EXTRATO DE: O JARDIM DAS AFLIÇÕES
De Epicuro à ressurreição
de César: ensaio sobre o Materialismo e a Religião Civil
Autor: Olavo de Carvalho
Ed. Vide Editorial –
1995/2015/2021
[O livro é uma
“resposta” à palestra proferida por José Américo Motta Peçanha, no MASP, em
maio de 1990, a que Olavo assistiu e não gostou. Cheguei apenas à metade. Não
vi relevância alguma para nós, “os mundanos”. Para saber sobre Epicuro e Marx,
os mais citados, melhor ir direto aos próprios. Vejamos o que consegui extrair.
Fundamental você ter em mente que o livro foi escrito há 31 anos!!!!]
Discordar [de Peçanha]
seria aí tão descabido quanto tentar deter um assaltante à força de citações do
Código Penal.
Pelas mãos de Peçanha o
público era convidado a mergulhar num abismo de inconsciência, na treva sem fim
de um definitivo adeus à inteligência.
HEGEL
1 - a essência de uma
coisa é aquilo em que ela enfim se torna.
2 – A autoconsciência é
a terra natal da verdade;
Não é de hoje que a filosofia assume o encargo de
guiar o mundo, quando ele, desorientado e perplexo, já não consegue se guiar
por si mesmo.
A fama de inquisitorial
dada a posteriori à Idade Média, obedece à definição stenhaliana da fama:
conjunto de equívocos que a posteridade tece em torno de um nome.
Com que finalidade um
grupo de intelectuais declaradamente empenhados na salvação moral do país se
envolve num empreendimento tão comprometedor como esse de contar ao povo uma
História da Ética que falta com a ética para poder falsificar a História?
Epicuro ensinava que o
filósofo deve abandonar todo empenho de reformar a sociedade, retirando-se para
a vida contemplativa na solidão do campo. Propor isto como um remédio eficaz
para a corrupção reinante é o mesmo que recomendar a fuga para longe dos
credores como um método eficaz de saldas as dívidas.
[Olavo atribui a Epicuro
ter sido um “clássico do besteirol”.]
Bismarck dizia que a
ciência do governo consiste em pauladas e guloseimas.
[Os filósofos clássicos proclamavam] a
superioridade da contemplação sobre a ação, a vida filosófica como um caminho
para a felicidade etc. etc.
Platão: verdade
conhecida é verdade obedecida.
A opção pela verdade
deve ser refeita diariamente entre as hesitações e duvidas que constituem o preço da dignidade humana.
O que me intriga é: como
um homem de personalidade normal pode ser transformado de tal maneira que seu
sendo moral se torne idêntico ao de um sociopata de nascença? Como se pode
inocular artificialmente a perversidade moral?
Lorenz: alguma
interferência externa apagou de seus cérebros os registros da experiência moral
acumulada ao longo da evolução biológica.
Não há talvez no mundo
um setor de pesquisas em que governos, partidos
políticos, organizações religiosas e pseudo-religiosas, empresas e sindicatos
tenham investido mais do que no dos meios de subjugar a mente humana. (...) O
domador de homens tem hoje à sua disposição um arsenal de recursos mais vasto e
eficaz que o dos técnicos de qualquer outro campo de atividade.
A coisa que mais
impressiona o estudioso da nova patologia (psicose informática) é a onipresença
da manipulação da mente na vida contemporânea.
Qual teria sido a sorte
da indústria das comunicações de massas sem o uso da influencia subliminar pela
qual reduzem à passividade mais idiota o público jovem de todos os países?
Se retirássemos, enfim,
do panorama histórico do século XX as técnicas de manipulação da mente, nada
teria podido acontecer como aconteceu. (...) este foi o século da escravização
mental. [Nisto] Lorenz enxerga o começo da demolição da espécie humana. [Mas,
pergunta Olavo] Não é antes mais provável que a humanidade assim manipulada,
estonteada, ludibriada vinte e quatro horas por dia acabe
por entrar num estado crônico de auto-engano? (...) cresce em todo o mundo uma
espécie de anticivilização, a civilização do Anticristo. (...) pilares de um
culto universal do engano.
[O importante é
persuadir, e não provar. Epicuro? Peçanha?]
[Use o Photoshop, melhore
a imagem que você alivia o sofrimento.]
O uso habilidoso dos
sinais não-verbais permite abrir hiatos na atenção consciente, mudar
imperceptivelmente o curso do raciocínio, levar uma pessoa a fazer o que acha
errado, a comprar o que não quer, a aprovar o que lhe repugna.
O uso disseminado dessas
técnicas arrisca minar todo o campo da convivência humana (...). e aí, conforme esses neomaquiavéis se unam para dominar o
restante da população ou entrem em competição feroz uns com os outros, teremos
ou a mais perfeita e indestrutível das tiranias ou a anarquia generalizada, a
patifaria universal.
A incapacidade de um
povo para perceber os perigos que o ameaçam é um dos sinais mais fortes da
depressão autodestrutiva que prenuncia as grandes derrotas sociais.
O resultado é que o
domínio dos meios de escravizar a mente do povo cresce na razão inversa dos
meios que ele possa ter para defender-se. E ai já não se sabe quem é mais
culpado: o sedutor que escraviza ou o seduzido que se entrega, com deleites de
masoquismo, à servidão voluntária.
Só quem escapou da
manipulação sabe que é manipulado.
O jornal O Estado de São
Paulo noticiou algum tempo atrás a mais estranha onda de crimes que já se vira
na Itália. Tratava-se de um novo tipo de assalto, em que os criminosos
usavam... uma forma de hipnose instantânea e
praticamente irresistível. As vítimas principais eram caixas de bancos (...)
que entregavam uma a uma as cédulas sem resistência. Até que 10 minutos depois
se davam conta do que haviam feito.
Uma das conclusões de
uma pesquisa: O fator decisivo é o controle planejado do fluxo de informações,
que pode ser realizado à distância (BM).
A observação mais
superficial gasta para mostrar que a manipulação da psique já se tornou, em
muitos setores de atividade, um hábito corrente, cuja licitude ninguém se
lembra de pôr em discussão.
Levado a agir como se
acreditasse naquilo que nega, o homem das grandes cidades é hoje um esquizóide,
que só pode acreditar na realidade quando ela não tem sentido e só pode
enxergar um sentido na negação da realidade.
A velha oposição entre
evasão e ativismo perdeu todo sentido num mundo em que a ação política se
tornou um escapismo para alivio das mentes imaturas e em que as fantasias mais
extravagantes são celebradas como formas de “protesto” contra um mundo mau.
O típico intelectual
exasperado ode hoje defende sistematicamente reivindicações contraditórias:
liberação do aborto e repressão ao assedio sexual, moralismo político e
imoralismo erótico, liberação das drogas e proibição dos cigarros, destruição
das religiões tradicionais e defesa das culturas pré-modernas,
democracia direta e controle estatal da posse de armas, liberdade irrestrita
para o cidadão e maior intervenção do Estado na conduta privada, anti-racismo e
defesa de “identidades culturais” sustentadas na separação das raças (...).
[Nesta luta pelo phoder]
pouco importa quem ganhe a disputa: a humanidade perderá. (...) Que diferença
faz se a manipulação da mente é empreendida sob o pretexto de manter as massas
na passividade de uma rotina conservadora ou de impeli-la a fazer uma
revolução? (...) Que importam o racismo, a pobreza, a injustiça social, a
corrupção dos políticos, se a arma que se consagrou na luta para conservá-los
ou extingui-los é a escravização da espécie humana, a abolição da consciência,
a redução das massas a um
rebanho de bichos controlados à distancia por uma tecnologia do
engodo, que destitui o homem do bem supremo que, uma vez perdido, irrecuperável
para sempre?
Em dialética é assim
mesmo: quando a treva da contradição se adensa até o intolerável, é que estamos
chegando mais perto do desenlace que tudo esclarecerá.
Não é estranho que após
tudo o que se revelou sobre a tirania comunista o socialismo ainda continue a
ser um ideal respeitável, quando crimes de muito menor escala bastaram para
manchar de sangue para sempre a imagem do fascismo italiano, do franquismo ou
das ditaduras latino-americanas?
Temos de admitir que de
fato os filósofos, desde sempre, se ocuparam de interpretar o mundo, de fazer
teoria, porque julgavam que esta era a sua tarefa específica, que os distinguia
dos outros homens, ocupados por seu turno comunismo a práxis. (...) A maioria
dos homens esteve sempre envolvida com a práxis, e desinteressada theoria, da
contemplação da verdade.
A prática, que
transforma, se dirige essencialmente aos meios: como toda transformação visa a
um resultado ou fim, o objeto sobre o qual incide é sempre e necessariamente um
meio, apenas um meio. É um meio ou instrumento a terra que o homem lavra (...)
A tendência universal do homem à economia de esforça mostra a sujeição dos
meios aos fins.
O objeto amado, se o é
de verdade, não é meio, mas fim. Não desejamos muda-lo, transforma-lo,
utiliza-lo para alguma outra coisa, e sim desfrutar de sua presença sem altera-lo, sem muda-lo no que quer que seja.
Não existe, no mundo dos
seres físicos, nem práxis pura nem pura contemplação.
O homem não transforma o
que lhe agrada, mas o que lhe desagrada: ele entrega-se à contemplação por
gosto, à prática por necessidade.
A elevada taxa de
intelectuais pedantes e de ricaços esteticistas nas fileiras da esquerda (...)
é a manifestação perfeita do espírito da coisa: lutar por “uma sociedade
justa” é o diletantismo ético daqueles que não acreditam em ética nenhuma
exceto como convenção arbitrária, mito ideológico ou expediente tático.
Os homens não se movem
por conceitos, e sim por impressões. [e por não saber para onde se move] a ciência
de produzir impressões ´~e cultivada com esmero por
todos aqueles que têm a ambição de conduzir os povos.
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Eric Voegelin: A Nova Ciência
Política