EXTRATO
DE: APRENDER A VIVER
Autor: Luc Ferry
Editora Objetiva – 2006
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Aprender a viver, aprender anão mais temer em vão as diferentes faces da morte, ou, simplesmente, a superar a banalidade da vida cotidiana, o tédio, o temo que passa, já era o principal objetivo das escolas da Antiguidade grega.
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Mas de q catástrofe, de que perigo medonho as religiões pretendem nos fazer escapar? Você já sabe a resposta: é da morte, sem duvida, que se trata. Eis por que todas elas vão se esforçar, de diferentes formas, para nos prometer a vida eterna, para nos garantir que um dia reencontraremos aqueles que amamos (...)
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Mas, para aqueles que não estão convencidos, para aqueles que duvidam da veracidade dessas promessas, o problema, e claro, permanece.
Alguns sábios da Antiguidade diziam que não se deve pensar na morte, pois, das duas, uma: ou estou vivo, e a morte, por definição, não está presente, ou então ela está presente, e, também por definição, eu não estou presente para me afligir!
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Se as religiões se definem como “doutrinas da salvação” por um Outro, pela gbraça de Deus, as grandes filosofias poderiam ser definidas como doutrinas da salvação por si mesmo, sem a ajuda de Deus.
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“Filosofar é aprender a morrer”, dizia Montaigne.
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O passado não existe mais, e o futuro ainda não existe.
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Se a religião acalma as angústias, fazendo da morte uma ilusão, corre o risco de fazeê-lo ao preço da liberdade de pensamento. Por que, de certa forma, ela sempre exige em troca da serenidade que pretende oferecer que, num momento ou noutro, a razão seja abandonada para dar lugar à fé, que se ponha termo ao espírito crítico para que se aceite acreditar.
Filosofar, mais que acreditar, é, no fundo, preferir a lucidez ao conforto, a liberdade à fé.
As três dimensões da filosofia: a inteligência do que é (teoria), a sede de justiça (ética) e a busca da salvação (sabedoria).
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A maioria dos historiadores concorda em dizer que a filosofia nasceu na Grécia, por volta do século VI a.C.
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O pai fundador da escola estóica, Zenão de Cítio (que nasceu por volta de 334 e morreu por volta de
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Diz Cícero, em nome do pensamento estóico: Que Epicuro caçoe tanto quanto quiser [...] não deixa de ser verdade que nada é mais prefeito que o mundo... O mundo é um ser animado, dotado de consciência, inteligência e razão.
É a idéia segundo a qual o mundo possui uma espécie de alma, que é como um ser vivo, que mais tarde se chamará de “animismo” (da palavra latina anima, que quer dizer “alma”).
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Do ponto de vista da theoria estóica, o cosmos é, pois, com exceção de alguns episódios acidentais e provisórios que são as catástrofes, essencialmente harmonioso (...).
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Diz-se que uma coisa é imanente ao mundo, quando se situa em relação apenas a ele. Do contrário, diz-se que ela é transcendente. O divino dos estóicos não se situa em algum “além”, pois este é a estrutura harmoniosa do mundo, portanto lhe é perfeitamente imanente.
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Ontologia: uma doutrina que define a estrutura ou a “essência” mais íntima do Ser.
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Cícero, no século... já referencia o que ele chama de “antigas máximas dos sábios”: “Obedece às circunstâncias!”, “Segue Deus!”, “Conhece-te a ti mesmo!”, “Nada em excesso!” etc.
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Diz Epicteto: “A morte é uma mudança maior, mas não vai do ser atual ao não-ser, e sim ao não-ser do ser atual. – Então, não serei mais? – Tu não serás mais o que é, mas outra coisa da qual o mundo precisará.”
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Na opinião dos estóicos, os dois males que pesam sobre a existência humana, são a nostalgia e a esperança.
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Diz Sêneca: “É preciso separar duas coisas: o temor do porvir e a lembrança dos males antigos. Estes não me dizem mais respeito, e o porvir ainda não me diz respeito. (...) Enquanto se espera viver, a vida passa.”
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Epicteto: “É preciso conciliar nossa vontade com os acontecimentos de tal maneira que nenhum acontecimento ocorra contra nossa conveniência, e que também não haja nenhum acontecimento que ocorra quando não o desejamos. A vantagem para aqueles que estão assim prevenidos é de não falhar em seus desejos, de não se deparar com o que detestam, de viver interiormente uma vida sem dificuldade, sem temor e sem perturbação...”
Epicteto: “Se acontece um desses acidentes que chamamos de desagradáveis, o que desde logo aliviará tua pena é que ele não era inesperado... Tu dirás: “Eu sabia que era mortal. Eu sabia que poderia deixar meu país, eu sabia que poderiam me exilar, eu sabia que poderiam me mandar para a prisão.” Em seguida, se te debruçares sobre Tim mesmo, e te perguntares a que domínio pertence o acidente, tu te lembrarás imediatamente que ele pertence ao domíniio das coisas que não dependem de nossa vontade, que não são nossas.”
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Não se trata mais tanto de pensar por si mesmo, mas de ter confiança num Outro. É nisso que reside a diferença profunda entre filosofia e religião.
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Escolástica, no sentido literal, uma disciplina escolar.
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O mundo grego era basicamente aristocrático, um universo hierarquizado no qual os melhores por natureza deviam, em princípio, estar “acima”, enquanto se reservavam aos menos bons os níveis inferiores. Não se esqueça de que a polis grega se baseava na escravidão.
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A natureza é profundamente hierarquizada, quer dizer, desigual: para cada categoria de seres ela desenvolve gradações que vão desde a excelência mais sublime até a maior mediocridade. Com efeito, é evidente que somos, se nos colocarmos apenas ob o ponto de vista do natural, muito desigualmente dotados: mais ou menos fortes, rápidos, grandes, belos, inteligentes etc.
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Com o cristianismo, saímos do universo aristrocrático para entrar no da “meritocracia”, quer dizer, num munto que vai, inicialmente e antes de tudo, valorizar não as qualidades naturais da origem, mas o mérito que cada um desenvolve ao usá-las.
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Apenas o uso que se faz dos talentos naturais pode ser chamado de virtuoso, como aliás, indica uma das mais célebres parábolas do Evangelho, a parábola dos talentos. Você pode fzer dos seus dons naturais o uso que quiser, bom ou mau. Mas é o uso que é moral ou imoral, não os dons em si! Flar de um olho virtuoso se torna, portanto, um absurdo.
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O cristianismo concede esse enorme lugar à consciência, ao espírito, mais do que à letra, que ele não vai impor praticamente nenhuma juridicidade à vida cotidiana.
Os rituais despojados de sentido do tipo “peixe da sexta-feira” são invenções tardias, freqüentemente do século XIX, que não têm nenhuma raiz nos Evangelhos.
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Bárbaro é sinônimo de estrangeiro.
Enquanto os estóicos nos apresentavam a morte como a passagem de um estado pessoal a um estado impessoal, como uma transição do estatuto do individuo consciente para o de fragmento cósmico insconsciente, o pensamento cristão da salvação não hesita em no prometer categoriacemente a imortalidade pessoal. Como resistir?
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Quando se estabelece que essa imortalidade não apenas é compatível com o amor, mas que é um de seus efeitos possíveis, então, por que se privar disso?
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Novo Testamento, primeira Epístola aos Coríntios (XV, 13-15):
“Ora, se se prega que Cristo ressuscitou dor mortos, como podem alguns dentre vós dizer que não há ressurreição dos mortos? Se não há ressurreição dos mortos, também Cristo não ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, vazia é a nossa pregação, vazia também é a nossa fé.”
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Considere o princípio da causalidade, quer dizer, o princípio segundo o qual todo efeito possui uma causa ou, se você preferir, todo fenômeno deve poder se explicar racionalmente, no sentido próprio: encontrar sua razão de ser, sua explicação.
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Por que milicianos sérvios obrigam – como se lê nos relatórios de crimes de guerra cometidos nos Bálcãs – um infeliz avô croata a comer o fígado de seu neto ainda vivo? Por que os hútus cortam os membros dos recém-nascidos tútsis para se divertirem, apenas para nivelarem suas caixas de cerveja? Por que, exatamente, a maioria dos cozinheiros trincha com tanto prazer as rãs vivas, fatia uma enguia começando pela cauda, quando seria mais simples e mais lógico matá-las imediatamente?
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Diz Rousseau: “O que faz com que a pequena tartarug não possua nem história pessoal (educação) nem história política e cultural é que ela é desde o início e desde sempre guiada pelas regras da natureza, pelo instinto, e que lhe é impossível se afastar deles. O que, ao contrário, permite ao ser humano ter essa dupla historicidade é justamente o fato de que, estando em excesso em relação aos ‘programas’ da natureza, pode evoluir indefinidamente, educar-se ao longo da vida, e entrar numa história da qual ninguém pode dizer hoje quando e onde acabará.”
Diz Sartre repetindo Rousseau: “Se o homem é livre, então não existe ‘natureza humana’.”
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O que é o racismo, e o sexismo, que não são mais do que a idéia do clone entre muitos? É a idéia de que existe uma essência própria a cada raça, a cada sexo, da qual os indivíduos são inteiramente prisioneiros. O racismo diz que o “africano é jogador”, “o judeu, inteligente”, “o árabe, preguiçoso” etc. (...)
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Kant achava que o homem é continuamente dividido entre o egoísmo e o altruísmo, como o mundo de Newton o é entre as forças centrípetas e centrífugas.
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“O animal e a natureza são um só. O homem e a natureza são dois.” Não se poderia traduzir melhor o pensamento de Rousseau: o animal é um ser da natureza, inteiramente confundido com ela; o homem é, ao contrário, um excesso; ele é, por excelência, o ser antinatural.
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O desinteresse e a universalidade, os dois principais pilares da moral que Kant vai expor em sua famosa Crítica da Razão Prática (1788).
A ação verdadeiramente moral, a ação verdadeiramente “humana” (e é significativo que os dois termos comecem a se confundir) será, primeiramente e antes de tudo, a ação desinteressada, quer dizer, aquela que dá testemunho desse próprio do homem que é a liberdade entendida como faculdade de se libertar da lógica das tendências naturais.
Por que é preciso reconhecer que estas nos levam sempre ao egoísmo. A capacidade de resistir às tentações às quais ele nos expõe é exatamente o que Kant chama de “boa vontade”, ponto em que ele vê o novo princípio de toda moralidade verdadeira. Enquanto minha natureza tende apenas à satisfação de meus interesses pessoais, tenho igualmente, pelo menos essa é a primeira hipótese da moral moderna, a possibilidade de escapar ao programa da natureza para admitir que podemos, às vezes, pôr de lado nosso “querido eu”, como diz Freud.
Meta, do grego, significa “acima”.
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Em contrapartida, não posso deixar de agradecer, como se tivesse agido humanamente, à pessoa que, sem interesse particular, ao menos aparentemente, tem a amabilidade de me dar uma carona num dia de greve dos transportes.
Do ponto de vista do humanismo nascente, virtude e ação desinteressada são inseparáveis.
A segunda dedução ética fundamental a partir do pensamento rousseauniano está diretamente ligada à primeira: trata-se da insistência no ideal do bem comum, na universalidade das ações morais entendidas como a superação dos exclusivos interesses particulares. O bem não está mais associado ao meu interesse particular, ao da minha família ou da minha tribo. Evidentemente ele não os exclui, mas deve também ter em conta os interesses de outrem, até mesmo o da humanidade inteira – como o exige a grande Declaração dos Direitos do Homem.
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A definição moderna da moralidade vai, segundo Kant, se expressar daí em diante sob forma de ordens indiscutíveis ou, para empregar seu vocabulário, de imperativos categóricos.
Na maior parte do temo, não temos nenhuma dificuldade em saber o que seria necessário fazer para agir bem, mas nos concedemos sempre exceções, simplesmente porque nos preferimos aos outros.
A ética moderna é fundamentalmente uma ética meritocrática de inspiração democrática. Ela se opõe em tudo às concepções aristocráticas da virtude.
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Como poderia eu por um instante imaginar conseguir alcançar o bem comum, o intgeresse geral, se é apenas minha natureza que me contento em ouvir? A verdade é que, para ela, os outros sempre podem esperar...
Como refazer um mundo coerente entre os humanos, sem para isso recorrer à natureza – que não é mais um cosmos -, nam À DIVINDADE, Que SÓ VALE PARA OS CRENTES?
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Um ser que realiza perfeitamente sua natureza ou sua essência situa-se num onto eqüidistante em relação aos pólos opostos qq, por estarem no limite de sua definição, confinam com a monstruosidade.
A virtude, então, é o esforço em limitar a própria liberdade para dar lugar à liberdade do outro. (...) É por ela que um novo cosmos, uma nova ordem do mundo, fundada no homem e não mais no cosmos ou num Deus, se torna possível.
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Se situa-se a virtude não mais na natureza, mas na liberdade, então todos os seres se equivalem, e a democracia se impõe.
Você vê que o termo individualismo não designa, como se pensa habitualmente, o egoísmo, mas quase o oposto, o nascimento de um mundo moral no seio do qual indivíduos, pessoas, são valorizados na medida de suas capacidades de se desprenderem da lógica do egoísmo natural para construir um universo ético artificial.
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A proposição de Descartes: Cogito ergo sum, “penso, logo existo”. Se penso, e até se duvido, devo ser algo que existe! É preciso, no mínimo, existir, nem que seja só para delirar.
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A filosofia moderna é uma filosofia do “sujeito”, um humanismo, e até mesmo um antropocentrismo, quer dizer, no sentido etimológico, uma visão do mundo que coloca o homem – e não o cosmos ou a divindade – no centro de tudo.
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Sem o respeito pela liberdade do outro não existe coexistência pacífica possível.
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A ética nunca impediu ninguém de ser traído ou enganado.
Como pensar a salvação se o mundo não é mais uma ordem harmoniosa e se Deus está morto? Para alcançar tal objetivo, os Modernos seguiram duas grandes linhas. A primeira é a das “religiões de salvação terrestre”, especialmente o cientificismo, o patriotismo e o comunismo. Não podendo sustentar-se numa ordem cósmica, não podendo mais acreditar em Deus, os Modernos inventaram religiões de substituição, espiritualidades sem Deus ou, para ser direto, ideologias que, professando com freqüência um ateísmo radical, agarraram-se, apesar de tudo, a ideais capazes de dar um sentido à existência humana, ou de justificar que se morra por eles.
Stalin, apesar de todos os seus crimes, era considerado um verdadeiro herói pelos seus fiéis.
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Mesmo que nos dedicássemos a uma causa sublime, com a convicção de que o ideal é infinitamente superior à própria vida, no final, é sempre o indivíduo que sofre e morre enquanto ser particular, não outro em seu lugar.
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Pós-modernas – idéias que, a partir dos meados so déculo XIX, se empenharam em fazer a crítica do humanismo moderno e, em especial, da filosofia das Luzes (o iluminismo).
O pós-modernismo ataca as duas mais importantes convicções do iluminismo (ou dos Modernos) dos séculos XVII ao XIX: a de que o ser humano é centro do mundo; e a que considera a razão é o poder libertador e graças a ele seremos mais livres e mais felizes.
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A filosofia moderna destituiu o cosmos e criticou as autoridades religiosas substituindo-as pela razão e pela liberdade humana, pelo ideal democrático e humanista de valores morais construídos sobre a humanindade do homem (...)
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Diz Nietzsche: Derrubar “ídolos” – é assim que chamo todos os ideais -, esse é meu verdadeiro ofício. É inventando a mentira de um mundo ideal que se tira o valor da realidade, sua significação, sua veracidade... A mentira do ideal foi até agora a maldição que pesou sobre a realidade, a própria humanidade se tornou mentirosa e falsa até o mais fundo de seus instintos – até a adoração dos valores opostos àqueles que poderiam lhe garantir u m belo crescimento, um futuro...
Nietzsche pensa que todos os ideais, possuem a mesma estrutura, a mesma finalidade: fundamentalmente eles partem de uma estrutura teológica, já que se trata sempre de inventar um além melhor do que este mundo, de imaginar valores pretensamente superiores e exteriores à vida ou, no jargão dos filósofos, de valores “transcendentes”. É essa negação do real em nome de um ideal que Nietzsche chama de “niilismo”.
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Para Nietzsche “não existe nada fora da realidade da vida, nem acima nem abaixo, nem no céu nem no inferno, e todos os célebres ideais da política, da moral e da religião são apenas “ídolos”, inchaços metafísicos, ficções, que não visam nada a não ser fugir da vida, antes de voltar contra ela.”
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Os “filósofos da suspeita” são os pensadores que acham que por trás das crenças tradicionais, por trás dos “velhos e bons valores” que se pretendem nobres, puros e transcendentes, há sempre interesses escusos, escolhas inconscientes, verdades mais profundas... e freqüentemente inconfessáveis.
Ler Crepúsculo dos Ídolos.
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Para Nietzsche, o fundamento do real, a essência mais íntima do ser, nada tem de cósmico nem de divino. Para ele não existe absolutamente nenhum ponto de vista exterior e superior à vida, nenhum ponto de vista que tenha, no que quer que seja, o privilégio de se abstrair do tecido de forças que constituem o fundamento do real, a mais íntima essência do ser. Para ele “não existem fatos, apenas interpretações”.
[Para mim, não existem fatos, apenas percepções.]
“Toda filosofia dissimula uma outra filosofia, toda opinião é um esconderijo, toda palavra pode ser uma máscara.”
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“Sabem o que é o ‘mundo’ para mim? Querem que eu o mostre em meu espelho? Esse mundo é um monstro de forças, sem começo nem fim, uma soma fixa de forças, dura como o bronze, [...] um mar de forças tempestuosas, um fluxo perpétuo.”
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O racionalismo científico dos Modernos é nada mais que uma ilusão, um modo de, no fundo, perseguir a ilusão das cosmologias antigas, uma “projeção” humana (e Nietzsche já emprega palavras que logo Freud usará), quer dizer, um mod de tomar nossos desejos por realidades, de nos oferecer um simulacro de poder sobre uma matéria insensata, multiforme, caótica, que na verdade nos escapa totalmente.
Nietzsche propõe a distinção entre dois grandes tipos de força: as forças reativas e as ativas.
As reativas são aquelas que só podem se expandir no mundo e produzir todos os seus efeitos, reprimindo, aniquilando e mutilando outras forças.
Sofistas, aqueles que pretendem seduzir e persuadir pela arte da oratória.
É na contestação que o diálogo avança, para, afinal, tentar chegar a uma idéia mais acertada.
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Dois tipos de discursos, duas concepções do uso das palavras sempre se confrontaram. De um lado, o modelo socrático e reativo que, pelo diálogo, busca a verdade e, para tanto se opõe às diversas faces da ignorância, da estupidez ou da má-fé. De outro, o discurso sofístico que não visa absolutamente à verdade, mas simplesmente procura seduzir, persuadir, produzir efeitos quase físicos sobre um auditório que deve, pelo simples poder das palavras, ser levado à adesão.
Para Nietzsche o mundo não é um cosmos, é um caos, uma pluralidade irredutível de forças, de instintos, de pulsões que vivem em confronto.
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Segundo a psicanálise, são os conflitos psíquicos inconscientes, os dilaceramentos internos, que nos impedem de viver bem, nos fazem adoecer e nos impossibilitam de “fruir e agir”.
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Nietzsche rejeita com violência todo projeto de melhoramento do mundo. Ele sempre atacou a caridade, a compaixão, o altruísmo, sob todas as suas formas, cristãs ou não.
Proclamar o amor universal da humanidade é, na prática, dar preferência a tudo o que é doloroso, defeituoso, degenerado... Para a espécie, é necessário que o defeituoso, o fraco, o degenerado, pereçam.
Nietzsche tinha aversão explícita por toda forma de ideologia revolucionária, quer se trate do socialismo, do comunismo ou do anarquismo. Ele trem palavras bastante duras contra a proliferação das paixões que caracteriza a vida moderna desde a emergência, em sua opinião altamente funesta, do romantismo.
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“A grandeza de um artista não se mede pelos ‘bons sentimentos’ que ele suscita,” mas reside no “grande estilo”, quer dizer, na capacidade de ‘se tornar senhor do caos interior; em forçar seu próprio caos a assumir forma; agir de modo lógico, simples, categórico, matemático, tornar-se lei, eis a grande ambição”.
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A noção de “vontade de poder” é “a essência mais íntima do Ser”. Mas não vontade de conquistar ou ter, mas o desejo profundo de uma intensidade máxima de vida, a mais intensa e a mais viva possível.
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O classsicismo é uma arte que confere um lugar primoridal à harmonia e à razão.
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Se não existem mais além, nam cosmos nem divindade, se os ideiais fundadores do humanismo estão comprometidos, como distinguir não apenas o bem do mal, ou, ainda mais profundamente, o que vale a pena ser vivido e o que é medíocre?
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Para responder a isto, Nietzsche propôs da doutrina do eterno retorno e formulada assim: “é no seio deste mundo, permanecendo nesta terra e nesta vida, que é preciso aprender a distinguir o que vale ser vivido e o que merece perecer. É aqui e agora que se deve saber separar as formas de vida frustradas, medíocres, reativas e enfraquecidas, das formas de vida intensas, grandiosas, corajosas e ricas em diversidade.”
“Viva de forma a ter de ddesejar reviver – é o dever -, pois, em todo caso, você reviverá! Aquele para quem o esforço á a alegria suprema, que se esforce! Aquele que ama antes de tudo o repouso, que repouse! Aquele que ama antes de tudo se submeter, obedecer e seguir, que obedeça! Mas que saiba para o que dirige sua preferência, e não recue diante de nenhum meio! É a eternidade que está em jogo!”
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Nietzsche nos convida a viver de tal modo que nem os arrependimentos nem os remorsos tenham mais nenhum espaço, nenhum sentido.
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A doutrina do amor fati (amor do que é no presente): fugir do peso do passado, assim como das promessas do futuro.
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Esperar um pouco menos, lamentar um pouco menos, amar um pouco mais. Nunca permanecer nas dimensões não reais do tempo, no passado e no futuro, mas tentar habitar tanto quanto possível o presente, dizer-lhe sim com amor.
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De que adianta pretender acabar com o “idealismo”, com todos os ideais e todos os “ídolos”, se esse grandioso programa filosófico permanece ele próprio... um ideal? De que adianta zombar de todas as figuras da transcendência e apelar para essa sabedoria que ama o real tal como ele é se esse amor permanece, por sua vez, perfeitamente transcendente, se ele permanece um objetivo radicalmente inacessível sempre que as circunstâncias, por menos que seja, são difíceis de serem vividas?
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Se as posições anteriores eram tão fiáveis e tão convincentes, nunca teriam passado pelos rigores da crítica, nunca teriam deixado de ser oportunas.
[O autor afirma que em benefício da sobrevivência da espécie, temos mais interesse na cooperação e na harmonia do que no conflito e na guerra. Discordo. O conflito e a guerra levados a extremo significa extermínio de uma parcela da humanidade e, conseqüentemente, aumento das chances dos sobreviventes.]
237
Cada filósofo procura desvendar o que há por trás de nossa crença nos ídolos, as lógicas escondidas, inconscientes, que nos determinam a despeito de nossa vontade.
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Na competição globalizada que hoje
põe todas as atividades humanas num permanente estado de concorrência, a
história se move longe da vontade dos homens. Ela se torna uma espécie de
fatalidade e nada indica com certeza que se oriente para o melhor. (...) Nenhum
ideal inspira mais o curso do mundo, só existe a necessidade absoluta do
movimento pelo movimento.
A economia moderna funciona como a seleção natural em Darwin: de acordo com uma lógica de competição globalizada, uma empresa que não progrida todos os dias é uma empresa simplesmente destinada à morte. Mas o progresso não tem outro fim além de si mesmo, ele n ao visa a nada além de se manter no páreo com outros concorrentes.
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É justamente esse desaparecimento dos fins em benefício apenas da lógica dos meios que constitui a vitória da técnica como tal.
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Pela primeira vez na história da vida, uma espécie viva detém os meios de destruir todo o planeta; e essa espécie não sabe para onde vai!
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Heidegger, lamentavelmente, se engajou no nazixmo, convencido que estava, sem dúvida, de que apenas um regime autoritário poderia se mostrar à altura dos desafios lançados à humanidade pelo mundo da técnica.
255
Como dizia Hegel: “A erudição tem início com as idéias e termina com a imundície...”, pois tudo, qualquer ocisa, pode se tornar objeto de erudição, as tampas dos potes de iogurte assim como os conceitos, de modo que a especialização técnica pode engendrar competências incontestáveis assoicadas à mais desoladora ausência de sentido.
[Competir um pouco menos, amar/tolerar um pouco mais.]
259
Frustração, ignorância, impotência, são essas as características maiores da esperança.
[O materialismo é uma filosofia para momentos felizes. Funciona muito bem quando tudo vai muito bem, mas desaba completamente quando algo vai mal.]
Que sentido pode ter o imperativo do amor fati em Auschwitz?
264
Não é porque temos necessidade de uma coisa que ela é verdadeira.
Não podemos nos pensar por nós mesmos, nem nossas relações com os valores, sem a hipótese de transcendência destes valores.
265
A cruz do materialismo é que ele jamais consegue pensar seu próprio pensamento. Ele diz que não somos livres, mas está convencido, é claro, de que afirma tal coisa livremente, que ninguém o obriga de fato a fazê-lo, nem seus pais, nem seu meio social, nem sua natureza biológica.
[Aí a questão: é sim sua natureza biológica que nos faz pensar do jeito que pensamos.]
Donde a questão fundamental do humanismo contemporâneo: como pensar a transcendência sob suas duas formas, em nós (a da liberdade) e fora de nós (a dos valores), sem ficar sujeito à genealogia e à desconstrução materialistas?
267
O divino dos estóicos, diferentemente do Deus dos cristãos, não é um Ser exterior ao mundo, mas, por assim dizer, sua própria ordem, visto que é perfeito. A transcendência aqui é em relação à humanidade. Ela não está no céu, mas na Terra.
A segunda concepção de transcendência é a do Deus monoteísta. O Deus dos cristãos e muçulmanos é totalmente “supranatural”. É uma transcendência que não se situa apenas em relação à humanidade, mas também ao próprio universo concebido inteiramente como uma criação cuja existência depende de um Ser exterior a ela.
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A terceira é a transcendência na imanência. Tomando de um cubo, Husserl demonstrava que não há onisciência, não há saber absoluto, pois todo visível (as 3 faces visíveis) se apresenta sempre sobre um fundo de invisível (as 3 outras faces). Toda presença supõe uma ausência, toda imanência, uma transcendência escondida, toda doação de objeto, alguma coisa que se tira.
[Por esta visão] a transcendência é um fato, uma constatação, uma dimensão incontestável da existência humana inscrita no centro mesmo do real.
É nisso que existe transcendência, alguma coisa que nos escapa sempre no seio daquilo que nos e dado, que vemos e tocamos, logo, no seio mesmo da imanência. (...) A realidade do mundo nunca me é dada na transparência e no domínio perfeitos.
270
Só essa transcendência é passível de conferir um significado rigoroso à experiência humana que tenta descrever e considerar o humanismo liberto das ilusões da metafísica. É “em mim”, em meu penssamento ou em minha sensibilidade que a transcendência dos valores se manifesta. Embora situadas em mim (imanência), tudo acontece como se elas se impusessem (transcendência), apesar de tudo, à minha subjetividade, como se viessem de outra parte.
272
O espírito crítico que característica a filosofia moderna a partir de Descartes vai dar um passo além: em vez de se aplicar apenas aos outros, ele vai finalmente aplicar-se a si mesmo.
273
como vimos no estoicismo, a descoberta da natureza cósmica do universo implica a demonstração de algumas finalidades morais para a existência humana.
276
Há moral quando princípios nos parecem, com ou sem razão, tão elevados, tão “sagrados” que chegamos a considerar que valeria a pena arriscar ou mesmo sacrificar a vida para defendê-los.
277
Materialistas ou não, continuamos a considerar que alguns valores podem, em ultimo caso, nos levar a assumir o risco de morte.
278
As transcendências de outrora – as de Deus, da pátria ou da revolução – não foram absolutamente substituídas pela imanência radical prezada pelo materialismo, pela renuncia ao sagrado e pelo sacrifício, mas sim por formas novas de transcendência, transcendências “horizontais” e não mais verticais: enraizadas em seres que estão no mesmo plano que n os, e não mais em entidades situadas acima de nossas cabeças. [Então é aí que está a origem do culto às celebridades, dos Big Brothers?]
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[A pátria agora designa os homens que vivem em um território, não o território. Designa o humanismo, não o nacionalismo.]
Henri Dunantm criador da Cruz Vermelha, autor do livro Um Souvenir de Solferino.
282
A idéia do “pensamento alargado”: para que se tome consciência de si, é preciso situar-se à distância de si mesmo.
Do autor: O que é uma vida bem-sucedida?
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Precisamos sair do egocentrismo. Precisamos dos outros para nos compreender a nós mesmos, precisamos de sua liberdade e, se possível, de sua felicidade para realizar nossa própria vida.
Conhecer melhor e amar mais os outros. Para que serve envelhecer? Para isso, e talvez para mais nada.
293
[O autor pensa que nossa singularidade não é dada no nascimento. Que ela se constrói de mil maneiras ao longo da existência, da experiência, e, por isso, insubstituível.]
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Acredito que devemos, à margem do budismo e do cristianismo, aprender, enfim, a viver e a amar como adultos, pensando, se necessário, todos os dias na morte. Não por fascinação mórbida. Ao contrário, para procurar o que convém fazer aqui e agora, na alegria, com aquels que amamos e que vamos perder, a menos que eles nos percam antes. Estou certo de que, embora eu esteja inifinitamente longe de possuí-la, essa sabedoria existe e constitui o coroamente de um humanismo, enfim, desembaraçado das iluspes da metafísica e da religião.
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O ceticismo sustenta mais ou menos o seguinte discurso: desde a aurora dos tempos, as diferentes filosofias se combatem sem jamais conseguir chegar a um acordo sobre a verdade. (...) Já que existem várias visões do mundo e que elas não conseguem se harmonizar, deve-se admitir também que nenhuma poderia pretender seriamente conter em si, mais do que outras, a verdadeira resposta às perguntas que nos fazemos sobre o conhecimento, a ética ou a salvação, de modo que toda filosofia é vã.
O dogmatismo sustenta o inverso, que há várias visões do mundo, mas a minha é com certeza, superior e mais verdadeira do que a dos outros.
PESQUISADO NA INTERNET
Assim, Nietzsche estabeleceu uma distinção entre o apolíneo e o dionisíaco: Apolo é o deus da clareza, da harmonia e da ordem; Dioniso, o deus da exuberância, da desordem e da música. Segundo Nietzsche, o apolíneo e o dionisíaco, complementares entre si, foram separados pela civilização.
O homem, dizia Nietzsche, é
o criador dos valores, mas esquece sua própria criação e vê neles algo de
"transcendente", de "eterno" e "verdadeiro",
quando os valores não são mais do que algo "humano, demasiado
humano".
Em “O Eterno Retorno” defendeu a tese de que o mundo passa indefinidamente pela alternância da criação e da destruição, da alegria e do sofrimento, do bem e do mal.
Em lugar do
filósofo-legislador, isto é, crítico de todos os valores estabelecidos e
criador de novos, surgiu o filósofo metafísico. Essa degeneração, afirma
Nietzsche, apareceu claramente com Sócrates, quando se
estabeleceu a distinção entre dois mundos, pela oposição entre essencial e
aparente, verdadeiro e falso, inteligível e sensível. Sócrates
"inventou" a metafísica, diz Nietzsche, fazendo da vida aquilo que
deve ser julgado, medido, limitado, em nome de valores "superiores"
como o Divino, o Verdadeiro, o Belo, o Bem. Com Sócrates, teria surgido um tipo
de filósofo voluntário e sutilmente "submisso", inaugurando a época
da razão e do homem teórico, que se opôs ao sentido místico de toda a tradição
da época da tragédia.
Segundo Sócrates, a arte da
tragédia desvia o homem do caminho da verdade: "uma
obra só é bela se obedecer à razão", formula que, segundo
Nietzsche, corresponde ao aforismo "só o homem que concebe o bem é virtuoso".
Esse bem ideal concebido por Sócrates existiria em um mundo supra-sensível, no
"verdadeiro mundo", inacessível ao conhecimento dos sentidos, os
quais só revelariam o aparente e irreal.
Segundo Nietzsche, o
cristianismo concebe o mundo terrestre como um vale de lágrimas, em oposição ao
mundo da felicidade eterna do além.
São os escravos e os
vencidos da vida que inventaram o além para compensar a miséria; inventaram
falsos valores para se consolar da impossibilidade de participação nos valores
dos senhores e dos fortes; forjaram o mito da salvação da alma porque não
possuíam o corpo; criaram a ficção do pecado porque não podiam participar das
alegrias terrestres e da plena satisfação dos instintos da vida. "Este
ódio de tudo que é humano", diz Nietzsche, "de tudo que é 'animal' e
mais ainda de tudo que é 'matéria', este temor dos sentidos... este horror da
felicidade e da beleza; este desejo de fugir de tudo que é aparência, mudança,
dever, morte, esforço, desejo mesmo, tudo isso significa... vontade de aniquilamento,
hostilidade à vida, recusa em se admitir as condições fundamentais da própria
vida".
Nietzsche foi ao mesmo tempo um antidemocrático e um antitotalitário. "A democracia é a forma histórica de decadência do Estado", afirmou Nietzsche, entendendo por decadência tudo aquilo que escraviza o pensamento, sobretudo um Estado que pensa em si em lugar de pensar na cultura. Em Considerações Extemporâneas essa tese é reforçada: "estamos sofrendo as conseqüências das doutrinas pregadas ultimamente por todos os lados, segundo as quais o estado é o mais alto fim do homem, e, assim, não há mais elevado fim do que servi-lo. Considero tal fato não um retrocesso ao paganismo mas um retrocesso à estupidez".