Elite Subsidiada
Reprodução de opinião publicada em "Cartas dos leitores" do jornal O Globo em 14/05/1994.
O editorial do GLOBO, de 9 de maio, volta a tratar do custeio da universidade pública no Brasil. Após demonstrar, através de dados irrefutáveis, o absurdo de um sistema que subsidia uma elite, deixa, no final, uma pergunta: "E em que sentido, então, é ainda pública?"
Atrevo-me, apenas na qualidade de cidadão, a afirmar que a resposta está na baixíssima qualidade de nosso Congresso. Que por sua vez é resultado da falta de ensino básico. É um círculo vicioso que só se romperá com coragem, visão de futuro e determinação, qualidades fundamentais a quem se propuser à tarefa de liderar o país em busca de um futuro que o dignifique.
Nada será possível, entretanto, enquanto toda a sociedade não enxergar a questão central: universidade gratuita e analfabetismo é uma contradição inaceitável, uma aberração gerada por erros sucessivos ao longo dos anos. Chega a ser antiética. É um Robin Hood de antimatéria. É tirar do pobre para dar ao rico. Vejamos os contrastes: no funil da vida, como é natural, passam ao estágio seguinte aqueles que melhor se saíram nas etapas anteriores. Esta é a explicação para o fato de mais da metade dos beneficiados terem condições econômico-financeiras para custear seus estudos.
Mas esqueçamos estas considerações e façamos uma que, na minha opinião, toca a questão no ponto nevrálgico: como subsidiar (seja em 10% ou 100%) o ensino de um determinado nível enquanto o nível anterior ainda é carente? Que situação estapafúrdia é essa em que defendemos o direito de o pobre ter curso superior se ele nem ao menos sabe ler por falta de salas de aula, professores e material escolar? Que nos expliquem nossos legisladores, como o pai deste universitário carente tão protegido pelo Estado, poderia pagar (além do sustento do filho) os custos de materiais e equipamentos necessários, por exemplo, aos cursos de tempo integral como odontologia ou medicina?