco mais de dois anos, e uma porcentagem ligeiramente menor das meninas, batia, mordia e chutava. Como salientou o autor: “Os bebês não matam uns aos outros porque não lhes damos acesso a facas e revolveres. A pergunta (...) que vimos tentando responder nos últimos trinta anos é como as crianças aprendem a agredir. Mas essa é a pergunta errada. A certa é como elas aprendem a não agredir”.
Não se pode entender a violência sem uma compreensão plena da mente humana.
Dentro do circulo, os semelhantes humanos são alvo de solidariedade; fora, são tratados como uma rocha, um rio ou um bocado de alimento.
A historia e a etnografia levam a crer que as pessoas podem tratar os estranhos do mesmo modo como hoje tratamos as lagostas, e nossa incompreensão de tais atos pode ser comparada à incompreensão dos nossos atos por parte dos defensores dos animais.
A observação de que pessoas podem ser moralmente indiferentes a outras pessoas que estão fora de um circulo mental sugere imediatamente uma providencia para o esforço de reduzir a violência: entender a psicologia do circulo suficientemente bem para incentivar as pessoas a colocar dentro dele toda a humanidade.
O círculo também pode encolher. Atrocidades freqüentemente são acompanhadas por táticas de desumanização como o uso de nomes pejorativos, condições degradantes, trajes humilhantes e piadas insensíveis ridicularizando o sofrimento. Essas táticas podem acionar um comutador mental e reclassificar um indivíduo de “pessoa” em “não-pessoa”, fazendo com que seja tão fácil alguém torturá-lo quanto é para nós cozinhar uma lagosta viva.
Mesmo entre os alunos de uma universidade de elite, táticas de desumanização podem facilmente empurrar uma pessoa para fora do circulo moral de outra. Zimbardo criou uma prisão simulada no porão do departamento de psicologia da Universidade Stanford atribuiu aleatoriamente papéis de prisioneiro ou guarda a estudantes. Os “prisioneiros” tinham de usar batas, bolas de ferros nos pés e gorros de meia, e eram chamados por números de serie. Não demorou para que os “guardas” começassem a brutalizá-los – subindo nas suas costas enquanto eles faziam flexões de braço, borrifando-os com extintores de incêndio, obrigando-os a limpar vasos sanitários com as mãos nuas – e Zimbardo, preocupado com a segurança dos participantes, cancelou o experimento.
A única opção para a tua proteção pode ser eliminar os vizinhos potencialmente hostis primeiro, em um ataque preventivo. [Mas] os vizinhos têm todas as razões para deduzir a mesma coisa e, se o fizerem, isso torna os temores da pessoa ainda mais imperiosos, o que torna um ataque preventivo ainda mais tentador, o que torna um ataque preventivo por parte deles ainda mais tentador e assim por diante. Essa é a chamada “armadilha hobbesiana”.
A observação de Hobbes de que os homens brigam por causa de “uma palavra, um sorriso, uma opinião diferente e qualquer outro sinal de menosprezo” é tão verdadeira hoje quanto era no século XVII.
Em Culture of honor, os psicólogos sociais Richard Nisbett e Dov Cohen mostram que culturas violentas emergem em sociedades que estão for do alcance da lei e nas quais há facilidade para roubar recursos preciosos. As sociedades que vivem do pastoreio preenchem essas duas condições. Os pastores tendem a viver em territórios que são impróprios para o cultivo e, portanto, distantes dos centros de governo. E seu principal recurso, o gado, é mais fácil de roubar do que o principal recurso dos agricultores, a terra. Em sociedades pastoris um homem pode ser destituído de sua riqueza num piscar de olhos. Nesse meio, os homens cultivam a prontidão para a retaliação violenta, não só contra ladrões de gado mas contra qualquer um que queira testar sua determinação com sinais de desrespeito que poderiam mostrá-los como alvos fáceis para os ladrões de gado.
“A violência é um modo de fazer valer os direitos de propriedade na ausência do recurso à lei”. (...) Assim, não surpreende que, quando adolescentes afro-americanos são retirados de bairros carentes, não se mostram mais violentos ou delinqüentes do que adolescentes brancos.
“Pactos, sem a espada, não passam de palavras, e nenhuma força têm para dar segurança a um homem”.
O problema das medidas sem poder coercivo é que as partes sempre podem dar-lhes as costas se o resultado não for o que desejam.
Em 17 de outubro de 1969 a polícia de Montreal entrou em greve. Às 11h20 o primeiro banco foi roubado. Ao meio-dia a maioria das lojas do centro da cidade havia fechado devido a saques. Em algumas horas mais, motoristas de táxi incendiaram a garagem de uma locadora de limusines que competia com eles por passageiros do aeroporto, um atirador de tocaia no telhado matou um policial provincial, desordeiros invadiram vários hotéis e restaurantes, e um medico matou um assaltante em sua casa num bairro elegante.
A grande questão é como fazer com as pessoas e as nações repudiem a violência logo de saída, prevenindo as escaladas de hostilidade antes que elas comecem.
Churchill explicou por que a paz não é uma simples questão de pacifismo unilateral: “Nada é pior do que a guerra? Desonra é pior do que a guerra. Escravidão é pior do que a guerra”.
Segundo um especialista canadense: “Nosso Oeste expandiu-se de um modo organizado e pacífico porque a polícia chegou antes dos colonos”.
Teóricos mostraram que a melhor decisão para cada jogador individualmente às vezes é a pior decisão para ambos coletivamente. O mais celebre exemplo disso é o dilema do prisioneiro, no qual parceiros em um crime são detidos em celas separadas. A cada um deles é prometida a liberdade se ele for o primeiro a delatar o parceiro (que nesse caso receberá uma sentença severa), uma sentença leve se nenhum dos dois delatar o outro e uma sentença moderada se cada um delatar o outro. A estratégia ótima para cad prisioneiro é deixar que o parceiro sofra sozinho, mas quando ambos fazem isso acabam com um resultado pior do que se ambos se mantivessem leais. Mas nenhum deles pode permanecer leal devido ao medo de que o parceiro venha a delatá-lo e deixá-lo com o pior de todos os resultados.
Assim como ocorre com tantos outros assuntos humanos, a natureza humana é um problema, mas também é a solução.
18.Gênero
Muitos estudos testaram e constataram que homens e mulheres diferem pouco ou nada em seu raciocínio moral. Portanto, o feminismo de diferença oferece às mulheres o pior de ambos os mundos: afirmações injustas sem base cientifica.
Do ponto de vista de um gene, estar no corpo de um macho e estar no corpo de uma fêmea são estratégias igualmente boas, ao menos em média.
Os homens não são de Marte e as mulheres não são de Vênus. (...) Homens e mulheres possuem todos os mesmos genes, com exceção dce um punhado no cromossomo Y, e seus cérebros são tão semelhantes que é preciso um neuroanatomista com olho de águia para encontrar as pequenas diferenças entre eles.
Mas é claro que as mentes de homens e mulheres não são idênticas e estudos recentes sobre as diferenças entre os sexos convergiram para algumas diferenças dignas de crédito. [Não concordo e algumas “diferenças” que o autor coloca a seguir me parecem “preconceitos cientificamente comprovados”. Vejamos:]
As mulheres vivenciam emoções básicas com mais intensidade, excetuando-se, talvez, a raiva. As mulheres têm relacionamentos sociais mais íntimos, são mais preocupadas com eles e sentem mais empatia por seus amigos, embora não por estranhos. Elas fazem mais contato visual, sorriem e riem com mais freqüência. Os homens têm maior probabilidade de competir uns com os outros usando violência ou realização ocupacional, as mulheres têm maior probabilidade de usar a depreciação e outras formas de agressão verbal. Os homens têm maior tolerância à dor [não é o que diz o povo] e maior disposição para arriscar a vida e a integridade física por status, atenção e outras recompensas dúbias.
As relações são complexas por varias razões. Ao longo de uma vasta faixa de valores, a concentração de testosterona na corrente sanguínea não tem importância. Algumas características, como a habilidade espacial, têm seu pico em níveis moderados, e não elevados. (...) Mulheres com níveis elevados de testosterona sorriem com menos freqüência e têm mais casos extraconjugais, uma presença social mais marcante e até um aperto de mão mais forte.
Um estudo examinou 25 meninos que nasceram sem pênis (um defeito congênito conhecido como extrofia cloacal), foram castrados e criados como meninas. Todos eles apresentaram padrões masculinos de brincadeiras turbulentas e atitudes e interesses tipicamente masculinos. Mais da metade declarou espontaneamente ser menino, um deles quando tinha apenas cinco anos.
Tampouco as diferenças entre meninos e meninas dependem de observarem comportamento masculino em seus pais e feminino em suas mães. Quando Joãozinho tem duas mães, age como um menino tanto quanto se tivesse mãe e pai.
Obviamente, só porque muitas diferenças entre os sexos têm suas raízes na biologia isso não significa que um sexo é superior, que as diferenças emergirão para todas as pessoas em todas as circunstancias, que a discriminação contra uma pessoa baseada em seu sexo é justificada ou que as pessoas devem ser coagidas a fazer coisas típicas de seu sexo.
Patti Hausman, cientista social: “A pergunta por que mais mulheres não escolhem carreiras em engenharia tem uma resposta óbvia: porque elas não querem. Por onde quer que andemos, veremos que as mulheres têm muito menor probabilidade do que os homens de fascinar-se com ohms, carburadores ou quarks. Reinventar o currículo não me deixará mais interessada em aprender como minha lavadora de louça funciona”
Não se questiona se as mulheres são ou não qualificadas para ser cientistas, diretoras de empresas, lideres de nações ou profissionais de elite de qualquer outro tipo. Isso foi respondido decisivamente anos atrás: algumas são e algumas não são, exatamente como alguns homens são e outros não. A única questão é se a proporção de homens e de mulheres qualificados tem de ser idêntica.
Em qualquer caso, membros de ambos os sexos serão encontrados que qualquer tipo de trabalho, só que em proporções diferentes.
Em um mercado ferozmente competitivo, qualquer empresa bastante estúpida para desconsiderar as mulheres qualificadas ou para pagar mais a homens sem qualificação seria expulsa do ramo por um competidor mais meritocratico.
O que as descobertas dizem é que tais políticas [obrigar salários iguais, por exemplo] teriam seus custos alem de benefícios. O beneficio óbvio das políticas de igualdade de resultado é que elas poderiam neutralizar a discriminação remanescente contra as mulheres. Mas se homens e mulheres não são intercambiáveis, os custos também têm de ser levados em consideração.
Como disse a astrônoma Lynne Hillenbrand: “Se lhe dão uma oportunidade pelo fato de ser mulher, você é prejudicada, pois isso leva as pessoas a questionar por que você está ali”.
(...) homens e mulheres são dotados de cérebros – talvez não idênticos – que lhes dão valores e capacidade de fazer escolhas. Essas escolhas devem ser respeitadas. (...) É grotesco exigir que mais garotas sejam “condicionadas a escolher engenharia”, como se elas fossem ratos em uma caixa de Skinner.
Gottfredson ressalta: “Se você insistir em usar a paridade entre os sexos como sua medida de justiça social, isso significa que você terá de manter muitos homens e mulheres fora do trabalho que eles preferem e empurrá-los para trabalhos de que eles não gostam”.
Margaret Mead [errada na maioria das vezes, exceto quando disse]: “Para que alcancemos uma cultura mais rica, rica em valores contrastantes, devemos reconhecer toda a gama de potencialidades humanas, e assim tecer uma estrutura social menos arbitrária, na qual cada um dos diversos talentos humanos encontrará um lugar apropriado”.
A critica moral parece válida apenas contra os que querem impor dogmas, desconsiderar os fatos ou impedir pesquisas, pois estarão protegendo sua reputação às custas de vitimas de estupros que poderiam não ter ocorrido se compreendêssemos melhor o fenômeno.
Preferimos (o sistema judiciário) deixar que dez culpados andem soltos a encarcerar um inocente.
[Imbecis são] Catharine MdcKinnon e Andréa Dworkin que afirmaram que “a sedução com freqüência é difícil de ser distinguida do estupro. Na sedução, o estuprador muitas vezes se dá ao trabalho de comprar uma garrafa de vinho”.
O estupro é encontrado em todas as sociedades humanas.
A violência contra as mulheres floresce em sociedades que estão fora do alcance da civilização, e irrompo sempre que a civilização entra em colapso.
Obviamente as mulheres têm o direito de vestir-se como bem entenderem, mas a questão não é o que as mulheres têm o direito de fazer em um mundo perfeito, mas como elas podem maximizar sua segurança neste mundo em que vivemos. A sugestão de que mulheres em situações perigosas tenham cuidado com reações que podem provocar ou com sinais que podem inadvertidamente emitir é apenas bom senso, e é difícil acreditar que qualquer adulto pensasse de modo diferente – a menos que essa pessoa tenha sido doutrinada pelos clássicos programas de prevenção de estupro que ensinam às mulheres que “a agressão sexual não é um ato de gratificação sexual” e que “a aparência e a atratividade não são relevantes”. [Um exemplo similar seria o de culpar a vítima que foi assaltada ou assassinada porque esta indo a pé pra casa às 11 horas da noite de domingo.]
Se o seu carro foi roubado depois de você o deixar estacionado com a chave na ignição, sim, a polícia deve perseguir o ladrão e ele deve ser punido. Mas, ao mesmo tempo, a polícia – e eu – temos o direito de dizer a você: “Seu tonto, você queria o quê?”.
As pessoas podem ter de decidir sobre o que valorizam mais: uma ideologia que afirma defender os interesses do sexo feminino ou aquilo que de fato acontece no mundo a mulheres reais.
O feminismo como movimento de equidade política e social é importante, mas o feminismo como panelinha acadêmica comprometida com doutrinas excêntricas sobre a natureza humana não é. Eliminar a discriminação contra mulheres é importante, mas acreditar que mulheres e homens nascem com mentes indistinguíveis não é. A liberdade de escolha é importante, mas garantir que as mulheres componham exatamente 50% de todas as profissões não é. E eliminar os ataques sexuais é importante, mas defender a teoria de que os estupradores estão fazendo sua parte em uma gigantesca conspiração masculina não é.
19. Crianças
As 3 leis da genética comportamental:
As características de comportamento que refletem os talentos e temperamentos básicos são hereditárias: nossa facilidade com o idioma, nosso nível de religiosidade, o grau de nossas convicções liberais ou conservadoras. A inteligência geral é hereditária, e o mesmo vale para os 5 modos principais de variação da personalidade: receptividade à experiência, conscienciosidade, extroversão-introversão, antagonismo-aquiescência, tendências neuróticas.
Os métodos da genética comportamental só podem mostrar que características correlacionam-se com genes, e não que são diretamente causadas por eles.
Quando o assunto são os genes, as pessoas de repente perdem a capacidade de distinguir 50% de 100%, ]”alguns” de “todos”, “afeta” de “determina”. O diagnostico para essa deficiência intelectual é claro: se os efeitos dos genes têm de ser zero por razões teológicas, então todos os valores diferentes de zero são equivalentemente heréticos.
Os efeitos do ambiente compartilhado são pequenos (menos de 10% de variância), com freqüência não são estatisticamente significantes, com freqüência não se replicam em outros estudos e com freqüência são zero. (...) Muitos geneticistas comportamentais vão além e afirmam que são negligíveis, particularmente na vida adulta. (O QI é afetado pelo ambiente compartilhado na infância, mas com o passar dos anos esse efeito vai enfraquecendo até desaparecer.)
Irmãos adotivos não são mais semelhantes do que duas pessoas escolhidas ao acaso na rua. (...) Sejam quais forem as experiências que irmãos compartilham por crescer na mesma casa, elas não fazem diferença para o tipo de pessoas que eles se tornam. [ O que reforça minha tese de que o mais importante é a matriz genética que serve de base para a interpretação/percepção dos fatos da vida, percepção esta que vai determinar comportamentos futuros, de aproximação ou afastamento das causas percebidas.]
Um resumo prático das 3 leis seria: genes 50%, ambiente compartilhado 0%, ambiente único 50%.
Tendo em mente que gêmeos idênticos são 50% semelhantes independentemente de terem sido criados juntos ou separados, observe o que acontece com as idéias favoritas da “sabedoria” popular sobre os efeitos da criação na infância.
Para testar se qualquer coisa que os pais façam afeta seus filhos de qualquer modo sistemático, então as crianças que crescem com os mesmos pais se tornarão mais parecidas do que crianças crescendo com pais diferentes. Mas isso não acontece.
Os pais de uma criança afetuosa podem retribuir esse afeto e, com isso, agir diferente dos pais de um filho que se debate e limpa os beijos que lhe dão. Os pais de uma criança quieta e avoada podem ter a impressão de que estão falando com a parede e conversar menos com elea. (...) Em outras palavras, correlação não implica causação. Uma correlação entre pais e filhos não significa que os pais afetam os filhos ; poderia significar que os filhos afetam os pais, que os genes afetam tanto pais como filhos, ou ambas as coisas.
Mesmo se o comportamento dos pais afetar o modo como seus filhos se comportam com eles, pode não afetar o modo como esses filhos se comportam com outras pessoas.
Décadas de estudo demonstraram que, sendo tudo o mais igual, os filhos crescem de modo muito semelhante independentemente de a mãe ficar em casa ou trabalhar fora, de serem postos em creches ou não, de terem irmãos ou serem filhos únicos, de os pais terem um casamento convencional ou aberto, de crescerem em um lar tradicional ou em uma comunidade hippie, de suas concepções terem sido planejadas, acidentais ou em um tudo de ensaio, e de terem dois pais do mesmo sexo ou um de cada sexo.
Se uma criança medrosa se transforma em um adulto medroso, não sabemos se isso foi efeito de um pai superprotetor ou a continuação da personalidade medrosa com que a criança já nasceu. [Isso vale apenas se previamente sabemos que o pai foi superprotetor. Mas no caso inverso, fica demonstrado que foi hereditário ou adquirido no ambiente não compartilhado.]
Se fosse realmente válido aplicar um modo de criação a cada tipo de criança, isso mostraria ser efeito dos genes: seria explicado pela hereditariedade, e não pelo ambiente único. Isso porque a hereditariedade é uma medida de correlação e não pode distinguir efeitos diretos dos genes dos efeitos indiretos que operam muitos elos adiante.
A moral da historia seria que o aconselhamento generalizado sobre criação de filhos seria inútil. Qualquer coisa que os pais fizessem para tornar os filhos melhores tornaria um numero de crianças piores.
Praticamente todas as diferenças na criação de filhos em uma família podem ser explicadas como reações a diferenças genéticas com as quais as crianças nasceram.
O líder de um heróico estudo recente, que tinha a esperança de provar que diferenças na maneira de criar os filhos realmente afetam o modo como as crianças se desenvolvem, confessou ter ficado “chocado” com os resultados a que ele próprio chegou.
Quando a personalidade é medida por partes neutras fora da família, os efeitos da ordem de nascimento diminuem ou desaparecem. Quaisquer diferenças na criação de primogênitos e não-primogenitos parecem exercer pouco ou nenhum efeito sobre a personalidade fora de casa.
Semelhanças dentro lo alr não moldam as crianças; diferenças dentro do lar não moldam as crianças.
Quase invariavelmente, as pessoas moldam-se conforme seus iguais, e não conforme seus pais. (...) Não está tudo nos genes mas o que não está nos genes também não está nos pais. (...) As crianças não passam suas horas tentando tornar-se aproximações cada vez mais perfeitas de adultos. Empenham-se por tornar-se crianças cada vez melhores, que funcionem bem em sua própria sociedade. [Graças a isso é que nossa personalidade é formada.]
No meio das outras crianças [na verdade, no meio dos “outros”], os pequenos [e grandes] ou nadam ou se afogam.
As crianças têm de aprender o que é preciso para conquistar status entre seus iguais, pois o status em determinada idade dá-lhes uma vantagem na luta por status na idade seguinte, incluindo as fases da juventude em que começam a competir pela atenção do sexo oposto.
Então por que insistimos em que os pais das crianças são cruciais para o modo como elas se desenvolvem?
Todo mundo que tem filhos sabe que se adolescentes fumam, arrumam encrenca com alei ou cometem crimes graves, ou não fazem nada disso, depende muito mais de seu grupo de iguais do que daquilo que seus pais fazem.
Não que os pais não tenham importância. [A mais importante, talvez, seja te-los mantido vivos até que pudessem seguir sozinhos. Eles são os responsáveis por selecionar um ambiente para seus filhos, selecionando assim um grupo de iguais. Incentivam ou criam oportunidades para que seus filhos descubram e/ou desenvolvam talentos.] [Chegará o dia em que os pais saberão que o mais importante será olhar para seus filhos para descobrir o que está em seus genes e com esta informação ajudá-los a encontrar o ambiente que potencializará para o bem seus talentos e propensões.]
Os cientistas já provaram que irmãos são tão parecidos quando criados separadamente quanto quando são criados juntos(...)
Adolescentes propensos à violência só se tornam violentos em bairros perigosos, crianças propensas ao vicio só se tornam fumantes em companhia de iguais que pensam que fumar é o máximo.
Em cada grupo, algumas se tornam lideres, outras soldados rasos, ou bobos da corete, cabeças-quentes, sacos de pancada ou mediadoras, dependendo do nicho que estiver disponível, do quanto a criança está apta para ocupa-lo, e do acaso. Quando uma criança adquire um papel, é difícil livrar-se dele, porque as demais a forçam a permanecer no nicho e porque a criança se especializa nas habilidades necessárias para prosperar nele.
O preenchimento dos nichois nos grupos de iguais, portanto, é em boa medida decorrente do acaso. Mas assim que admintimos Dona Sorte no quadro, ela pode atuar em outras fases da vida. Quando refletimos sobre como chegamos aonde estamos, todos nós podemos lembrar de encruzilhadas no caminho nas quais poderíamos ter seguido direções bem diferentes. Se eu não tivesse ido àquele baile, não teria conhecido a minha esposa. Se não tivesse pegado aquele livro, não teria tomado conhecimento da área que se tornaria a de minha vocação. Se eu não tivesse atendido o telefone, se não tivesse perdio aquele avião, ....!!!
Um nematelminto pode viver 3 vezes mais tempo que um outro que e praticamente seu clone na lamina ao lado. O biólogo Steven Austad comentou sobre o tempo de vida dos nemaltemintos: “Espandosamente, o grau de variabilidade na longevidade que eles apresentam não é muito menor que o de uma população de humanos geneticamente mista, que tem dietas diversas, cuida ou abusa da saúde e está sujeita a todos os caprichos das circunstancias – acidentes de transito, carne contaminada, maníacos com metralhadoras – encontradas na vida industrializada moderna”.
Se o componente não genético da personalidade for resultado de uma roleta de neurodesenvfolvimento, teremos duas surpresas. Uma é que, assim como o termo “genético” da equação do geneticista comportamental não é necessariamente genético, o termo “ambiental” não é necessariamente ambiental. SE a variância inexplicada for um produto de eventos fortuitos na montagem do cérebro, mais uma parte da nossa personalidade seria “biologicamente determinada” (embora não genética) e estaria fora do alcance dos mais bem concebidos planos de pais e sociedade.
Uma mãe declarou ao Chicago Tribune.: “Peço a Deus que isso não seja verdade. A idéia de que todo este amor que lhe dedico apaixonadamente não serve para nada é terrível demais”.
~sim, é decepcionante que não exista um algoritmo para criar uma criança feliz e bem-sucedida. Mas será eu realmente gostaríamos de especificar de antemão as características de nosso filhos e nunca nos maravilhar com os imprevisíveis dons e peculiaridades que cada criança traz ao mundo? As pessoas ficam consternadas com a clonagem humana e sua dúbia promessa de os pais poderão projetar seus filhos usando a engenharia genética. Mas que diferença há entre isso e a fantasia de que os pais podem projetoar seus filhos segundo o modo como os criam? Pais realistas seriam pais menos ansiosos. Poderiam desgrutar seu tempo com os filhos em vez de constantemente tentar estimula-los, socializa-los e melhorar seu caráter. Poderiam ler historias para os filhos por prazer, e não porque é bom para seus neurônios.
Harris está atribuindo aos adultos a responsabilidade por suas próprias vidas: se sua vida não vai be, pré de reclamar que é tudo culpa de seus pais. Ela está salvando as mães das ilusórias teorias que as culpam por todos os infortúnios que se abatem sobre seus filhos, e dos críticos sabichões que as fazem sentir-se uns monstros se saírem furtivamente de casa para trabalhar ou dexarem por uma noite de ler Chapeuzinho Vermelho.
Como escreve Harris: “Podemos não ter o amanhã deles em nossas mãos, mas certamente temos o hoje, e temos o poder de fazer esse hoje extremamente infeliz”.
Maridos e esposas são bons uns com os outros (ou deveriam ser) não para moldar a personalidade do companheiro em uma forma desejave, mas para construir um relacionamento profundo e satisfatório. (...) O comportamento de uma pessoa para com outro (como pai para filho) tem consequencias para a qualidade do relacionamente entre elas. )...) Se não for por outra razão, os pais devem tratar bem os filhos para poermitir-lhes crescer com essas boas lembranças.
“Ser socializado por um grupo de iguais” é outro modo de dizer “viver com êxito em uma sociedade”, o que para um organismo social significa “viver”. A suposicao de que as pessoas são tabulas rasas é aplicada principalmente às crianças, e isso pode nos fazer esquecer que elas são pessoas.
20. As arte
Cowen também observa, citando Hobbes, que rebaixar o presente é um modo indireto de rebaixar os rivais: “A competição de elogios tende à reverencia da antiguidade. Pois os homens competem com os vivos, e não com os mortos”.
Os aborigenes australianos pintam em rochas há 50 mil anos, e ocre vermelho foi usado para maquiagem do corpo há pelo menos o dobro desse período.
Coisas inúteis, paradoxalmente, podem ser muito úteis para certo propósito: avaliação dos bens do possuidor. (...) Thorstein Veblen escreveu que a psicologia do gosto é movida por 3 “princípios pecuniários”: consumo conspícuo, lazer conspícuo e desperdício conspícuo. (.;..) Só os pavões mais sadios podem dar-se ao luxo de desviar nutrientes para uma plumagem dispendiosa e desageitada.
O pássaro-caramancheiro, encontrado na Austrália e na Nova Guiné, constrói um ninho elaborado e o ornamenta meticulosamente com objetos coloridos como orquídeas, cascas de caramujo, frutinhas silvestres e cortiça. Alguns chegam a pintar seus caramanchões com resíduos de grutas regurgitados usando folhas ou casca de arvore como pincel. Diz Miller: “Se pudéssemos entrevistar um pássaro-caramancheiro para uma prestigiosa revista de arte, ele talvez declarasse algo assim: “Sinto um impulso irresistivel de auto-expressao, de simplesmente jogar com cores e formas, é uma coisa inexplicável. Não lembro quando surgiu em mim essa sede devoradora de apresentar campos de cores vivamente saturadas em um cenário monumental porem minimalista, mas me sintao ligado a algo exterior a mim mesmo quando me entrego a essas paixões. Quando vejo uma bela orquídea no alto de uma arvore, não sossego enquanto não a possuo. Quando vejo uma só concha fora de lugar em minha criação tenho de acertá-la. (...) É uma fezil coincidência as fêmeas às vezes virem às inaguracoes de minha galeria e apreciarem meu trabalho, mas seria um sinsulto supor que eu crio com o objetivo de procriar”. Felizmente os pássadors-caramancheiros não falam, e assim podemos usar a seleção natural pra explicar o trabalho deles sem que implorem para ser diferentes.
[Em um estudo descobriu-se que no mundo todo] as pessoas declaram gostar de paisagen pintadas com realismo e suavidade em tons verdes e azuis, contendo animais, mulheres, crianças e figuras heróicas.
A psicologia da arte está enredada na psicololgia do apreço, com seu gosto pelo rao, o suntuoso, o virtuosistico e o deslumbrante. O problema é que toda vez que as pessoas procuram coisas raras, os empreendedores as tornam menos raras, e sempre que uma performance deslumbrante é imitada, pode tornar-se corriqueira. O resultado é a eterna rotatividade de estilos nas artes. O psicólogo Colin Marinhdale documentou que toda forma de arte aumenta em complexidade, ornamentação e carga emocional até que o potencial evocativo do estilo seja completamente explorado. A atenção volta-se, então, para o próprio estilo, momento em que ele dá lugar a outro.
A convicção de que artitstas e connaisseurs são moralmente evoluídos é uma ilusão cognitiva, e tem origem no fato de que nossos circuitos para a moralidade entrecruzam-se com nossos circuitos para o status.
O compositor modernista Karlheinz Stockhausen qualificou os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 como “a maior obra de arte imaginável em todo o cosmo” e acrescentou, com inveja, que “também os artistas às vezes ultrapassam os limites do que é viável e concebível, para nos despertar, para nos abrir para outro mundo”.
A vida, disse Pascal, é como viver numa prisão de onde todos os dias companheiros de reclusão são levados e executados. Estamos todos, como Xerazade, sentenciados à morte, e todos vemos nossas vidas como narrativas, com começos, meios e fins.
John Updike: “Ser humano é estar na tensa condição de um animal conscientemente libidinoso que prevê a morte. Nenhuma outra criatura do planeta sofre de tamanha capcidade de pensar, tamanha complexidade de possibilidades imaginadas mas frustradas, tamanha capacidade perturbadora para questionar os imperativos tribais e biológicos.”
“Parece-me verdade que o Homo sapiens nunca há de acomodar-se em uma utopia tão satisfeito que relaxe seus conflitos e apague toda a sua carência geradora de perversidades”.
PARTE IV
A voz da espécie
[A assunção de uma mente como uma tábula rasa só nos serviu para gerar regimes totalitários e genocidios.]
Margaret Mead, um ícone do igualitarismo no século XX, disse à filha que atribuía seu talento intelectrual a seus genes, e posso confirmar que esses casos de personalidade dividida são comuns entre os acadêmicos.
O conto de “Harrison Bergeron” de Kurt Vonnegut, é tão transparente quanto o poema de Dickinson é enigmático. Começa assim:
Era o ano de 2081, e todos eram finalmente iguais. Não eram iguais apenas perante Deus e a lei. Eram iguais em tudo. Ninguém era mais inteligente que ninguém. Ninguém era mais bonito que ninguém. Ninguém era mais forte nem mais veloz que ninguém. Toda essa igualdade provinha das 211a., 212a. e 213a Emendas Constitucionais e da incessante vigilância dos agentes do Nivelador Geral dos Estados Unidos.
O Nivelador Geral impõe a igualdade neutralizando qualquer vantagem herdada (e portanto imerecida). Pessoas inteligentes têm de usar rádios nos ouvidos sintonizados com um transmissor governamental que emite um ruído forte a cada vinte segundos (como o som de uma garrafa de leite golpeada por um martelo), pra impedi-las de conseguir uma vantagem injuista com seus cérebros. Bailarinas têm de usar pesos feitos com chumbo de caça e cobrir o rosto com máscara para que ninguém se sinta mal por ver outra pessoa mais bonita e graciosa. Locutores de noticiário são escolhidos por ser portadores de defeito na fala. O herói da historia é um adolescente com múltiplos talentes obrigado a usar fones de ouvido, opculos de grossas lentes onduladas, cem quilos de sucata de ferro e coroas pretas em metade dos dentes. A historia fala de sua malsinada rebelião.
Sutil ou não, “Harrison Bergeron” é uma redução espirituoso de uma falácia muitíssimo comum. O ideal da igualdade política não é uma garantia de que as pessoas são inatamente indistinguíveis. É uma política de tratar as pessoas em certas esferas (justiçca, educação, política) com base em seus méritos individuais, e não nas estatísticas de qualquer grupo a que elas pertençam. E é uma política de reconhecer direitos inalienáveis em todas as pessoas pelo fato de que elas são seres humanos dotados de sensibilidade. Políticas que insistem em que as pessoas sejam idênticas em seus resultados têm de impor custos a humanos que, como todos os seres vivos, variam em sua dotação biológica. Como os talentos, por definição, são raros e só em raras circunstancias podem realizar-se plenamente, é mais fácil atingie a igualdade forçada nivelando por baixo (e assim privando toda a coletividade dos frutos dos talentos individuais). Nos Estados Unidos de 2081 descrito por Vonnegut, o desejo de igualdade de resultados é representado como uma farsa, mas no século XX esse mesmo desejo levou a crimes reais contra a humanidade, e em nossa sociedade toda essa questão freqüentemente é tabu.
Huckleberry Finn (personagem de Mark Twain) faz a festa com muitas imperfeições humanas, mas talvez a mais tragicômica seja a origem da violência em uma cultura da honra. A cultura da honra é, na realidade, uma psicologia da honta: um conjunto de emoções que inclui a lealdade à família, a sede de vingança e o impulso de manter uma reputação de valentia e valor. Euando desencadeadas por outros pecados humanos – inveja, luxuria, auto-engao – essas emoções podem alimentar um circulo vicioso de violência, pois cada lado se vê incapaz de renunciar à vingança contra o outro.
Ver lista dos universais humanos elaborada por Donald E. Brown
Bibliografia
Sociobiology – E. O. Wilson – publicado em 1975 – até hoje sem tradução em português.
Consilience - E. O. Wilson – Este tem tradução – Consiliência.
As Aventuras de Huckleberry Finn – Mark Twain
Altruísmo – na biologia, significa que um organismo pode beneficiar outro organismo a um custo para si mesmo.
Ambiente compartilhado – é aquele que exerce influencia sobre nós e nossos irmãos igualmente: nossos pais, nossa vida domestica e nossa vizinhança.
Ambiente não compartilhado ou único - é qualquer coisa que influencie um irmão mas não o outro, incluindo o favoritismo dos pais, a presença de outros irmãos, experiências únicas como cair de uma bicicleta ou ser infectado por um vírus, e, na verdade, qualquer coisa que nos aconteça no decorrer da vida que não necessariamente aconteça aos nossos irmãos.
axônios – fibras de saída dos neurônios
Biofilia – termos cunhado por O Wilson significando o prazer com as formas de seres vivos.anátema - maldição
epidemiologia – como as doenças se propagam
Eugenia – ações de extermínio que visam a “purificação” de uma raça.
Hedonismo – doutrina que considera que o prazer individual e imediato é o único bem possível, principio e fim da vida moral.
Niilismo – redução a nada; descrença absoluta; Doutrina segundo a qual nada existe de absoluto; Doutrina segundo a qual não há verdade moral nem hierarquia de valores.
Psicologia social – ciência de como as pessoas comportam-se umas em relação às outras.
Redução de dissonância cognitiva – processo pelo qual as pessoas mudam qualquer opinião a fim de manter uma auto-imagem positiva.
Trade-off – conflito. Ex: trade off entre liberdade e igualdade material, entre trabalhar e cuidar dos filhos.
Universais Humanos – são as características dos seres humanos que cientistas encontraram em todas as culturas da Terra. Ex.: necessidade de abrigo, adorno corporal, armas, atração sexual, distinção entre bom e mau, casamento, dança, divisão do trabalho, estupro, insulto, mágica, mitos, piadas, propriedade, semântica, simbolismo, status por idade, tabus, verbos etc.