Autor: Manuel Castells
Editora Paz e Terra - 1999
Originalmente publicado em 1995
Prólogo: A Rede e o Ser
Um novo sistema de comunicação q fala cada
vez mais uma língua universal digital tanto está promovendo a integração global
da produção e distribuição de palavras, sons e imagens de nossa cultura como personalizando-os ao gosto das identidades e humores dos indivíduos.
Os movimentos sociais tendem a ser
fragmentados, locais, com objetivo único e efêmeros,
encolhidos em seus mundos interiores ou brilhando por apenas um instante
em um símbolo da mídia. Nesse mundo de
mudanças confusas e incontroladas, as pessoas tendem a reagrupar-se em torno de
identidades primárias: religiosas, étnicas, territoriais, nacionais.
Essa tendência não é nova, uma vez que a
identidade e, em especial, a identidade religiosa e étnica tem sido a base do significado desde os primórdios da sociedade
humana.
Cada vez mais, as pessoas organizam seu
significado não em trono do que fazem, mas com base no que elas s ou acreditam
que são. Enquanto isso, as redes globais de intercâmbios instrumentais conectam
e desconectam indivíduos, grupos, regiões e até países, de acordo com sua
pertinência na realização dos objetivos processados na rede, em um fluxo
contínuo de decisões estratégicas.
Nesse processo a fragmentação social se
propaga à medida que as identidades tornam-se mais especificas e cada vez mais
difíceis de compartilhar.
Tecnologia, sociedade e transformação
histórica - 24
A habilidade ou inabilidade de as
sociedades dominarem a tecnologia e, em especial, aquelas tecnologias que são
estrategicamente decisivas em cada período histórico, traça seu destino a ponto
de podermos dizer que, embora não determine a evolução histórica e a
transformação social, a tecnologia (ou sua falta) incorpora a capacidade de
transformação das sociedades, bem como os usos que as sociedades, sempre em um processo conflituoso,
decidem dar ao seu potencial tecnológico.
O que deve ser guardado para o entendimento
da relação entre a tecnologia e a sociedade é que o papel do Estado, seja
interrompendo, seja promovendo, seja liderando a inovação tecnológica, é um fator
decisivo no processo geral, à medida que expressa e organiza as forcas sociais
dominantes em um espaço e uma época determinados.
Informacionalismo, industrialismo,
capitalismo, estatismo: modos de desenvolvimento e modos de produção
Este livro estuda o surgimento de uma nova
estrutura social, manifestada sob varias formas conforme a diversidade de
culturas e instituições em todo o planeta. Essa nova estrutura social está
associada ao surgimento de um novo modo de desenvolvimento, o informacionalismo,
historicamente moldado pela reestruturação do modo capitalista de produção, no
final do século XX. A perspectiva teórica que fundamenta essa abordagem postula
que as sociedades são organizadas em processos estruturados por relações
historicamente determinadas de produção,
experiência e poder.
·
Produção é a ação da humanidade
sobre a matéria (natureza) para apropriar-se dela e transformá-la em seu
beneficio, obtendo um produto, consumindo (de forma irregular) parte dele e
acumulando o excedente para investimento conforme os vários objetivos
socialmente determinados.
·
Experiência é a ação dos sujeitos
humanos sobre si mesmos, determinada pela interação entre as identidades
biológicas e culturais desses sujeitos em relação a seus ambientes sociais e
naturais. É construída pela eterna busca de satisfação das necessidades e
desejos humanos.
·
Poder é a aquela relação entre os
sujeitos humanos que, com base na produção e na experiência, impõe a vontade
alguns sobre os outros pelo emprego potencial ou real de violência física ou
simbólica.
O capitalismo visa a maximização de lucros,
ou seja, o aumento do excedente apropriado pelo capital com base no controle
privado sobre os meios de produção e circulação. O estatismo visa a maximização
do poder, ou seja, o aumento da capacidade militar e ideológica do aparato
político para impor seus objetivos sobre um número maior de sujeitos e nos
níveis mais profundos de seu consciente.
No novo modo informacional de
desenvolvimento, a fonte de produtividade acha-se na tecnologia de geração de
conhecimentos, de processamento da informação e de comunicação de símbolos.
O Ser na sociedade informacional
Alain Touraine vai mais além, afirmando que
“numa sociedade pós-industrial em que os serviços culturais substituíram os
bens materiais no cerne da produção, é a defesa da personalidade e cultura do
sujeito contra a lógica dos aparatos e mercados que substitui a idéia de luta
de classe”. Portanto, de acordo com Calderon e Laserna, a questão principal, em
um mundo caracterizado pela globalização e fragmentação simultâneas, vem a ser
esta: “Como combinar novas tecnologias e memória coletiva, ciência universal e
culturas comunitárias, paixão e razão?“ Como, de fato! E por que observamos a
tendência oposta em todo o mundo, ou seja, a distancia crescente entre
globalização e identidade, entre a Rede e o Ser?
Quando a Rede desliga o Ser, o Ser,
individual ou coletivo, constrói seu significado sem a referência instrumental
global: o processo de desconexão torna-se recíproco após a recusa, pelos
excluídos, da lógica unilateral de dominação estrutural e exclusão social.
1 - A Revolução da Tecnologia da Informação
- 49
Como tecnologia, entendo (...) “o uso de
conhecimentos científicos para especificar as vias de se fazerem as coisas de
uma maneira reproduzível”.
O processo atual de transformação
tecnológica expande-se exponencialmente em razão de sua capacidade de criar uma
interface entre campos tecnológicos mediante uma linguagem digital comum na
qual a informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida.
Vivemos em um mundo que, segundo Nicholas Negroponte, se tornou digital.
A tecnologia da informação é para esta
revolução o que as novas fontes de energia foram para as Revoluções Industriais
sucessivas, do motor a vapor à eletricidade, aos combustíveis fosseis e ate
mesmo à energia nuclear, visto que a geração e distribuição de energia foi o
elemento principal na base da sociedade industrial.
A difusão da tecnologia amplifica seu poder
de forma infinita, à medida que os usuários apropriam-se dela e a redefinem.
Além disso, a velocidade da difusão
tecnológica é seletiva tanto social quanto funcionalmente.
Os registros históricos parecem indicar
que, em termos gerais, quanto mais próxima for a relação entre os locais de
inovação, produção e utilização das novas tecnologias, mais rápida será a
transformação das sociedades e maior será o retorno positivo das condições
sociais sobre as condições gerais para favorecer futuras inovações.
·
custo médio de um circuito integrado
caiu de US$50 em 1962 para US$ 1 em 1971,
·
custo médio de processamento da
informação caiu de aproximadamente US$75 por milhão de operações em 1960, para
menos de um centésimo de centavo de dólar em 1990.
Formas de utilização do espectro de
radiodifusão:
·
transmissão tradicional
·
transmissão direta via satélite
·
microondas
·
telefonia celular digital
Embora a biotecnologia possa remontar a
tabuletas de anotações babilônicas de 6000 antes de Cristo sobre fermentação, e
a revolução em microbiologia tenha ocorrido em 1953 com a descoberta cientifica
da estrutura básica da vida, a hélice dupla de DNA, por Fancis Crick e James
Watson na Universidade de Cambridge, foi somente no inicio da década de 70 que
a combinação genética e a recombinação do DNA, base tecnológica da engenharia
genética, possibilitaram a aplicação de conhecimentos cumulativos.
A clonagem genética entrou em um novo
estagio quando, em 1988, Harvard patenteou um rato produzido pela engenharia genética,
tirando, assim, os direitos autorais de vida das mãos de Deus e da Natureza.
Com as expectativas geradas por essas
descobertas, o governo dos EUA decidiu patrocinar e custear, em 1990, um
programa de 15 anos de cooperação no valor de US$ 3 bilhões, coordenado por
James Watson, reunindo alguns dos mais avançados grupos de pesquisa em
microbiologia para mapear o genoma humano, isto é, para identificar e catalogar
entre 60 e 80 mil genes que compõem o alfabeto da espécie humana.
(...) alguns pesquisadores transformados em
empresários estão se apressando e estabelecendo mecanismos para o controle
legal e financeiro do genoma humano. (...) Usando a potência de
supercomputadores, apenas em cinco anos Creig e Hanseltine determinaram a
seqüência de porções de aproximadamente 85% de todos os genes humanos, criando
uma base de dados genéticos gigantesca. O problema é que ambos não sabem - e
não saberão por um longo tempo - qual a função de cada porção genética ou onde
ela está localizada: a base de dados engloba centenas de milhares de fragmentos
genéticos com funções desconhecidas.
Todas as indicações apontam para uma
explosão de aplicações na virada do milênio, que desencadeara um debate
fundamental na fronteira, atualmente obscura, entre a natureza e a sociedade.
(...) enquanto empresas grandes e
bem-estabelecidas do leste eram rígidas (e arrogantes) demais para reequipar-se
constantemente com base em novas empresas e praticando troca de experiência e
difusão de conhecimentos por intermédio da rotatividade de profissionais e de
cisões parciais.
A forca cultural e empresarial da metrópole
faz dela o ambiente privilegiado dessa nova revolução tecnológica,
desmistificando o conceito de inovação sem localidade geográfica na era da
informação.
Portanto, foi o Estado, e não o
empreendedor de inovações em garagens, que iniciou a Revolução da Tecnologia da
Informação tanto nos Estados Unidos como em todo o mundo.
“A um contemporânea de paradigma pode ser
vista como uma transferência de um tecnologia baseada principalmente em insumos
baratos de informação derivados do avanço da tecnologia em microeletrônica e
telecomunicações.” Christopher Freeman
A primeira característica do novo paradigma
é que a informação é sua matéria-prima: são tecnologias para agir sobre a
informação, não apenas informação para agir sobre a tecnologia, como foi o caso
das revoluções tecnológicas anteriores.
A segunda, refere-se à penetrabilidade dos
efeitos das novas tecnologias.
A terceira refere-se à lógica de redes em
qualquer sistema ou conjunto de relações.
Em quarto lugar, referente ao sistema de
redes, mas sendo um aspecto claramente destino, o paradigma da tecnologia da
informação é baseado na flexibilidade. Não apenas os processos são reversíveis,
mas organizações e instituições podem ser modificadas, e até mesmo
fundamentalmente alteradas, pela reorganização de seus componentes.
Uma quinta característica dessa revolução
tecnológica é a crescente convergência de tecnologias especificas para um
sistema altamente integrado, no qual trajetórias tecnológicas antigas ficam
literalmente impossíveis de se distinguir em separado.
As telecomunicações agora são apenas uma
forma de processamento da informação; as tecnologias de transmissão e conexão
estão, simultaneamente, cada vez mais diversificadas e integradas na mesma rede
operada por computadores.
Seus membros procuram compreender o
surgimento de estruturas auto-organizadas que criam complexidade a partir da
simplicidade e ordem superior a partir do caos, mediante várias ordens de
interatividade entre os elementos básicos na origem do processo.
A primeira lei de Kranzberg diz: “A
tecnologia não é nem boa, nem ruim e também não é neutra.” É uma forca que
está, mais do que nunca, sob o atual paradigma tecnológico que penetra no âmago
da vida e da mente.
2 - A economia informacional e o processo
de globalização - 87
Será que estamos apenas observando o
estágio maduro do sistema econômico industrial cuja acumulação constante de
capacidade produtiva libera a mão-de-obra da produção material direta em
beneficio das atividades de processamento da informação, como sugerido no
trabalho pioneiro de Marc Porat?
Os historiadores econômico-financeiros
afirmam que uma considerável defasagem de tempo entre uma inovação tecnológica
e a produtividade econômica é característica das revoluções tecnológicas
passadas.
Alguns setores de serviços nos EUA, como
telecomunicações, transporte aéreo e ferrovias mostraram aumentos substanciais
de produtividade, entre 4,5% e 6,8% ao ano no período de
A longo prazo, a produtividade é a fonte da
riqueza das nações. (...) Mas, de acordo com a perspectiva de agentes
econômicos, a produtividade não é um objetivo
Para aumentar os lucros, em um
determinado ambiente financeiro e comercial os preços ajustados pelo mercado,
há quatro caminhos principais:
1.
reduzir os custos de produção
(começando com custos de mão-de-obra);
2.
aumentar a produtividade;
3.
ampliar o mercado;
4.
e acelerar o giro do capital.
A crise real dos anos 70 não foi a dos
preços do petróleo. Foi a da inabilidade do setor público para continuar a
expansão de seus mercados e, dessa forma, a geração de emprego sem aumentar os
impostos sobre o capital nem alimentar a inflação, mediante a oferta adicional
de dinheiro e o endividamento público.
Para abrir novos mercados, conectando
valiosos segmentos de mercado de cada país a uma rede global, o capital
necessitou de extrema mobilidade, e as empresas precisaram de uma capacidade de
informação extremamente maior.
Chesnais mede o movimento da
internacionalização do capital, calculando a percentagem sobre o PIB de
operações internacionais em ações e obrigações: em 1980, essa percentagem não
superava 10% em nenhum país importante; em 1992, variava entre 72,2% do PIB
(Japão) e 122,2% (França), com os EUA na marca de 109,3%.
Juntamente com a busca da lucratividade
como a motivação propulsora da empresa, a economia informacional também é
moldada pelo interesse das instituições políticas em promover a competitividade
dessas economias que elas supostamente representam.
Os países que são expostos exclusivamente
aos impulsos das forcas de mercado, em um mundo em que as relações de poder já
estabelecidas entre os governos e as empresas multinacionais direcionam e dão
forma às tendências de mercado, ficam muito vulneráveis aos fluxos financeiros
voláteis e à dependência tecnológica.
O que mudou foi a capacidade tecnológica de
utilizar, como forca produtiva direta, aquilo que caracteriza nossa espécie
como uma singularidade biológica: nossa capacidade superior de processar
símbolos.
Uma economia global é algo diferente: é uma
economia com capacidade de funcionar como uma unidade em tempo real, em escala
planetária.
Uma vez que as moedas são interdependentes,
as economias de todas as partes também o são.
A mão-de-obra imigrante de todas as partes
do planeta pode fluir para qualquer lugar em que haja empregos, mas sua
mobilidade está cada vez mais restrita por movimentos xenofóbicos que levam a
controles de imigração muito mais rigorosos.
[Uma definição para “A Rede Global”: ]
Processo produtivo que incorpora
componentes produzidos em vários locais diferentes, por diferentes empresas, e
montados para atingir finalidades e mercados específicos em uma nova forma de
produção e comercialização: produção em grande volume, flexível e sob
encomenda.
(...) a mobilidade da mão-de-obra é
prejudicada pelos controles de imigração e pela xenofobia das pessoas;
“O conceito é interdependência não-hegemonica. O resultado é conflito e
cooperação, divergência e convergência.” Barbara Stallings
Os Estados são a
expressão das sociedades, não das economias. O que se torna crucial na
economia informacional é a complexa interação entre as instituições políticas
com raízes históricas e os agentes econômicos cada vez mais globalizados.
Portanto, embora a economia informacional
afete o mundo inteiro e, nesse sentido, seja global mesmo, a
maior parte das pessoas do planeta não trabalho para a economia informacional/global
nem compra seus produtos.
Quatro processos principais determinam a forma e o resultado da concorrência:
1.
Capacidade tecnológica.
2.
Acesso a um grande mercado afluente
integrado
3.
Diferencial entre os custos de
produção no local da produção e os preços do mercado de destino
4.
Capacidade política das instituições
nacionais e supranacionais para impulsionar a estratégia de crescimento desses
países ou regiões sob sua jurisdição.
A auto-suficiência européia no importante
setor de aviação comercial nunca poderia ter sido alcançada sem a ajuda
decisiva dos governos francês, alemão, britânico e espanhol para lançar e
comercializar o airbus.
A economia global resultante da produção e
concorrência com base informacional caracteriza-se por sua interdependência,
assimetria, regionalização, crescente diversificação dentro de cada região,
inclusão seletiva, segmentação excludente e, em conseqüência de todos esses
fatores, por uma geometria extraordinariamente variável que tende a desintegrar
a geografia econômica e histórica.
Segundo as projeções, no ano 2000, as
empresas da Europa Ocidental controlarão 14% da produção industrial
norte-americana, e as empresas norte-americanas, 16% da produção da Europa
Ocidental.
Em
Acrescentado-se
à OCDE os 4 países recém-industrializados da Ásia, em
1988 as 3 principais regiões econômicas representavam 72,8% da produção
industrial mundial, e no ano 2000 sua participação ainda devera totalizar
69,5%, embora a população dessas três regiões no ano 200 esteja projetada para
apenas 15,7% da população mundial.
Quanto a gastos com P&D , enquanto a América
do Norte representava 42,8% do total mundial em
Somando-se os países asiáticos recém-industrializados ao Japão para formar a região da
Ásia desenvolvida, essa área fica prestes a tornar-se a maior região industrial
do mundo, com 26,9% da indústria mundial no ano 2000 em comparação com 24,6%
para a Europa Ocidental e apenas 18% para a América do Norte.
O PIB da China cresceu em média 9,4% em
1980-91, 12,8% em 1992 e 13,4% em 1993.
Algumas regiões rurais da China, Índia e
América Latina, países inteiros ao redor do mundo e grandes segmentos da
população em todos os lugares estão se tornando irrelevantes (sob o ponto de
vista dos interesses econômicos predominantes) no novo modelo de divisão
internacional do trabalho e, portanto, estão enfrentando exclusão social.
As empresas e as pessoas físicas opulentas
cuidavam da própria sobrevivência, depositando suas economias nas redes financeiras
internacionais, de forma que nos anos
Cerca de 60% da população peruana permanece
abaixo do nível de pobreza, mas isso não diminui a importância do fato de um
pais, que em 1992 estava 30% abaixo do nível do seu PIB per capita de dez anos
antes, tornar-se, em
Parte da nova prosperidade da região
(Brasil, Argentina, Peru, Bolívia e México) poderia ser um milagre financeiro,
sujeito a fluxos reversíveis de capital que examinam o
planeta constantemente buscando uma lucratividade de curto prazo, bem como
posicionar-se em setores estratégicos (telecomunicações, por exemplo).
A estabilidade e prosperidade da África do
Sul, aliadas a sua disposição e capacidade de liderar os vizinhos como primus inter pares, oferece a
melhor oportunidade de evitar o holocausto humano que ameaça a África e, por
seu intermédio, o senso de humanidade em todos nós.
3 - A empresa em rede: a cultura, as
instituições e as organizações da economia informacional - 173
Para poder generalizar o método a todo o
sistema da fábrica, os engenheiros japoneses estudaram os procedimentos de
controle para avaliação dos estoques das prateleiras empregados nos
supermercados norte-americanos.
A execução do modelo também depende da
ausência de grandes rupturas em todo o processo produtivo e de distribuição.
Ou, em outras palavras, baseia-se na suposição dos “cinco zeros”: nível zero de
defeitos nas peças; dano zero nas máquinas; estoque zero; demora zero;
burocracia zero.
Em resumo, a grande empresa nessa economia
não e’ - e não mais será - autônoma e auto-suficiente. A arrogância das IBMs, das Philips ou das Mitsuis do mundo tornou-se questão de historia cultural.
Suas operações reais são conduzidas com outras empresas: não apenas com as
centenas ou milhares de empresas subcontratadas e
auxiliares, mas dezenas de parceiras relativamente iguais, com as quais ao
mesmo tempo cooperam e competem neste admirável mundo novo econômico, onde
amigos e adversários são os mesmos.
A empresa horizontal parece apresentar sete
tendências principais:
·
organização
em trono do processo, não da tarefa;
·
hierarquia
horizontal;
·
gerenciamento
em equipe;
·
medida
do desempenho pela satisfação do cliente;
·
recompensa
com base no desempenho da equipe
·
maximização
dos contatos com fornecedores e clientes
·
informação,
treinamento e retreinamento de funcionários em todos
os níveis
Em sua manifestação mais extrema, criou o
que foi chamado de “a empresa vazia”, isto é, um negócio especializado em
intermediação entre financiamento, produção e vendas no mercado com base em uma
marca comercial estabelecida ou em uma imagem industrial.
Para conseguir absorver os benefícios da
flexibilidade das redes, a própria empresa teve de tornar-se uma rede e
dinamizar cada elemento de sua estrutura interna: este é na
essência o significado e o objetivo do modelo da “empresa horizontal”.
As informações circulam pelas redes: redes
entre empresas, redes dentro de empresas, redes pessoais e redes de
computadores. As novas tecnologias de informação são decisivas para que esse
modelo flexível e adaptável realmente funcione.
A “empresa horizontal” é uma rede dinâmica
e estrategicamente planejada de unidades auto-programadas
e autocomandadas com base na descentralização,
participação e coordenação.
O sistema kan-ban
foi introduzido na Toyota pela primeira vez em 1948 e sua implementação não
precisou de conexões eletrônicas on-line.
Para definir a empresa em rede de forma
mais precisa, relembro minha definição de organização : um sistema de meios
estruturados com o propósito de alcançar objetivos específicos.
O desempenho de uma determinada rede
dependerá de dois de seus atributos fundamentais: conectividade, ou seja, a
capacidade estrutural de facilitar a comunicação sem ruídos entre seus
componentes; coerência, isto é, a medida em que há
interesses compartilhados entre os objetivos da rede e de seus componentes.
As empresas chinesas bem-sucedidas passam
por quatro fases em três gerações: emergente, centralizada, segmentada e desintegrativa, após a qual o ciclo começa novamente.
(...) a gloria duradoura
da civilização chinesa, na verdade, dependia da vitalidade contínua das
famílias egoisticamente bem-sucedidas.
As empresas multinacionais parecem ser
ainda muito dependentes de suas bases nacionais. E a idéia de as empresas
transnacionais serem “cidadãs da economia mundial” parece não ter validade.
Ghoshal
e Bartlett, após reunir dados sobre a transformação
das empresas multinacionais, definem a multinacional contemporânea como “uma
rede interorganizacional” ou, mais precisamente, “uma
rede que está inserida em uma rede externa”.
O gerenciamento das incertezas torna-se
decisivo em uma situação de interdependência assimétrica.
O aumento dos custos das transações devido
ao acréscimo de complexidade tecnológica não resulta na “internalização”
das transações na empresa, mas na “externalização”
das transações e em custos compartilhados por toda a rede, obviamente
aumentando as incertezas, mas também possibilitando sua difusão e
compartilhamento.
“Um motivo para que os investimentos em Tecnologia
da Informação não se tivessem transformado em maior produtividade é que eles
serviram principalmente para automatizar as tarefas existentes.” Bar e Borrus
Qualquer tentativa de cristalizar a posição
na rede como um código cultural em determinada época e espaço condena a rede à
obsolescência, visto que se torna muito rígida para a geometria variável
requerida pelo informacionalismo.
4 - A transformação do trabalho e do
mercado de trabalho: trabalhadores ativos na rede, desempregados e trabalhadores
com jornada flexível.
A economia norte-americana está projetada
para gerar mais de 26 milhões de empregos entre 1992 e 2005. (...) A produtividade mais alta que a média
continua a ser o segredo do crescimento econômico sustentado capaz de oferecer
empregos para todos os outros setores da economia.
A análise considerou a taxa de crescimento
ou queda das profissões e sua variação em números absolutos. A conclusão dos
autores do estudo é que “no geral, a maioria das profissões [em crescimento]
requeriam educação e treinamento além do ensino médio. De fato, mais de 2 em
cada 3 das 30 profissões com crescimento mais rápido e quase metade das 30 com
o maior numero de empregos adicionados tinha uma
maioria de trabalhadores com educação e treinamento além do ensino médio em
A evolução histórica do emprego, no âmago
da estrutura social, foi dominada pela tendência secular para o aumento da
produtividade do trabalho humano
Nossa observação empírica da evolução do
emprego nos países do G-7 revela alguns aspectos básicos que, de fato, parecem
ser característicos das sociedades informacionais:
·
eliminação
gradual do emprego rural
·
declínio
estável do emprego industrial tradicional
·
aumento
dos serviços relacionados à produção e dos serviços sociais com ênfase sobre os
serviços relacionados à produção na primeira categoria e sobre serviços de
saúde no segundo grupo;
·
crescente
diversificação das atividades do setor de serviços como fontes de emprego
·
rápida
elevação do emprego para administradores, profissionais especializados e
técnicos;
·
a
formação de um proletariado “de escritório”, composto de funcionários
administrativos e de vendas
·
relativa
estabilidade de uma parcela substancial do emprego no comercio varejista
·
crescimento
simultâneo dos níveis superior e inferior da estrutura ocupacional
·
a
valorização relativa da estrutura ocupacional ao longo do tempo, com uma
crescente participação das profissões que requerem qualificações mais
especializadas e nível avançado de instrução em proporção maior que o aumento
das categorias inferiores.
Quando um pais
concentra-se no modelo de “economia de serviços” significa que outros
países estão desempenhando seu papel como economias de produção industrial.
O enfoque da teoria deve deslocar-se para
um paradigma comparativo capaz de explicar, ao mesmo tempo, o compartilhamento
de tecnologia, a interdependência da economia e as variações da historia na
determinação de um mercado de trabalho que atravessa as fronteiras nacionais.
Embora o capital flua com liberdade nos
circuitos eletrônicos das redes financeiras globais, o trabalho ainda é muito
delimitado (e continuará assim no futuro previsível) por instituições, culturas, fronteiras, policia e xenofobia. Apenas cerca de 1,5% da forca de trabalho global (aproximadamente
80 milhões de pessoas) atuou fora de seu país em 1993 e metade dela
concentrava-se na África subsaariana e no Oriente
Médio.
Para toda a Europa Ocidental, a proporção
de estrangeiros no total da população em 1990 era de 4,5% e a França o Reino
Unido tinham uma proporção mais baixa em 1990 do que em 1982.
O que mudou em ambos os contextos é a
composição étnica da imigração, com uma proporção decrescente de imigrantes de
origem européia nos EUA e com alta proporção de imigrantes muçulmanos nos
países europeus.
Em conseqüência dessas duas
características, na década de
Na verdade para dois terços dos
trabalhadores do mundo, emprego ainda significa emprego rural nos campos,
geralmente, de suas regiões.
Mais importantes para os movimentos de
pessoas são os deslocamentos populacionais maciços em razão de guerras e fome.
O investimento estrangeiro direto tornou-se
a força motriz da globalização, mais significativo que o comércio como condutor
da interdependência internacional. (...) O numero de empresas multinacionais
aumentou de 7 mil em 1970 para 37 mil em 1993, com 150 mil coligadas em todo o
mundo. Embora elas empreguem diretamente “apenas” 70 milhões de trabalhadores,
essa mão-de-obra produz um terço do total da produção mundial.
Ficará cada vez mais difícil para as
empresas japonesas manterem as praticas de emprego vitalício para os
privilegiados 30% de sua forca de trabalho se tiverem de competir em uma
economia aberta com as empresas norte-americanas utilizando praticas flexíveis
de emprego.
Embora não haja um mercado de trabalho
global unificado e, consequentemente, não exista uma força de trabalho global,
há, na verdade, interdependência global da força de trabalho na economia
informacional. Essa interdependência caracteriza-se pela segmentação
hierárquica da mão-de-obra não entre países, mas entre as fronteiras.
(...) a automação, que só se completou com
o desenvolvimento da tecnologia da informação, aumenta enormemente a
importância dos recursos do cérebro humano no processo de trabalho.
O que tende a desaparecer com a automação
integral são as tarefas rotineiras, repetitivas que podem ser pre-codificadas e programadas para que máquinas as
executem. É a linha de montagem taylorista que se
torna uma relíquia histórica (embora ainda uma dura realidade para milhões de
trabalhadores do mundo em fase de industrialização).
O contexto social e, em particular, a
relação capital-trabalho, de acordo com decisões especificas da administração
das empresas, afetam de maneira drástica a forma real do processo de trabalho e
as conseqüências das mudanças
para os trabalhadores.
(...) o famoso estudo de Watanabe sobre o
impacto da introdução de robôs na indústria automobilística japonesa,
norte-americana, francesa e italiana revelou impactos bastante diferentes de
uma tecnologia similar no mesmo setor; nos EUA e na Itália, os trabalhadores
eram dispensados porque o principal objetivo da introdução da nova tecnologia
era reduzir custos de mão-de-obra; na França, a perda de emprego foi menor que
nos dois outros países, porque as políticas governamentais atenuaram os
impactos sociais da modernizarão; e no Japão, onde as empresas estavam
comprometidas com o emprego vitalício, os empregos, de fato, aumentaram e a
produtividade cresceu ainda mais em conseqüência de retreinamento
e maior esforço das equipes de trabalho, com isso elevando a competitividade
das empresas e tirando fatias de mercado de suas congêneres norte-americanas.
(...) as tecnologias foram introduzidas
mais para economizar mão-de-obra, submeter os sindicatos e reduzir custos do
que melhorar a qualidade ou aumentar a produtividade por meios que não sejam
redução do quadro funcional.
A multifuncionalidade
dos trabalhos e a individualização da responsabilidade sempre eram acompanhadas
por novos títulos criados ideologicamente (por exemplo, “assistente da
gerência” em vez de “secretario(a)”), dessa forma,
aumentando o potencial para o comprometimento dos funcionários administrativos
sem melhorar suas recompensas profissionais de forma correspondente.
Qualificações educacionais cada vez
maiores, gerais ou especializadas, exigidas nos cargos requalificados
da estrutura ocupacional segregam ainda mais a força de trabalho com base na
educação que, por si só, é um sistema altamente segregado, porque a grosso modo
corresponde institucionalmente a uma estrutura residencial segregada.
De acordo com o relatório oficial de 1994
da Comissão Européia sobre Crescimento, Competitividade e Empregos, entre 1970
e
(...) a variação institucional parece ser
responsável pelos níveis de desemprego, ao passo que os efeitos dos níveis
tecnológicos não seguem um padrão constante. Se os dados internacionais
indicassem qualquer padrão, seria na direção oposta às previsões luditas: nível tecnológico mais alto associado a taxa de desemprego mais baixa.
A conseqüência obvia dessa analise é que
nossas sociedades terão de escolher entre o desemprego maciço com seu
corolário, a profunda divisão da sociedade entre os trabalhadores empregados e
os desempregados/trabalhadores ocasionais ou, então, uma redefinição do
trabalho e do mercado de trabalho, abrindo caminho para a reestruturação
completa da organização social e dos valores culturais.
(..) Um estudo no Japão (...) concluir que
“em todos os casos, a introdução das novas tecnologias não visou a redução da força de trabalho na pratica nem causou sua
redução posterior”.
Nos EUA, a analise de 5 indústrias revelou
diferentes efeitos da inovação tecnológica: em mineração de ferro, mineração de
carvão e alumínio, a transformação tecnológica aumentou a produção e resultou em maiores níveis de emprego; nas indústrias
siderúrgicas e automobilísticas, por outro lado, o crescimento da demanda não
correspondeu à redução do trabalho por unidade de produção e provocou perdas de
emprego.
No caso do Brasil, Silva não descobriu
nenhum efeito da tecnologia sobre o emprego na indústria automobilística,
embora o nível de emprego variasse consideravelmente em função dos níveis de
produção.
(...) Apenas nas circunstancias mais
favoráveis a transformação tecnológica aumenta os
empregos mediante a melhora da competitividade. Na verdade, os autores concluem
que as perdas de emprego são iminentes a menos que ocorram efeitos de demanda
compensatória, e essa demanda não poderá ser gerada apenas por um desempenho
melhor no comércio internacional.
A questão crucial é a mistura certa da
inovação em processos com a inovação
Em resumo, parece que, como tendência geral,
não há relação estrutural sistemática entre a difusão das tecnologias da
informação e a evolução dos níveis de emprego na econômica com um todo.
Empregos estão sendo extintos e novos empregos estão sendo criados, mas a
relação quantitativa entre as perdas e os ganhos varia entre empresas,
indústrias, setores, regiões e países em função da competitividade, estratégias
empresariais, políticas governamentais, ambientes institucionais e posição
relativa na economia global.
“A nova vida profissional de Linda não
deixa de apresentar inconvenientes. O maior deles é uma ansiedade constante
pela procura do próximo emprego. Em certos aspectos, Linda sente-se sozinha e
vulnerável. Temerosa do estigma de ter sido demitida, por exemplo, ela não quer
que seu nome apareça neste artigo. Mas a liberdade de ser chefe de si mesma
compensa a insegurança. Linda consegue fazer seus horários em função de seu
filho. Consegue escolher seus trabalhos. E é pioneira da nova força de
trabalho.” Newsweek, 14 de junho de 1993
As categorias de trabalho que mais crescem
são as o trabalho temporário e o trabalho de meio-expediente.
No geral, a forma tradicional de trabalho
com base em emprego de horário integral, projetos profissionais bem-delineados
e um padrão de carreira ao longo da vida estão sendo extintos de forma lenta,
mas indiscutível.
O modelo predominante de trabalho na nova
economia baseada na informação é o modelo de uma força de trabalho permanente
formada por administradores que atuam com base na informação e por aqueles a
quem Reich chama de “analistas simbólicos” e uma força de trabalho disponível
que pode ser automatizada e/ou contratada/demitida/enviada para o exterior,
dependendo da demanda do mercado e dos custos do trabalho.
O processo de transição histórica para uma
sociedade informacional e uma economia global é caracterizado
pela deterioração generalizada das condições de trabalho e de vida para os
trabalhadores.
Embora a estrutura ocupacional do emprego
tenha atingido melhor nível em termos de conteúdo educacional dos conhecimentos
necessários para os empregos informacionais, a força
de trabalho não está à altura das novas tarefas, seja devido à baixa qualidade
do sistema de ensino, seja por causa da inadequação desse
sistema no fornecimento das novas qualificados exigidas pela estrutura
ocupacional emergente.
A conseqüência direta da reestruturação
econômica nos EUA é que nas décadas de 80 e
Na Grande Londres, entre 79 e
As sociedades estão ficando aparentemente
dualizadas, com uma grande camada superior e também uma grande camada inferior,
crescendo em ambas as extremidades da estrutura ocupacional, portanto
encolhendo no meio, em ritmo e proporção que dependem da posição de cada pais
na divisão do trabalho e de seu clima político. Mas, lá
no fundo da estrutura social incipiente, o trabalho informacional desencadeou
um processo mais fundamental: a desagregação do trabalho, introduzindo a
sociedade em rede.
5 - A cultura da virtualidade real: a
integração da comunicação eletrônica, o fim da audiência de massa e o
surgimento de redes interativas - 353
Por volta do ano 700 antes de Cristo
ocorreu um importante invento na Grécia: o alfabeto.
Uma transformação tecnológica de dimensões
históricas similares está ocorrendo 2.700 anos depois, ou seja, a integração de
vários modos de comunicação em uma rede interativa.
(...)”A principal
descoberta das pesquisas (...) é simplesmente que as pessoas são atraídas para
o caminho de menor resistência”. (porque) existem custos psicológicos de
obtenção e de processamento de informação.
Por exemplo, de acordo com estudos sobre a
mídia, apenas uma pequena proporção de pessoas escolhe antecipadamente o
programa a que assistirá. Em geral, a primeira decisão é assistir à televisão,
depois os programas são examinados até que se escolha o mais atrativo ou, com
mais freqüência, o menos maçante.
(...) a televisão é um meio fundamentalmente
novo caracterizado pela sua sedução, estimulação sensorial da realidade e fácil
comunicabilidade na linha do modelo do menor esforço psicológico.
No pais
mais voltado para a TV, os EUA, no final dos anos 80 ela apresentou 3.600
imagens por minuto, por canal. De acordo com o Nielsen
Report, a casa americana média mantinha o aparelho de
TV ligado cerca de sete horas por dia, e o tempo de assistência real foi
estimado em 4,5 horas diárias por adulto. (...) Segundo alguns estudos, as
famílias norte-americanas com TV a cabo assistem a mais TV em rede do que as
sem TV a cabo.
As descobertas acumuladas em
cinco décadas de pesquisa sistemática de ciências sociais revelam que a
audiência da mídia de massa, seja ou não constituída de jovens, não está
desamparada, e a mídia não é todo-poderosa. A teoria em
evolução sobre os efeitos modestos e condicionais da mídia ajuda a relativizar o ciclo histórico do pânico moral a respeito do
novo meio de comunicação.
Segundo Draper,
embora nos EUA o cidadão comum esteja exposto a 1.600 mensagens publicitarias por dia, as pessoas respondem (e não
necessariamente de forma positiva) a apenas cerca de 12
delas. Na verdade, McGuire, após rever as informações
acumuladas sobre os efeitos da propaganda na mídia, concluiu que não há prova solida de impactos específicos dos anúncios sobre o
comportamento real, conclusão irônica para um setor que gastou naquela época
US$ 50 bilhões por ano. Então, por que a são empresas continuam insistindo em
fazer publicidade? Pelo seguinte motivo: elas repassam o custo da propaganda
para os consumidores. De acordo com a revista The Economist, em
“Existe, dependendo das circunstancias
socioculturais, uma variedade de códigos, ou melhor, de regras de competência e
interpretação. A mensagem tem uma forma significante que pode ser completada
com diferentes significados... Assim,, havia margem para a suposição de que o
emissor organizava a imagem televisual com base nos próprios códigos, que
coincidiam com aqueles da ideologia dominante, enquanto os destinatários a
completavam com significados “aberrantes” de acordo com seus códigos culturais
específicos.” Humberto Eco.
(...) “não existe uma
Cultura de Massa no sentido imaginado pelos críticos apocalípticos das
comunicações de massa, porque esse modelo compete com os outros (constituídos
por vestígios históricos, cultura de classe, aspectos da alta cultura
transmitidos pela educação etc.) [experiência própria, nível de reflexão
individual....]
Constitui uma das ironias da historia
intelectual o fato de serem precisamente aqueles pensadores que defendem a
mudança social os que, com freqüência, vêem as pessoas como receptáculos
passivos de manipulação ideológica, na verdade inibindo as idéias de movimentos
e mudanças sociais, exceto sob o modo de eventos excepcionais singulares
gerados fora do sistema social. (...) Na
verdade, alguns experimentos de psicologia descobriram que, mesmo se a TV
apresentar 3.600 imagens por minuto, por canal, o cérebro respondera de forma
consciente a apenas um estimulo sensorial entre cada milhão de estímulos
enviados.
O poder real da televisão, como Eco e Postman já afirmaram, é que ela arma o palco para todos os
processos que se pretendem comunicar à sociedade em geral, de política a
negócios, inclusive esportes e arte.
A televisão modela a linguagem de
comunicação societal. Se os anunciantes continuam
gastando bilhões apesar das duvidas razoáveis sobre o real impacto direto da
publicidade sobre as vendas, talvez seja porque uma ausência da televisão
normalmente signifique admitir o reconhecimento dos nomes dos concorrentes com
propaganda no mercado de massa. Embora os efeitos da televisão sobre as opções
políticas sejam bastante diversos, a política e os políticos ausentes da
televisão nas sociedades desenvolvidas simplesmente não têm chance de obter
apoio popular, visto que as mentes das pessoas são informadas fundamentalmente
pelos meios de comunicação, sendo a televisão o principal deles. O impacto social da televisão funciona no modo binário: estar
ou não estar.
Segundo a UNESCO, em 1992 havia mais de 1
bilhão de aparelhos de TV no mundo (35% dos quais estavam na Europa, 32% na
Ásia, 29% na América do Norte, 8% na América Latina, 4% no Oriente Médio e 1%
na África).
Devido à diversidade da mídia e à
possibilidade de visar o público-alvo, podemos afirmar que no novo sistema de
mídia, a mensagem é o meio. Ou seja, as características da mensagem moldarão as
características do meio. Por exemplo, se a manutenção de um ambiente musical de
adolescente for a mensagem (uma mensagem muito
explicita), a MTV será programada sob medida para os ritos e linguagem dessa
audiência não apenas no conteúdo, mas em toda a organização da estação, bem
como na tecnologia e no projeto de produção/transmissão de imagens.
(...) embora a audiência tenha sido
segmentada e diversificada, a televisão tornou-se mais comercializada do que
nunca e cada vez mais oligopolista no âmbito global. (...) Embora os meios de
comunicação realmente tenham se interconectado em todo o globo, e os programas
e mensagens circulem na rede global, não estamos vivendo em uma aldeia global,
mas em domicílios sob medida, globalmente produzidos e localmente distribuídos.
Com certa freqüência os intercâmbios
on-line baseavam-se na representação de idades, sexos e características
físicas, de modo que o Minitel se tornou mais o
veiculo dos sonhos sexuais e pessoais do que o substituto dos bares de
encontros amorosos. Essa fascinação pelo uso intimo do
Minitel foi decisiva para assegurar sua rápida
difusão entre o povo francês, apesar dos protestos solenes de puritanos
pudicos. No inicio dos anos 90, as utilizações eróticas do Minitel
foram diminuído à medida que a moda foi passando, e o caráter rudimentar da
tecnologia foi limitando seu apelo sexual: as linhas de bate-papo acabaram por
representar menos de 10% do trafego.
O único modo de controlar a rede é não
fazer parte dela, e esse é um preço alto a ser pago por qualquer instituição ou
organização, já que a rede se torna abrangente e leva todos os tipos de
informação para o mundo inteiro.
(...) minha hipótese é que , devagar mas
com toda certeza, as praticas comerciais com cartão de crédito e números de contas bancarias desenvolverão redes separadas,
enquanto a internet se expandirá como uma ágora
eletrônica global, com sua inevitável dose de desvios psicológicos.
Mas à medida que os exageros das primeiras
tribos de informática recuam sob o fluxo implacável das novatas, o que
permanece das origens contraculturais da rede é a
informalidade e a capacidade auto-reguladora de comunicação, a idéia de que
muitos contribuem para muitos, mas cada um tem a própria voz e espera uma
resposta individualizada. A multipersonalizacao da
CMC (comunicação global medida por computadores) expressa, em certa medida, a
mesma tensão surgida nos anos 60 entre a “cultura do eu” e os sonhos comunais
de cada indivíduo.
Apesar de todos os esforços para regular,
privatizar e comercializar a internet e seus sistemas tributários, as redes de
CMC dentro e fora da internet, têm como características: penetrabilidade, descentralização
multifacetada e flexibilidade.
(...) o índice de difusão da CMC interativa
dificilmente alcançará o da televisão por um longo período da historia.
Passando da analise de usuários para a de
usos, deve-se enfatizar que a esmagadora proporção de atividade de CMC ocorre
no trabalho ou em situações a ele relacionadas. Será que a relação com o
computador é suficientemente especifica para ligar trabalho, casa e diverso no
mesmo sistema de processamento de símbolos? Ou, ao contrario, o contexto
determina a percepção e os empregos do meio? Não temos pesquisa confiável sobre
o assunto até o momento, mas algumas observações preliminares feitas por Penny Gurstein em sua tese de
doutorado parecem indicar que, embora desfrutem de autoconfiança no
gerenciamento temporal e espacial, os usuários de
computadores em casa ressentem-se da falta de separação distinta entre trabalho
e lazer, família e negócios, personalidade e função. Digamos, como
hipótese a se ter em mente, que a convergência de experiência no mesmo meio, de
certa forma atrapalha a separação institucional de domínios de atividade e
confunde códigos de comportamento.
A política também é uma crescente área de
utilização da CMC. Por um lado, o correio eletrônico está sendo usado para a
difusão massificada de propaganda política dirigida com possibilidade de
interação. Grupos fundamentalistas cristãos, a Milicia
Norte-americana nos EUA e os zapatistas no México são os pioneiros dessa
tecnologia política.
O que há de especifico na linguagem da CMC
como um novo meio de comunicação? (...) uma nova forma de “oralidade” expressa
por um texto eletrônico. (...) (um
telefone que escreve).
Assim, as comunidades do norte da
Califórnia por ele estudadas adotaram o telefone para melhorar as redes sociais
de comunicação existentes e reforçar seus hábitos sociais profundamente
enraizados. O telefone foi adaptado, não apenas adotado. As pessoas moldam a
tecnologia para adaptá-la a suas necessidades, (...) como foi claramente
demonstrado pela adoção em massa do Minitel pelo povo
francês, em atendimento a suas necessidades de fantasias sexuais. (...) O denominador comum da CMC é que, de acordo com os poucos
estudos existentes sobre o assunto, ela não substitui outros meios de
comunicação e nem cria novas redes: reforça os padrões sociais preexistentes.
Como o acesso à CMC é cultural, educacional
e economicamente restritivo, e continuará assim por muito tempo, seu impacto
cultural mais importante poderia ser o reforço potencial das redes sociais
culturalmente dominantes, bem como o aumento de seu cosmopolitismo e
globalização. (...) Portanto, a CMC pode ser um meio poderoso para reforçar a
coesão social da elite cosmopolita, fornecendo um apoio importante ao
significado de uma cultura global, que vai da elegância de um endereço de
correio eletrônico à circulação rápida das mensagens em moda.
Estou simplesmente indicando que sua utilização real nos primeiros estágios do novo sistema darão
forma de maneira considerável aos usos, percepções e, em ultima analise, às
conseqüências sociais da multimídia.
Há indicações de que nos EUA o tempo de
lazer diminuiu 36% entre 1973 e 1994. Além disso, o tempo dedicado à mídia
diminuiu na segunda metade dos anos 80: entre 1985 e 1990 o
tempo total gasto com leitura e com TV e filmes baixou 45 horas por ano;
as horas gastas assistindo a programas de TV diminuíram 4%; e as horas
dedicadas à TV em rede baixaram 20%.
(...) a mensagem está evoluindo menos que o
meio.
Criadores arrojados como Steven Spielberg, parecem ter entendido que no novo
sistema, em ração da diversidade potencial de conteúdos, a mensagem é a
mensagem: é a capacidade de diferenciar um produto que gera o maior potencial
competitivo.
Uma das pesquisas mais completas sobre a
demanda de multimídia, realizada por Charles Piller
em amostra nacional de seiscentos adultos nos EUA, revelou interesse muito mais
profundo pelo uso da multimídia para acesso à informação, questões comunitárias,
envolvimento político e educação que para mais opções de programações
televisivas e filmes. (...) Os participantes estavam pontos a confirmar suas
opiniões com suas carteiras: 34% estavam dispostos a pagar mais US$ 10 por mês
por ensino à distancia, enquanto apenas 19% se
dispunham a pagar essa quantia por mais uma opção de entretenimento.
Por exemplo, fornos de microondas, que
permitem o consumo individual de comida pre-cozida,
reduziram a incidência de jantares familiares coletivos. Os aparelhos
individuais de jantar para refeições diante da TV representam um mercado em
crescimento. (...) No entanto, algumas características sociais parecem perdurar
além da revolução tecnológica: a divisão de tarefas
domesticas entre os sexos (ou, ao contrario, falta dela) não é afetada
pelos meios eletrônicos; o uso de videocassete e o manuseio de dispositivos
eletrônicos é diferenciada no que diz respeito a sexo e idade: homens usam
computadores com mais freqüência, mulheres cuidam dos serviços telemáticos e de manutenção elétrica domestica e crianças
são obcecadas por videogame.
Novos aparelhos (...) aumentar as chances
de membros individuais da família organizarem o
próprio tempo e espaço. Por exemplo, fornos de microondas que permitem o
consumo individual de comida pré-cozida, reduziram a incidência de jantares
familiares coletivos.
Algumas características sociais parecem
perdurar além da revolução tecnológica: a divisão de tarefas
domesticas entre os sexos (ou, ao contrario, falta dela) não é afetada
pelos meios eletrônicos; o uso de videocassete e o manuseio de dispositivos de
controle remoto refletem uma estrutura familiar autoritária; e a utilização de
dispositivos eletrônicos é diferenciada no que diz respeito a sexo e idade:
homens usam computadores com mais freqüência, mulheres cuidam dos serviços
telepáticos e de manutenção elétrica domestica e crianças são obcecadas por
videogames.
(sobre o Karaokê) A concorrência com os
amigos para atingir o maior numero de pontos depende da recompensa oferecida
pela máquina àquele que seguir o ritmo da melhor forma. A máquina de karaokê
não é um instrumento musical: o cantor é engolido pela máquina para completar
seus sons e imagens.
As mensagens (...) são cada vez mais
diversificadas pelos usuários da mídia de acordo com seus interesses, por
intermédio da exploração das vantagens das capacidades interativas. Como dizem
alguns especialistas, no novos sistema “horário nobre
é o meu horário”. A formação de comunidades virtuais é apenas uma das
expressões dessa diferenciação.
Não apenas a opção da multimídia ficará
restrita àqueles com tempo e dinheiro para o acesso e aos países e regiões com
o necessário mercado potencial, mas também as diferenças culturais/educacionais
serão decisivas no uso da interação para o proveito de cada usuário. (...)
Assim, o mundo da multimídia será habitado por duas populações essencialmente
distintas: a interagente e a receptora da interação,
ou seja, aqueles capazes de selecionar seus circuitos multidirecionais de comunicação e os que recebem um numero
restrito de opções pré-empacotadas. E que é o quê será amplamente determinado
pela classe, raça, sexo e país. O poder unificados cultural
da televisão direcionada às massas (...) agora é
substituído por uma diferenciação socialmente estratificada, levando à
coexistência de uma cultura da mídia de massa personalizada com uma rede de
comunicação eletrônica interativa de comunidades auto-selecionadas.
A comunicação de todos os tipos de
mensagens no mesmo sistema, ainda que este seja interativo e seletivo (sem
dúvida, exatamente por isso) induz a uma integração de todas as mensagens em um
padrão cognitivo comum.
Talvez a característica mais importante da
multimídia seja que ela capta em seu domínio a maioria das expressões culturais
em toda a sua diversidade.
Culturas são formadas por processos de
comunicação. E todas as formas de comunicação, como Rolan
Barthes e Jean Baudrillard nos ensinaram há muitos anos, são baseadas
na produção e consumo de sinais. Portanto, não há separação entre “realidade” e
representação simbólica. Em todas as sociedades, a humanidade tem existido em
um ambiente simbólico e atuado por meio dele.
Portanto, o que é historicamente específico
ao novo sistema de comunicação organizado pela integração eletrônica de todos
os modos de comunicação, do tipográfico ao sensorial, não é a indução à
realidade virtual, mas a construção da virtualidade real. Explicarei com a
ajuda do dicionário, segundo o qual: “virtual: que existe na pratica, embora
não estrita ou nominalmente, e “real”: que existe de fato”. Portanto a
realidade, como é vivida, sempre foi virtual porque sempre é percebida por
intermédio de símbolos formadores da pratica com algum sentido que escapa à sua
rigorosa definição semântica. (...) De certo modo toda realidade é percebida de modo virtual.
O que é um sistema de comunicação que, ao
contrário da experiência historia anterior, gera virtualidade real? É um
sistema em que a própria realidade (ou seja, a experiência simbólica/material
das pessoas) é inteiramente captada, totalmente imersa em uma composição de
imagens virtuais no mundo do faz-de-conta, no qual as aparências não apenas se
encontram na tela comunicadora da experiência, mas se transformam na
experiência.
Case:
Na campanha presidencial norte-americana de
1992, o então vice-presidente Dan Quayle
queria posicionar-se em defesa dos valores da família tradicional. Armado de
suas convicções morais, iniciou um debate incomum com Murphy
Brown. Murphy Brown, representada por uma ótima
atriz, Candice Bergen, era
a personagem principal de uma série popular de TV que (a)(re)presentava os valores e
problemas de um novo tipo de mulher: a profissional solteira com os próprios
critérios sobre a vida. Nas semanas da campanha presidencial Murphy Brown (não Candice Bergen) decidiu ter um filho fora do casamento. O
vice-presidente Quayle apressou-se a condenar seu
comportamento como impróprio, provocando revolta nacional principalmente entre
as mulheres trabalhadoras. Murphy Brown (não apenas Candice Bergen) retaliou: no
episódio seguinte apareceu assistindo à entrevista de televisão em que o
vice-presidente Quayle a criticava e reagiu com
criticas acirradas à interferência de políticos na vida das mulheres e com a
defesa de seu direito a uma nova moralidade. Com isso Murphy
Brown aumentou sua fatia de audiência, e o conservadorismo desatualizado de Dan Quayle contribuiu para a
derrota eleitoral do presidente Bush; os dois acontecimentos foram reais e, em
certa medida, socialmente relevantes. No entanto, um novo texto do real e do
imaginário fora composto ao longo do diálogo. A presença não-solicitada do
mundo imaginário de Murphy Brown na campanha
presidencial real causou a transformação de Quayle
(ou melhor, de sua imagem televisiva “real”) em uma personagem da vida
imaginaria de Murphy Brown: fora feito um supertexto, misturando no mesmo discurso mensagens
veementemente defendidas, emitidas a partir dos dois níveis de experiência.
Nesse caso, a virtualidade (isto é, Murphy Brown
sendo na prática o que eram muitas mulheres, sem sê-lo no nome de nenhuma
mulher) tornara-se real, no sentido de que realmente interagiu - causando
impacto de certa importância - com o processo de eleição para o cargo político
mais poderoso da terra. Concordo, o exemplo é extremo e incomum, mas acredito
que ilustra minha analise e ajuda a reduzir a obscuridade de sua abstração.
Por isso é tão importante para os
diferentes tipos de efeitos sociais que haja o desenvolvimento de uma rede
comunicação horizontal multinodal do tipo da
internet, em vez de um sistema multimídia centralmente distribuído como na
configuração do vídeo sob demanda.
A inclusão da maioria das expressões
culturais no sistema de comunicação integrado baseado na produção, distribuição
e intercâmbio de sinais eletrônicos digitalizados tem conseqüências importantes
para as formas e processos sociais. Por um lado, enfraquece de maneira
considerável o poder simbólico dos emissores tradicionais fora do sistema,
transmitindo por meio de hábitos sociais historicamente codificados: religião,
moralidade, autoridade, valores tradicionais, ideologia política. Não que
desapareçam, mas são enfraquecidos a menos que se recodifiquem no novo sistema,
onde seu poder fica multiplicado pela materialização eletrônica dos hábitos
transmitidos espiritualmente: as redes de pregadores eletrônicos e as redes
fundamentalistas interativas representam uma forma mais eficiente e penetrante
de doutrinação em nossas sociedades do que a transmissão pelo contato direto da
distante autoridade carismática.
O tempo é apagado no novo sistema de
comunicação já que passado, presente e futuro podem ser programados para
interage entre si na mesma mensagem. O espaço de fluxos
e o tempo intemporal as
bases principais de uma nova cultura, que transcende e inclui a diversidade dos
sistemas de representação historicamente transmitidos: a cultura da
virtualidade real, onde o faz-de-conta vai se tornando realidade.
6 - O espaço de fluxos - 403
O primeiro sistema de comunicação mediada
por computadores difundido para a massa, o Minitel francês, originou-se na década de 80 em um ambiente
urbano intenso, cuja vitalidade e interação por contato pessoal não foram
abaladas pelo novo meio de comunicação. Na verdade, os estudantes franceses
usavam o Minitel para organizar manifestações de rua
contra o governo. No início da década de
A globalização estimula a regionalização.
No início dos anos 90, enquanto de um lado,
cidades como Bangkok, Taipei, Xangai, México ou Bogotá
desfrutavam um crescimento urbano explosivo fomentado pelos negócios, de outro,
Madri, Nova York, Londres e paris experimentavam uma queda que causou profunda
diminuição nos preços de imóveis e paralisou novas construções. Esta
montanha-russa urbana, em diferentes períodos nas diversas áreas do mundo,
ilustra a dependência e a vulnerabilidade de qualquer local, inclusive das
principais cidades, em relação aos fluxos globais em transformação.
(...) uma vez realizados, grandes
investimentos empresariais em imóveis valiosos explicam a relutância em
mudar-se, porque tal iniciativa desvalorizaria seus ativos fixos;
[hoje] o que importa é a versatilidade das
redes.
(...) os meios de inovação comandam as
redes globais de produção e distribuição, que estendem seu alcance por todo o
planeta. Por isso, alguns pesquisadores, como Amin e Robins,
afirmam que o novo sistema industrial não é global nem local, mas “uma nova articulação da dinâmica local e global”.
O desenvolvimento da comunicação eletrônica
e dos sistemas de informação propicia uma crescente dissociação entre a
proximidade espacial e o desempenho das funções rotineiras: trabalho, compras,
entretenimento, assistência à saúde, educação, serviços públicos., governo e
assim por diante.
“Há mais pessoas fazendo pesquisas sobre teletrabalho do que teletrabalhadores
reais”.
O tempo de deslocamento em razão do
trabalho mantém-se constante nas áreas metropolitanas dos EUA, não devido à
melhora da tecnologia, mas por causa de um modelo mais descentralizado de
localização de empregos e residências que permite fluxos de trafego mais fácil
entre os subúrbios.
As telecompras
também não estão se desenvolvendo à altura das
expectativas. Embora em crescimento na maioria dos
países, na verdade estão substituindo os tradicionais pedidos por catálogos via
correio e não a compra direta em shopping centers e ruas comerciais.
As pessoas deslocar-se-ão entre todos os
lugares com mobilidade crescente, exatamente devido à flexibilidade recém-conquistada pelos sistemas de trabalho e integração
social em redes: como o tempo fica mais flexível, os lugares tornam-se mais
singulares à medida que as pessoas circulam entre eles em um padrão cada vez
mais móvel.
As tendências atuais apontam na direção de
outra megacidade asiática em escala ainda maior
quando, no início do século XXI, o corredor toquio-yokohama-nagoya (já uma unidade funcional) estiver unido a osaka-kobe-kyoto, criando a maior aglomeração metropolitana
da historia humana não apenas em termos de população, mas também em poder
econômico e tecnológico.
O futuro da humanidade e do
pais de cada megacidade depende
fundamentalmente da evolução e gerenciamento dessas áreas. As megacidades são os pontos nodais e o são centros de poder
da nova forma/processo espacial da era da informação: o espaço de fluxos.
As pessoas ainda vivem
7 - O limiar do eterno: o tempo intemporal
O que chamo de tempo intemporal é apenas a
forma dominante emergente do tempo social na sociedade em rede porque o espaço
de fluxos não anula a existência de lugares. Afirmo que a dominação social é
exercida por meio da inclusão seletiva e da exclusão de funções e pessoas em
diferentes estruturas temporais e espaciais.
A explicação do volume fenomenal de fluxos
financeiros transnacionais está na velocidade das transações.
A principal sala de carteado desse cassino
eletrônico o é o mercado monetário, que explodiu na ultima década, tirando
vantagem das taxas de cambio flutuantes. Em 1995, US$ 1m2 trilhões foram
movimentados todos os dias no mercado monetário.
(...) É a velocidade da transação que gera
o ganho - ou a perda.
A taxa de atividade de homens entre 55 e 65
baixou com rapidez nos últimos 20 anos, nas principais economias
industrializadas e, em 1991, havia caído para 65% nos EUA, 64% no Reino Unido,
54% na Alemanha e 3% na França. (...) Nessas circunstâncias, o tempo real de
serviço poderia ser diminuído para cerca de 30 anos (dos 24 aos 54), para uma
duração real de vida de aproximadamente 75-80 anos.
A menos que se modifique a base de calculo
dos benefícios sociais mediante um novo contrato social, a diminuição do tempo
de serviço válido e a acelerada obsolescência da mão-de-obra decretarão o fim
das instituições de solidariedade social e a introdução das guerras etárias.
A morte é e foi o tema central da culturas ao longo da história, seja reverenciada como a
vontade de Deus, seja afrontada como o ultimo desafio humano. Tem sido
exorcizada nos ritos para acalmar os vivos, aceita com a resignação dos
serenos, suavizada nas comemorações dos simples, combatida com o desespero dos
românticos, mas nunca contestada. É uma característica distintiva de nossa nova
cultura, a tentativa de banir a morte de nossa vida. Embora a matriz dessa
tentativa advenha da crença racionalista no progresso todo poderoso, são as
descobertas extraordinárias da tecnologia medica e da pesquisa biológica nas
duas ultimas décadas que fornecem base material para a mais antiga aspiração da
humanidade: viver como se a morte não existisse, apesar de ser nossa única
certeza.
A morte é apenas uma mudança temporária na
tela de espectadores distraídos. Se for verdade que, como disse Ionesco, “cada um de nós é o primeiro a morrer”, os mecanismos
sociais asseguram que também somos os últimos, ou seja, que os mortos estão
verdadeiramente sozinhos e não leva a energia dos vivos. (...) Como estamos tão perto de desvendar os segredos da vida, duas
grandes tendências difundiram-se das ciências medicas para o resto da
sociedade: a prevenção obsessiva e a luta até o fim.
Esse impulso medico
de repelir a morte nada tem a ver com o capitalismo. De fato, algumas
seguradoras acolheriam a eutanásia de bom grado e gostariam de enviar os
pacientes para casa o mais breve possível, uma visão céptica combatida
diariamente pelos médicos.
“As raízes da guerra estão na natureza
humana.”
A mortalidade infantil no Uruguai e na
ex-URSS é mais alta que o dobro da média norte-americana, mas é igual à de
Washington. Embora a morte e as doenças estejam sendo afastadas em todo o
mundo, em 1990 esperava-se que os habitantes dos países menos desenvolvidos
vivessem 25 anos menos que os das áreas mais desenvolvidas.
O tempo intemporal pertence ao espaço de
fluxos, ao passo que a disciplina tempo, o tempo biológico e a seqüência
socialmente determinada caracterizam os lugares em todo o mundo, estruturando e
desestruturando materialmente nossas sociedades segmentadas.
Conclusão - a sociedade em rede - 497
Como tendência histórica, as funções e os
processos dominantes na era da informação estão cada vez mais organizados em
torno de redes. (...) A presença na rede ou a ausência dela e a dinâmica de
cada rede em relação às outras são fontes cruciais de dominação e transformação
de nossa sociedade: uma sociedade que, portanto, podemos apropriadamente chamar
de sociedade em rede, caracterizada pela primazia da morfologia social sobre a
ação social.
Rede é um conjunto de nós interconectados.
A topologia definida por redes determina
que a distancia (ou intensidade e freqüência da interação) enter
dois pontos (ou posições sociais) é menor (ou mais freqüente, ou mais intensa),
se ambos os pontos forem nós de uma rede do que se não pertencerem à mesma
rede. Por sua vez, dentro de determinada rede os fluxos não têm nenhuma
distancia, ou a mesma distancia, entre nós. Portanto, a distancia (física,
social, econômica, política, cultural) para um determinado ponto ou posição
varia entre zero (para qualquer não[ó da mesma rede) e
infinito (para qualquer ponto externo à rede). A inclusão/exclusão em redes e a
arquitetura das relações entre redes, possibilitadas por tecnologias da
informação que operam à velocidade da luz, configuram os processos e funções
predominantes em nossas sociedades.
Redes são estruturas abertas capazes de
expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam
comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmo códigos
de comunicação (por exemplo, valores ou objetivos de desempenho).
O processo de trabalho é cada vez mais
individualizado, e a mão-de-obra está desagregada no desempenho e reintegrada
no resultado através de uma multiplicidade de tarefas interconectadas em
diferentes locais, introduzindo uma nova divisão de trabalho mais baseada nos
atributos/capacidades de cada trabalhador que na organização da tarefa.
Nesse cassino global
eletrônico capitais específicos elevam-se ou diminuem drasticamente,
definindo o destino de empresas, poupanças familiares, moedas nacionais e
economias regionais . O resultado na rede é zero: os perdedores pagam pelos ganhadores. Mas os ganhadores
e os perdedores vão mudando a cada ano, a cada mês, a cada dia, a cada segundo
e permeiam o mundo das empresas, empregos, salários, impostos e serviços
públicos.
Há no entanto, uma rede integrada de
capital global, cujos movimentos e lógica variável determinam as economias e
influenciam as sociedades. Dessa fora, acima de vários capitalistas de carne e
osso e grupos capitalistas, há uma entidade capitalista coletiva sem rosto,
formada por fluxos financeiros operados por redes eletrônicas. Não é apenas
expressão da lógica abstrata do mercado porque, na realidade, não segue a lei
da oferta e da procura: responde às turbulências e aos movimentos imprevisíveis
de expectativas não-calculáveis induzidas pela psicologia e a sociedade na
mesma media que pelos processos econômicos.
Na essência, o capital é global, Via de
regra, o trabalho é local. O informacionalismo, em
sua realidade histórica, leva à concentração e globalização do capital
exatamente pelo emprego do poder descentralizador das redes. A mão-de-obra está
desagregada em seu desempenho, fragmentada em sua organização, diversificada em
sua existência, dividida em sua ação coletiva.
Não quer dizer que a história terminou em
uma feliz reconciliação da Humanidade consigo mesma. Na verdade, é o oposto: a
história está apenas começando, se por história entendermos o momento em que,
após milênios de uma batalha pré-histórica com a Natureza, primeiro para
sobreviver, depois para conquistá-la, nossa espécie tenha alcançado o nível de
conhecimento e organização social que nos permitirá viver em um mundo
predominantemente social. É o começo de uma nova
existência e, sem dúvida, o início de uma nova era, a era da informação,
marcada pela autonomia da cultura vis-à-vis as bases materiais de nossa
existência. Mas este não é necessariamente um momento animador porque,
finalmente sozinhos em nosso mundo de humanos, teremos de olhar-nos no espelho
da realidade histórica. E talvez não gostemos da imagem refletida.
Continua.